São Paulo, quinta, 18 de junho de 1998

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Brasileiros sustentam império de comunicações no Japão

Marcio Aith/Folha Imagem
O empresário Yoshio Muranaga, que possui uma rede de TV e quatro jornais semanais e retransmite a programação da Globo no Japão



Yoshio Muranaga, proprietário do IPC (International Press Corporation), retransmite no país a programação da Rede Globo e de outras televisões da América do Sul, além de editar o primeiro jornal em português do país, visando os dekasseguis


MARCIO AITH
de Tóquio

Assistir ao vivo o Jornal Nacional, da Rede Globo, às 8h da manhã, é uma experiência única.
A rapidez das matérias e a entonação das vozes de William Bonner e Fátima Bernardes simplesmente não combinam com o horário. Parece retransmissão, mas não é.
Desde setembro de 1996, um empresário fatura mais de US$ 2 milhões por mês exibindo no Japão a programação da Rede Globo e de outras televisões da América do Sul a boa parte dos 400 mil latinos que vieram ganhar a vida do outro lado do planeta.
Seu nome é Yoshio Muranaga, 61, o "Roberto Marinho japonês" -apelido que recebeu pela sua trajetória polêmica no setor de comunicações (leia texto nesta página). De origem humilde, Muranaga montou um pequeno império formado por uma rede de TV e por quatro jornais semanais, no Japão, no Brasil e na Europa.
Seu grupo empresarial tem o pomposo nome International Press Corporation, ou IPC. "Minha idéia é levar informação aos latinos espalhados pelo mundo. Achei que o nome em inglês fosse mais apropriado", disse ele.
Muranaga nasceu no Japão, mas viveu toda sua vida no Brasil, para onde sua família migrou em 1941, quando ele tinha 16 anos, para trabalhar num projeto de colonização no Pará. A colônia deu errado e sua família foi à miséria, segundo seu relato. "Virei jardineiro e decidi que iria aprender português. Apesar de minha idade, me colocaram numa escola com crianças de 10 anos. Aprendi a língua e comecei a mexer com exportação de pimenta-do-reino."
No início da década de 90, já com dinheiro, voltou a Tóquio e fundou o primeiro jornal em português no Japão, o "International Press", que atualmente tem uma tiragem, ao menos oficialmente, de 60 mil exemplares. "Quando o jornal começou nunca pensei que poderia ganhar dinheiro. Aí percebi que os dekasseguis precisavam de notícias assim como eu precisava quando morava no Brasil. O negócio se difundiu rapidamente."
Em 1996, depois de fechar um contrato com a Rede Globo, alugou três satélites e passou a transmitir, por assinatura, a programação da Globo e um pacote de programas de vários países latino-americanos no Japão.
Muranaga recebeu a concessão de dois canais que operam no sistema "direct to home", da Sky Perfect TV. Os dois canais têm 24 mil assinantes, que pagam US$ 270 para comprar a antena e o receptador, mais 4.000 ienes (cerca de US$ 27) por mês de assinatura. "As imagens chegam aqui somente com 0,75 segundo de atraso", diz ele.
A rede de Muranaga mescla os programas da Globo com outros produzidos por seus próprios jornalistas -operários brasileiros que trabalhavam em fábricas no Japão e que mudaram de profissão. "Eu trabalhava na fábrica da Olympus. De uma certa maneira já mexia com câmeras", brinca Maria Luisa Miyakawa, operária transformada em repórter de TV.
Por causa do fuso horário, a IPC só transmite ao vivo o Jornal Nacional, às 8h.
"Se eu quisesse poderia transmitir tudo ao vivo. Só não o faço por causa do horário", disse Muranaga num português cheio de sotaque, mas correto.
A transmissão das novelas e dos seriados respeita o horário original do Brasil. A novela das oito é retransmitida à noite no Japão, assim como o "Globo Repórter" e o "Fantástico".
A fama de Muranaga extrapolou os limites da comunidade latina em dezembro de 1996, durante a invasão da embaixada japonesa no Peru. Seus canais de televisão eram os únicos a ter as imagens produzidas pelo maior canal de TV do Peru.
"Exibíamos as imagens 24 horas por dia. As redes NHK, Asahi e Fuji telefonavam desesperadamente para comprá-las, mas não tínhamos o direito de vendê-las, somente de exibi-las", diz ele.
Depois de uma negociação com a empresa de quem Muranaga havia comprado as imagens, a IPC acabou cedendo-as para todas as TVs japonesas, que em troca veicularam o logotipo da IPC. "Se tivesse que pagar pela publicidade que tivemos gastaria US$ 5 milhões", disse ele.
Por conta de seu empenho, Muranaga foi convidado pelo primeiro-ministro Ryutaro Hashimoto para o banquete de recepção ao presidente peruano depois do episódio.
Ele guarda o convite e o mostra com orgulho.
A IPC custou US$ 10 milhões e, segundo Muranaga, o investimento só será pago em 2001. A crise econômica no Japão reduziu suas receitas (em ienes) e aumentou seus custos (em dólares). "Assim que tiver conseguido pagar as contas quero desenvolver um projeto semelhante nos Estados Unidos. A colônia de brasileiros lá é muito maior que a do Japão. Não sei como não pensaram nisso antes", disse.



Texto Anterior | Próximo Texto | Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.