São Paulo, sexta-feira, 18 de agosto de 2000


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CRÍTICA
Valores religiosos e familiares dão o tom do romance

SÉRGIO RIZZO

ESPECIAL PARA A FOLHA

Vem lá de cima, como se fosse Deus a espreitar os diminutos seres humanos, a câmera que apresenta Bob, o personagem de David Duchovny (o agente Fox Mulder, de "Arquivo X") em "Feitiço do Coração". Mais tarde, o mesmo recurso é usado para mostrar a paz de Grace (Minnie Driver, de "Matador em Conflito") cuidando de seu jardim.
A deixa visual não deve ser desprezada. A diretora estreante Bonnie Hunt (que interpreta a irmã de Grace) conduz sua história de amor como se houvesse um controle divino sobre o que fazemos, uma lei suprema governando o acaso. Todas as variações da vida estariam escritas em algum lugar e no fim tudo dá certo.
Deus é mencionado nos diálogos com alguma frequência. Talvez Bonnie Hunt não seja carola, mas seu filme saiu assim -uma comédia romântica em que não só valores religiosos, mas também familiares, dão o tom.
Não seria demais comparar a anjos os quatro velhinhos (entre eles, Robert Loggia e Carroll O'Connor) que roubam as melhores cenas do filme. São protetores, divertidos. Quem não gostaria de tê-los como tios ou avôs?
O coração do título brasileiro (no original seria Retorne para Mim) não é usado de maneira figurada. Trata-se mesmo de um órgão que, transplantado para Grace, reordena a sua vida amorosa e a de Bob. Não há como torcer contra essa conjunção.
Ambos são politicamente corretos. Bob ergue prédios e uma nova casa para o gorila do zoológico de Chicago. Grace tem um toque mágico para cuidar de plantas e ilumina o restaurante onde é garçonete e canta para os fregueses.
Os donos de gatos não vão gostar, mas há uma frase de Bob dando a entender que o afeto e a empatia dos personagens são coisa de "dog person", ou gente que prefere cachorro, em oposição à distância mantida pelos felinos em relação ao que os cerca. Não por acaso, é um cachorro quem primeiro identifica onde foi parar o coração transplantado. Como diz o título daquele desenho animado dirigido por Don Bluth, os cães vão mesmo para o céu.
É preciso se identificar com essa maneira positiva de encarar a vida para apreciar os encontros e desencontros do filme. Mas há outros problemas, além da necessidade de compartilhar esse olhar.
Primeiro, não são tantos encontros e desencontros assim. Está certo que o público de comédias românticas sabe com quem os personagens vão ficar, mas deve-se esperar da trama algum esforço para dificultar o desfecho anunciado. Aqui, as coisas rolam sem muitas pedras pelo caminho.
Outro entrave são os atores. Mesmo quem gosta de Duchovny e Driver há de reconhecer que a praia de ambos não é essa. A química entre os dois é pouco explosiva. Vai ver, é o que Bonnie Hunt queria acentuar: o raio do amor pode cair sobre a cabeça de todos, não apenas sobre a de Humphrey Bogart e Ingrid Bergman.


Feitiço do Coração
Return to Me    Direção: Bonnie Hunt Produção: EUA, 2000 Com: David Duchovny, Minnie Driver Quando: a partir de hoje nos cines Morumbi 4, Tamboré 8 e circuito




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