São Paulo, quinta-feira, 18 de novembro de 2004

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TEATRO

Texto premiado em 2001 marca a estréia de Sergio Salvia Coelho na direção e traz Angela Dip em registro dramático

Emaranhado de ambigüidades circula "UmBigo"

VALMIR SANTOS
DA REPORTAGEM LOCAL

"Tudo é uma caixa-preta, inviolável. E eu já desisti de tentar compreender as coisas", afirma o Homem na reta final de "UmBigo".
Mas é quando justamente as certezas diminuem que as coisas começam a ficar mais claras, se é que se pode dizer assim.
O texto de Rubens Rewald recorta tempos, espaços e personagens de modo que um se sobreponha, dialogue ou desautorize o outro.
A ambigüidade permeia essa história em aberto que envolve os personagens Homem, Menino, Mulher e Garota.
Uma soma de três na matemática dramatúrgica de Rewald, cujo texto marca a estréia profissional do crítico da Folha Sergio Salvia Coelho na direção teatral. O espetáculo inicia temporada amanhã no Centro Cultural São Paulo.
Premiado em 2001 em concurso do Ministério da Cultura, "UmBigo" ganha primeira montagem. A remissão à parte do corpo que guarda a cicatriz do corte do cordão umbilical ajuda a ilustrar o que se carrega vida adentro.
No passado, houve um romance transformador entre a Mulher e o Menino. Dele, nasceram a Garota, que hoje questiona o pai, com idade para ser seu irmão, sobre a morte da Mulher.
O texto espalha ambíguas memórias de incesto, desenterra um suicídio e traz um recorte para o drama urbano do menino de rua versus adulto burguês.
"Passei a entender a peça a partir do universo dos meninos de rua, que são vistos como vítimas e vivenciam a esquizofrenia de se adaptar a cada situação ou risco que surgem", diz Coelho, 40, que também é dramaturgo ("Só, Ifigênia, sem Teu Pai" e "Amor: Modo de Usar").
"Mais que denúncia, é uma metáfora de como a gente vive."
Angela Dip contracena com três atores recém-formados no cenário de Mauro Martorelli, que sugere uma caixa-preta hermeticamente fechada. Todos permanecem o tempo todo em cena.
Atriz conhecida pelo registro de interpretação mais cômico, Dip surge aqui em tom diferente, segundo Coelho, que explora um trabalho próximo ao melodrama, "mas nem tanto".
Em dez anos de dramaturgia -"O Rei de Copas", "Narrador", "Ante-Câmara" etc.-, Rewald manifesta, com recorrência, insatisfação com os limites do personagem. "UmBigo" aprofunda isso e dá margem ao revezamento de personagens/atores.
"Não é o caso do curinga, que vai do zero ao infinito, mas de uma opção estética na qual um personagem que busca sua forma pode adotar um RG num momento e outro depois, sem deixar de ser o mesmo", diz Rewald, 39.
Ele também é cineasta e co-dirige com Rossana Foglia o longa-metragem "Corpo", em fase de produção.
Rewald e Coelho (formado em direção teatral) se conhecem há pelo menos 15 anos. Estudantes na USP, um criou vídeo para espetáculo de curso do outro, e outro dirigiu atores para o curta-metragem do um. Enfim, "UmBigo" os une novamente.
Feita à própria custa (nem apoio de restaurantes), a produção chega a R$ 1.000.


UMBIGO. Texto: Rubens Rewald. Direção: Sergio Salvia Coelho. Figurino: Helena Cerello. Iluminação: Rafael Losso. Sonoplastia: Junae Andreazza. Com: Angela Dip, Anna Cecília Junqueira, Leandro Siqueira e Mairun Sevá. Onde: Centro Cultural São Paulo - sala Paulo Emílio Salles Gomes (r. Vergueiro, 1.000, Paraíso, SP, tel. 0/xx/11/3277-3611). Quando: estréia amanhã, às 21h; sex. e sáb., às 21h; dom., às 20h. Quanto: R$ 12 (dia 3/12; sex., promoção a R$ 1,20). Em cartaz até 19/12.


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