São Paulo, quinta-feira, 18 de agosto de 2011

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CRÍTICA MUSICAL

Ópera carnavalesca de Zé Celso honra tradição de Oswald de Andrade

"Macumba Antropófaga" alterna citações de manifesto modernista com derivações de genial teatralidade

LUIZ FERNANDO RAMOS
CRÍTICO DA FOLHA

O teatro musical brasileiro. "Macumba Antropófaga", do Oficina, é uma ópera carnavalesca que honra a tradição de seu inspirador, Oswald de Andrade, como poesia cênica de exportação.
O "Manifesto Antropófago", de Oswald de Andrade (1890-1954), escrito em 1928, é um texto curto.
A partir dele José Celso Martinez Corrêa criou uma extensa dramaturgia, toda armada em versos, quase sempre musicados, remetendo às frases do manifesto direta ou lateralmente.
Uma novidade na trajetória recente do Teatro Oficina é a ocupação confortável do seu terreno circundante, pertencente a Silvio Santos.
Diante da proposta do empresário, de o Estado brasileiro trocar um terreno seu por aquele, o lugar, antes disputado belicosamente, tornou-se espaço de encenação, e o alvo da ação referida no título virou a presidente Dilma Rousseff.
É nesse sonhado ambiente que, depois de uma caminhada/prólogo até o vizinho TBC (Teatro Brasileiro de Comédia) para evocar Cacilda Becker, surgem sob uma tenda os personagens de Oswald e Tarsila do Amaral bebendo absinto e comendo rãs.
Será dali que o sóbrio Oswald de Marcelo Drummond partirá para, já dentro do teatro, despojar-se da vida burguesa e propor sua revolução cultural.

TEMAS DO MOMENTO
A estrutura narrativa dá conta maravilhosamente da primeira metade do espetáculo, alternando citações do manifesto, literais e cantadas, com derivações oportunas de genial teatralidade.
Em diálogo com a tradição oswaldiana do poema piada, e por certo emulando a tradição da revista, Zé Celso não cessa de reverberar assuntos locais e internacionais do momento, que vão se alternando com as falas de Oswald.
Essa variação de planos não se sustenta até o fim, principalmente porque a estrutura repetitiva das cenas, sempre cumprindo ciclos que vão do confronto entre o desregramento e a ordem até a vitória esmagadora de bons desregrados contra maus repressores, não ajuda. Ao final, há uma exaustão mútua de atuadores e espectadores, ainda que solidários na satisfação pelo realizado.
Como sempre acontece nas encenações do Oficina, há o saldo positivo do coro, que se entrega plenamente e alcança milagres. Ocorre que, quando exaurido, sua pretendida sensualidade reverte no oposto. O gozo vira obrigação e o que era generoso empenho e intenção libertária revela-se submissa alienação.
O mesmo ocorre com o homenageado. Se Oswald de Andrade foi controverso, a versão que Zé Celso apresenta de seu texto é didática e aponta uma leitura necessária. Talvez a meta de fazer de seu objeto de desejo -o território alheio- a razão de ser do seu teatro obrigue a esse estreitamento programático.
Para além dessas contradições, trata-se de um belo e originalíssimo musical.

MACUMBA ANTROPÓFAGA
QUANDO sáb. e dom., às 16h30; até 2/10
ONDE Teatro Oficina (r. Jaceguai, 520, Bela Vista, São Paulo, tel. 0/xx/11/3106-2818)
QUANTO de R$ 10 a R$ 50
CLASSIFICAÇÃO 16 anos
AVALIAÇÃO bom


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