São Paulo, Segunda-feira, 18 de Outubro de 1999
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ARTES PLÁSTICAS
Começa hoje no Museu Guggenheim exposição com o trabalho multimídia do artista pop
Factory de Warhol ganha filial em Bilbao

CARLOS ADRIANO
especial para a Folha

Bilbao está pop. Inaugura-se hoje, no Museu Guggenheim espanhol, "Andy Warhol: A Factory", exposição multidisciplinar e monumental que avalia o legado do artista americano de origem eslovaca nascido Andrew Warhola (1928-87).
Ele chamou de "Fábricas" os três estúdios que teve ao longo da vida, usinas de agitação industrial e iconoclasta, arregimentando pintura, filme, fotografia, moda, escultura, desenho, publicidade, vídeo, música. Cada fase liga-se a um lugar: 47th Street (63), Union Square (68) e 860 Broadway (74).
Com papéis de parede criados pelo próprio Warhol (Mao Tse-Tung, Vacas, Peixes) forrando as imensas paredes, a exposição é um vertiginoso labirinto pop, com amostragem espetacular e sem precedentes desta obra que mixou arte e massa, dos 50 aos 80.
São mais de 600 peças, entre material original (obras de arte) e serial (objetos de consumo) que ilustram o modo de produção do artista, sua indústria e ideologia.
Organizada pela fundação Guggenheim, a mostra exibe retratos e auto-retratos ("camouflages"), gravuras de celebridades (Marilyn Monroe, Truman Capote), arte abstrata ("Oxidations", "Rorschach"), anúncios, reapropriações da história da arte ("Mona Lisa", "Última Ceia"), arte gráfica e moda ("Harper's Bazaar"), publicações ("Interview"), programas de vídeo e televisão, séries serigráficas ("Mao", "Martelos e Foices", "Caveiras", "Dólares", "Sapatos"), a música do Velvet Underground e o cinema.
O programa de filmes inclui "extravagâncias" como "Sleep" (1963), um homem dormindo numa imagem que dura mais de 5 horas, e "Empire" (1964), plano fixo de 8 horas do Empire State Building. Na linha de montagem criou "Superstars" como Edie Sedgwick, Taylor Mead, Ondine e Viva (Susan Hoffmann).
Outras curiosidades são o faroeste gay "Lonesome Cowboys" (1967/68), os diários domésticos e os "Screen Tests" com Mario Montez, Gerard Malanga, Amy Taubin e Susan Sontag.
Entre a farta memorabilia, um Mao monumental, cartazes de shows de Nico e Mothers of Invention, serigrafias de Judy Garland e Debbie Harry, a guitarra Gibson de Sterling Morrison, um vestido de papel ("Open this End"), fotos de bastidores, capas de disco (jazz, Velvet e Nico, Rolling Stones), caixas de produtos (Brillo, Kellogg's, Campbell).
Após Bilbao, a mostra vai para Porto e termina em Nova York, como parte do programa do milênio do Guggenheim, no ano 2000.

História
No playground pop-conceitual que se instalou em Bilbao e Viena, talvez não caibam juízos de valor sobre Warhol. Sua arte foi confundir esses estatutos na sociedade (e escala) industrial e explicitar a cultura da repetição.
Foi diluição pop de dadá e Walter Benjamin (fim da aura da obra de arte na época da reprodução em massa). E daí? A mais-valia de seu jogo está no lance ousado (intenções éticas e comerciais à parte) de massificar a vida e a arte.
Se Baudelaire sinalizou o mal-estar sob a pressão técnica, Warhol fez do dilema um fetiche e celebrou o culto. Assim, vale pensar sobre a justaposição que se exibe: obras "originais" e "comerciais".
Não é à toa que a Factory foi fundada em 1963, quando Warhol se tornou imã para artistas, celebridades, socialites e marginais do underground.
Em 1965 decidiu devotar-se ao cinema e abandonar a pintura, ao apresentar pela primeira vez o Velvet Underground, afirmando o descaso por quadros e o desejo de combinar música, arte e cinema (disse preferir pendurar um vestido a uma pintura na parede).
Em 1968 levou um tiro de Valerie Solanas e passou a fazer a farra na revista "Interview". No início dos 70, pintou ícones políticos comunistas. No fim dos 70, fez "Dez Retratos Judeus do Século 20" (Gertrude Stein, Kafka, Einstein, Gershwin, Freud, Irmãos Marx), colaborou com jovens artistas (Basquiat e Clemente) e produziu programas para televisão a cabo.


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