São Paulo, sexta-feira, 18 de novembro de 2005

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CDS

JAZZ


Seis discos reúnem shows do músico nos anos 60; "Miles in Tokyo" é destaque

Álbuns percorrem o período de mutação de Miles Davis

1º jun. 1987/Associated Press
Miles Davis durante apresentação, em 1987, no antigo anfiteatro romano, em Tel Aviv (Israel)


FABRICIO VIEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL

Quando Miles Davis (1926-1991) adentrou a década de 60 sem um grupo fixo, com o seu primeiro grande quinteto (depois sexteto) dissolvido definitivamente, muitos se perguntaram se o melhor momento do trompetista já tinha ficado para trás. Mas o músico americano mostrou mais uma vez fôlego para renascer e voltar ao centro da cena jazzística.
Um pacote de seis CDs, que acaba de desembarcar nas prateleiras em edição nacional, mostra o que foi esse período de transição -nem por isso menos interessante ou relevante na discografia do trompetista.
Somente no fim de 1964 Davis teria no palco o que passaria a ser conhecido como seu segundo grande quinteto: Wayne Shorter (sax), Herbie Hancock (piano), Ron Carter (contrabaixo) e Tony Williams (bateria).
"Miles in Berlin", show de setembro de 64 que está entre os lançamentos, traz o primeiro registro desse que seria um dos grupos mais influentes e requintados da história do jazz.
Após o saxofonista John Coltrane (1926-1967) deixar de vez o grupo de Davis, na virada dos anos 50 para os 60, o trompetista tateou por alguns anos até chegar a Shorter. George Coleman ocupou o posto por um bom tempo. Mas acabou perdendo a vaga após pressão dos outros músicos que formariam o "segundo grande quinteto" e queriam alguém com um toque menos "clássico".
Em sua autobiografia, Davis aponta Tony Williams, o baterista-prodígio que começou a tocar com ele com apenas 17 anos, em 63, como o grande fomentador da saída de Coleman. "Tony não gostava de George. Ele preferia alguém que estivesse buscando algo diferente, como Ornette Coleman [um dos pais do free jazz]", conta o trompetista.
George Coleman aparece em quatro dos álbuns que acabaram de sair, sendo uma boa oportunidade para conferir seu sopro (e julgar se merecia ter saído ou não do grupo). Se Coleman nunca foi um inovador -no sentido que Coltrane, Pharoah Sanders e Archie Shepp o foram-, não se pode classificá-lo como medíocre: ele foi um importante saxofonista, apenas não incorporou a seu estilo as inovações do free jazz.
Mas basta ouvir Coleman em ação, tocando nos CDs faixas como a conhecida "My Funny Valentine", "All Blues" ou "Joshua" para atestar a beleza de seu sopro.
Davis disse que sua primeira opção para substituir Coleman era Wayne Shorter -saxofonista que se apresentou no Brasil no mês passado e mostrou o quanto a sua música permanece viva e fundamental-, mas ele estava na época envolvido com os Jazz Messengers de Art Blakey (1919-1990).
E a espera rendeu o mais belo dos álbuns recém-lançados: "Miles in Tokyo", gravado em julho de 64. Enquanto Shorter não estava disponível, Sam Rivers ocupou seu lugar, sendo o grande destaque daquela excursão ao Japão.
As dissonâncias produzidas pelo sax-tenor de Rivers temperaram as performances, fazendo com que até Davis soprasse seu trompete com maior liberdade que o usual, como pode ser conferido em "So What" e "Walkin", presentes no álbum.
Pena que a parceria de Rivers com Davis foi curta demais, ocasional. Mas Shorter tinha de ocupar seu posto no grupo de Davis ou o segundo quinteto não teria sido o que foi. E não teríamos álbuns como "Nefertiti" e "Miles Smiles".
Shorter apenas abandonaria Davis anos depois, para montar o Weather Report, um dos mais importantes grupos de fusion da década de 70.


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