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'Enciclopédia' de 1.100 páginas, com 88 ensaios, propõe nova história cultural do país a partir da idéia de que 'nenhum Brasil existe'
Que país é este?
Romulo Fialdini/ Divulgação/ Galeria Brito Climino
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Detalhe da obra "Atlas 3", da série "Assim É...se lhe Parece" (2003), de Nelson Leirner |
CASSIANO ELEK MACHADO
DA REPORTAGEM LOCAL
Equilibrado sobre uma frase
que Drummond publicou 70 anos
atrás, um tijolo de nada esbeltas
1.100 páginas chega nesta semana
às livrarias para modificar o panorama das obras que tentam responder que diabos é este país chamado Brasil.
Com o irônico subtítulo de "Pequena Enciclopédia", o calhamaço "Nenhum Brasil Existe" atraca
nas estantes trazendo um volume
de opiniões sobre o país nunca
visto em território nacional.
Projeto iniciado há cinco anos,
no inverno de Massachusetts, nos
Estados Unidos, é um livro feito a
176 mãos, coordenadas por João
Cezar de Castro Rocha, 38, professor de literatura da Universidade do Estado do Rio de Janeiro.
A convite dele, 87 intelectuais de
primeiro time (mais o organizador da empreitada) ensaiaram sobre a história cultural do país, da
Carta de Caminha aos raps dos
Racionais MC's .
Na carta-convite que enviou às
dezenas de sociólogos, historiadores, críticos literários e adjacentes, Castro Rocha fazia apenas
dois pedidos expressos.
O primeiro era que não se abusasse do academiquês, ainda que
a Academia fosse o habitat natural de 95% deles. O segundo, e
mais importante, era a bússola
conceitual do projeto.
"Eu os desincumbia de revelar o
que era o Brasil uma vez mais",
conta o professor, atualmente
dando aulas na Universidade de
Wisconsin-Madison (EUA).
Tema recorrente de seus trabalhos até aqui, o organizador pretendia trazer para esse grande debate das questões culturais brasileiras a crítica à "verdadeira obsessão na história cultural brasileira com a definição do espírito
nacional". E é aí que entra Drummond, que em seu poema "Hino
Nacional" crava "O Brasil não nos
quer! Está farto de nós! Nosso
Brasil é no outro mundo. Este não
é o Brasil. Nenhum Brasil existe. E
acaso existirão os brasileiros?".
A idéia de Castro Rocha não era
passar ao largo das inevitáveis
idéias dos chamados "Intérpretes
do Brasil". Sérgio Buarque de Hollanda, Gilberto Freyre, Caio Prado Júnior e companhia existem, e
estão discutidos às fartas no livro,
mas não a partir de leituras ortodoxas de seus retratos do país.
Essa "História Revista da Cultura e Literatura Brasileira", como o
volume foi batizado no original,
publicada na Universidade de
Massachusetts Dartmouth em
2001, chamou para tanto alguns
de nossos maiores intelectuais de
hoje -e suas obsessões.
Walnice Nogueira Galvão ficou
com Euclydes da Cunha, João
Adolfo Hansen abraçou uma vez
mais padre Antônio Vieira, o português Abel Barros Baptista ficou
com seu Machado de Assis.
E tem ainda Roberto DaMatta,
Carlos Guilherme Mota, Luiz
Costa Lima, o alemão Hans Ulrich Gumbrecht e o precocemente
morto Roberto Ventura, com texto inédito sobre Manoel Bomfim.
A versão nacional da enciclopédia é mais encorpada que a norte-americana, lançada como número especial da revista "Portuguese
Literary and Cultural Studies".
Editada pela Topbooks, experiente em cartapácios de grande
importância, como os "Ensaios
Reunidos", de Otto Maria Carpeaux, e "Lanterna na Popa", de
Roberto Campos, com apoio da
UniverCidade Editora e da UERJ,
o livro traz 23 artigos a mais do
que os publicados no exterior.
O volume ganhou ainda fotos
(como reproduções de manuscritos inéditos de Mário de Andrade
sobre Graça Aranha) e, mais importante, bem cuidados índices
onomástico e analítico.
Um exame dessas duas listas dá
um bom panorama das questões
mais fluorescentes no pensamento sobre o Brasil. Entre os temas
mais citados, estão "modernidade", "moderno", "formação",
"cordialidade" ou o ensaio de Roberto Schwarz "Idéias fora do Lugar", que fez 30 anos neste mês.
Dos nomes mais discutidos, se
destacam os três Andrades (Mário, Oswald e Carlos Drummond), João Cabral, Gilberto
Freyre, Guimarães Rosa e Machado de Assis. Antonio Candido lidera com folga o "who is who" entre os críticos literários.
Outra mudança do volume
americano para a edição de agora
foi o modo de organização dos
ensaios. "Nenhum Brasil Existe"
está estruturado em torno de sete
núcleos temáticos.
Caminha abre o bate-bola. Em
seguida está o bloco "Intermediários Culturais" onde se discute como todos nossos principais modelos culturais vieram do exterior.
"Gilberto Freyre: Uma Teoria
de Exportação" é o nome do terceiro conjunto de textos, seguido
dos capítulos "Cultura", "Literatura" (o maior dos blocos, com 32
artigos), "História e Crítica Literária". "Audiovisual", um dos xodós do autor, completa o livro. "O
que criou o Brasil como o Brasil
foi a Rádio Nacional de 1936, o
"Jornal Nacional" de 1969, a música popular, o cinema nos anos
60 e a televisão de hoje", diz .
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