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CRÍTICA
Valores religiosos e familiares dão o tom do romance
SÉRGIO RIZZO
ESPECIAL PARA A FOLHA
Vem lá de cima, como se fosse Deus a espreitar os diminutos seres humanos, a câmera
que apresenta Bob, o personagem
de David Duchovny (o agente Fox
Mulder, de "Arquivo X") em "Feitiço do Coração". Mais tarde, o
mesmo recurso é usado para
mostrar a paz de Grace (Minnie
Driver, de "Matador em Conflito") cuidando de seu jardim.
A deixa visual não deve ser desprezada. A diretora estreante
Bonnie Hunt (que interpreta a irmã de Grace) conduz sua história
de amor como se houvesse um
controle divino sobre o que fazemos, uma lei suprema governando o acaso. Todas as variações da
vida estariam escritas em algum
lugar e no fim tudo dá certo.
Deus é mencionado nos diálogos com alguma frequência. Talvez Bonnie Hunt não seja carola,
mas seu filme saiu assim -uma
comédia romântica em que não
só valores religiosos, mas também
familiares, dão o tom.
Não seria demais comparar a
anjos os quatro velhinhos (entre
eles, Robert Loggia e Carroll
O'Connor) que roubam as melhores cenas do filme. São protetores, divertidos. Quem não gostaria de tê-los como tios ou avôs?
O coração do título brasileiro
(no original seria Retorne para
Mim) não é usado de maneira figurada. Trata-se mesmo de um
órgão que, transplantado para
Grace, reordena a sua vida amorosa e a de Bob. Não há como torcer contra essa conjunção.
Ambos são politicamente corretos. Bob ergue prédios e uma nova casa para o gorila do zoológico
de Chicago. Grace tem um toque
mágico para cuidar de plantas e
ilumina o restaurante onde é garçonete e canta para os fregueses.
Os donos de gatos não vão gostar, mas há uma frase de Bob dando a entender que o afeto e a empatia dos personagens são coisa
de "dog person", ou gente que
prefere cachorro, em oposição à
distância mantida pelos felinos
em relação ao que os cerca. Não
por acaso, é um cachorro quem
primeiro identifica onde foi parar
o coração transplantado. Como
diz o título daquele desenho animado dirigido por Don Bluth, os
cães vão mesmo para o céu.
É preciso se identificar com essa
maneira positiva de encarar a vida
para apreciar os encontros e desencontros do filme. Mas há outros problemas, além da necessidade de compartilhar esse olhar.
Primeiro, não são tantos encontros e desencontros assim. Está
certo que o público de comédias
românticas sabe com quem os
personagens vão ficar, mas deve-se esperar da trama algum esforço
para dificultar o desfecho anunciado. Aqui, as coisas rolam sem
muitas pedras pelo caminho.
Outro entrave são os atores.
Mesmo quem gosta de Duchovny
e Driver há de reconhecer que a
praia de ambos não é essa. A química entre os dois é pouco explosiva. Vai ver, é o que Bonnie Hunt
queria acentuar: o raio do amor
pode cair sobre a cabeça de todos,
não apenas sobre a de Humphrey
Bogart e Ingrid Bergman.
Feitiço do Coração
Return to Me
Direção: Bonnie Hunt
Produção: EUA, 2000
Com: David Duchovny, Minnie Driver
Quando: a partir de hoje nos cines
Morumbi 4, Tamboré 8 e circuito
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