|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
CANNES
Autobiografia narrada pelo diretor faz colagem de filmes italianos
Scorsese apresenta seu mosaico em preto-e-branco
SÉRGIO DÁVILA
ENVIADO ESPECIAL A CANNES
Godard podia ter alguma razão
quando disse em Cannes que os
americanos do Norte não têm história, por isso correm à Europa a
comprá-la. Este definitivamente
não é o caso do cineasta ítalo-americano Martin Scorsese, que
apresentou anteontem o monumental "Il Mio Viaggio in Italia".
O filme, de mais de quatro horas, em preto-e-branco e narrado
por ele, é, na verdade, uma autobiografia peculiar. Faz uma colagem dos mais importantes títulos
dos principais cineastas italianos
dos anos 40, 50 e 60. Empresta o
título de "Viaggio in Italia", de
Roberto Rosselini, de 53. E é com
o pai do neo-realismo que Scorsese começa sua turnê pelo cinema.
A primeira cena é a famosa do
paisano morto numa bóia no rio
Pó, de "Paisà" (1946), que, com
"Roma Cidade Aberta" (1946) e
"Alemanha Ano Zero" (1947),
forma a trilogia-base de Rossellini
no movimento. Ficamos sabendo
que o principal programa do jovem Martin nos anos 40 e 50 era
assistir à TV com seu irmão, seus
pais, avós e tios. Todos de origem
siciliana, reunidos na sala de um
apartamento apertado em Nova
York, onde um dia já foi a Little
Italy e hoje é o "descolado" SoHo.
E que, devido à grande comunidade de italianos na cidade, as três
emissoras abertas exibiam muitos
filmes italianos, dublados em inglês. "Assistia a Roy Rogers no cinema, um mundo de fantasia, e
voltava para casa para a dura realidade de filmes como "Paisà". Nós
tínhamos 200 anos de história e o
duelo no Curral OK, enquanto [os
italianos" eram milenares e lutavam no Coliseu", lembra.
Na sequência, cenas feitas há 60
anos pelo tio de Martin, descobertas pelo primo recentemente, da
nonna, da mercearia da família,
do jovem pai Scorsese (que assinava Scozezze na grafia original).
A pré-história do diretor que faria
"Taxi Driver" e "Touro Indomável". Emocionante.
Há curiosidades históricas, como "Cabiria", de Giovanni Pastrone, épico de 1914 que, segundo
o próprio D.W. Griffith, o inspirou a fazer "Intolerância", dois
anos depois. A viagem continua
com Vittorio de Sica ("Ladrões de
Bicicletas", 1948, "Umberto D",
1952), Luchino Visconti ("Sedução da Carne", 1954) e termina
com "Oito e Meio" (1963), para
muitos obra-prima de Fellini.
Scorsese conclui dizendo que
não fez o filme para velhos cinéfilos, que provavelmente conheciam todos esses títulos, mas para
jovens amantes do cinema, que o
diretor quer recrutar para seu
exército. "Viaggio" segue a linha
de outra obra fundamental do cineasta, "A Personal Journey with
Martin Scorsese through American Movies", sobre os filmes dos
EUA que o influenciaram.
Faye Dunaway estava na platéia,
como a representar as cores americanas. A seu lado, Francesco Rosi ("Crônica de uma Morte Anunciada"), companheiro de Zeffirelli
quando trabalhavam sob a batuta
de Visconti em "La Terra Trema"
(1948), também citado no filme.
Ambos aplaudiram muito.
Texto Anterior: Frases Próximo Texto: Mondo Cannes Índice
|