São Paulo, sexta-feira, 18 de agosto de 2006

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Crítica/"A Casa do Lago"

Argentino dirige com desenvoltura romance cercado por clima fantástico

INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA

Os argentinos são próximos do gênero fantástico, e talvez venha daí a desenvoltura com que Alejandro Agresti dirige "A Casa do Lago", onde a médica Kate (Sandra Bullock) vive um romance epistolar com o arquiteto Alex (Keanu Reeves). A particularidade desse amor é que o tempo de sua existência não está sincronizado, ou seja, ela vive dois anos à frente dele.
O cinema é o lugar mais propício ao encontro da realidade com a imaginação, e é possível lembrar de filmes notáveis em que humanos e fantasmas convivem, como "Contos da Lua Vaga", de Kenji Mizoguchi.
O fantástico é um registro em que o mistério dos seres é o que mais se preserva. Em "A Casa do Lago", os personagens têm algo de tão óbvio que chega a se tornar incômodo. Kate vive correndo atrás de pacientes na pior e não tem tempo para romance. Alex é arquiteto, filho de um arquiteto famoso.
O que eles têm de comum é a casa. Ao sair dali, a médica deixa um bilhete para o futuro habitante. Ele responde. Logo percebem que ela está em 2006 e ele em 2004. O fato não os impede de descobrir grandes afinidades, e iniciam um namoro epistolar dentro de um filme arquitetônico. Tudo gira em torno de construções. Em especial dessa casa em que Kate e Alex moram em momentos diferentes. Ela foi desenhada pelo pai de Alex. Habitá-la é um desafio; ela é a metáfora da solidão dos protagonistas.
Pois Kate e Alex são dois solitários -e podemos imaginar que um inventa o personagem do outro apenas para evitar que seu desencontro com o mundo seja mais completo. Essa é a característica mais marcante deste filme: a melancolia de seus protagonistas, que parece ser seu verdadeiro lar.
"A Casa do Lago" tem pontos muito fortes. Seu melhor momento talvez seja a preparação para o fantástico encontro no restaurante onde os protagonistas combinam um jantar (um deles, para amanhã; o outro, para dali a dois anos e um dia). O descabelado romantismo do roteiro também é muito interessante: tratando-se de um amor impossível, entre pessoas que vivem em dimensões diferentes, parece evocar "O Morro dos Ventos Uivantes".
Seus pontos fracos também existem: a necessidade de coloquializar uma situação inusual enfraquece a atmosfera fantástica e impede que o filme leve à ficção uma radicalidade que sugere, mas que, no fim, evita. Entre pontos fortes e fracos, é um filme acima da média.


A CASA DO LAGO    
Direção: Alejandro Agresti
Produção: EUA, 2006
Com: Keanu Reeves, Sandra Bullock
Quando: em cartaz nos cines Continental, Interlagos e circuito


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