São Paulo, quarta, 18 de novembro de 1998

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Obra do poeta predomina em biografia de Bréchon

da Reportagem Local

A fotobiografia de Fernando Pessoa, de Maria José de Lancastre, é uma reedição da obra originalmente publicada em 81 em Portugal, uma espécie de álbum iconográfico do escritor português e de seu tempo, acompanhado de textos do poeta à guisa de legendas.
Há desde imagens da infância de Pessoa até seus retratos mais conhecidos -como o desenho do contemporâneo José de Almada Negreiros, que se tornaria sua imagem mais famosa.
Já a biografia assinada por Robert Bréchon ("Estranho Estrangeiro"), publicada há dois anos na França, é a terceira obra a se debruçar sobre a vida do poeta, que tem, segundo seu próprio autor, no prefácio, a "única vantagem" sobre as demais de dispor de textos que estavam inéditos.
Bréchon também adverte que vai contar "uma vida menos rica em acontecimentos que em obras". E, por isso, tenta desvendar a personalidade do poeta muito mais por meio de seu trabalho do que pela parca informação existente sobre quem foi e como viveu.
Não se esperem aí grandes revelações, ou mesmo a confirmação, por exemplo, da suspeita de que Pessoa fosse homossexual, como crêem alguns -Bréchon apenas sustenta a hipótese de sua bissexualidade, possivelmente nunca levada às "vias de fato", em citações como "O amor é essencial. O sexo é só um acidente".
Também não consegue avançar, por falta de testemunhos, na questão, fundamental para o entendimento da persona Pessoa, segundo estudiosos do poeta, da relação com seu padrasto, o comandante João Miguel Rosa.
Entre histórias de sua vida intelectual em Lisboa e citações várias da obra de Pessoa, o leitor pode desfrutar de algumas passagens curiosas na trajetória do poeta português, morto aos 47 anos vitimado por uma crise hepática.
Uma delas conta o hilário encontro entre Pessoa e o mago inglês Aleister Crowley, o mesmo que influenciaria, décadas mais tarde, Raul Seixas e seu então parceiro Paulo Coelho -a divisa de Crowley, "A única lei é: faz o que quiseres", foi "imortalizada" no Brasil na canção "Sociedade Alternativa", que dizia: "Faz o que quiseres pois é tudo da lei".
Pois Pessoa, que se interessava pelo ocultismo e chegou a pensar a exercitar a astrologia como profissão, enviou a Crowley uma correção de seu mapa astral, lido em um livro do mago.
Crowley gostou tanto que foi a Lisboa conhecer o poeta, em agosto de 1930. Lá, os dois simulam, dizem que para Crowley poder fugir do assédio de credores e da polícia, o suicídio do mago, na Boca do Inferno, um buraco nos rochedos perto de Cascais.
O "desaparecimento" foi noticiado nos jornais de Lisboa, Londres e Paris, e até a Scotland Yard foi acionada. O brincalhão Pessoa fez toda sorte de declarações fantasiosas a respeito. Na verdade, Crowley já havia deixado o país e se encontrava, muito vivo, na Alemanha. Sobreviveria 12 anos a Fernando Pessoa. (CM)



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