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LITERATURA
Narrativas de "O Vôo da Madrugada" abordam erotismo e morte
Sérgio Sant'Anna usa contos para "jogar com a linguagem"
ROGÉRIO EDUARDO ALVES
DA REPORTAGEM LOCAL
Os contos que compõem "O
Vôo da Madrugada", de Sérgio
Sant'Anna, nascem dobrados sobre eles mesmos. Suas narrativas
urbanas recheadas de erotismo,
perversão, violência e morte não
deixam o leitor esquecer que são
apenas histórias que estão sendo
escritas por um contista, verdadeiro personagem.
Nesse exercício de metalinguagem, Sant'Anna, 62, transforma o
espaço da prosa em um laboratório linguístico, como em "O Gorila", a mais longa das histórias,
uma desventura de um personagem que vive a passar trotes em
mulheres e acaba encurralado numa emboscada criada a partir de
suas próprias atividades.
"Meus textos sempre tiveram isso de refletir sobre o negócio de
escrever. Gosto de fazer experiências com contos, criando um jogo
com a linguagem que se aproxima
muito da poesia", diz de sua casa
no Rio o autor de "A Senhorita
Simpson" (1989).
Por isso, o leitor desse "O Vôo
da Madrugada" não se espanta ao
se deparar com um texto intitulado "Um Conto Obscuro" na sequência de "Um Conto Abstrato",
que anuncia: "Um conto de palavras que valessem mais por sua
modulação que por seu significado. Um conto abstrato e concreto
como uma composição tocada
por um grupo instrumental".
Transferir a sensação de outras
formas de arte para a literatura é
um dos objetivos a que o escritor
tem se dedicado, principalmente
quando trata das artes plásticas.
"Sou fascinado pelas artes plásticas, considero a mais avançada
das artes no sentido da experimentação", diz Sant'Anna.
Por isso, arma os últimos três
contos do livro sobre imagens de
artistas plásticos, como Balthus
(1908-2001) e Egon Schiele (1890-1918). "Fiquei seduzido e emocionado com imagens do nu feminino desses artistas, queria de alguma forma transpor essas emoções
para a palavra e suei tentando traduzir aquela visualidade."
O tom encontrado nos contos
aparece com traços de um erotismo carregado. "Como instinto
básico, acho que eros tem muito a
ver com a criação. Neste livro, resolvi radicalizar usando várias
formas de trabalhar o erotismo,
algumas que são até tabus." Tabus que não se resumem a cenas
fortes de incesto, mas a construções que aprofundam a reflexão
sobre o erotismo e a morte.
"Morte é uma coisa que está na
cabeça humana. As pessoas têm
medo disso. Também gostaria de
não ter isso na cabeça, mas, ao
mesmo tempo, acho fascinante.
Para este livro, lembrei de Edgar
Allan Poe, que tratou basicamente da morte e da melancolia em
seus contos. Não por acaso, um
dos textos que mais gosto de todos que já li é "A Filosofia da Composição", no qual Poe trata a melancolia como fonte de poesia."
Sant'Anna levou cerca de seis
anos para reunir os textos de "O
Vôo da Madrugada". Agora, enquanto prepara um novo conto,
cuja história parte de uma personagem que critica um texto de um
escritor, espera a adaptação para
o cinema de seu livro "Um Crime
Delicado", que está sendo feita
por Beto Brant e Marçal Aquino.
O VÔO DA MADRUGADA. De: Sérgio
Sant'Anna. Editora: Companhia das
Letras. Quanto: R$ 32 (248 págs.).
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