|
Texto Anterior | Índice
SHOW - CRÍTICA
O sertão
vai virar
mar?
da Reportagem Local
A contar por sua passagem
por São Paulo, na quarta e na
quinta últimas, a banda de Chicago Tortoise talvez não mereça, mesmo, a alcunha de "pós-rock" que vem sendo frequentemente colada a ela, à revelia.
O termo é fugidio, sim, mas
guarda também um tanto de
poesia -admitir-se pós-rock
(eles não se admitem, perceba) é
admitir em alguma instância o
rock como passado, datado,
quem sabe morto. Mas Tortoise
vem dizer que o rock não morreu. Não é tanto uma banda de
pós-rock como uma banda de
rock, em si, propriamente dita.
Que modelagem de rock? Aí a
coisa complica. Nos círculos repetitivos e monótonos do show,
todo calcado no álbum "TNT"
(98), às vezes parecem fazer
rock tipo lounge, de elevador,
infanto-juvenil, rock para dormir (para dormir? pós-rock?).
Na maior parte do tempo, o que
parece mesmo é jazz-rock, coisa
temerosa que Sting já transformou em técnica de tortura.
Sendo jazz-rock -não há vocais, nunca; só os seis bons músicos fazendo rodízio entre vários instrumentos- , evocam, e
isso tem sido comum neste fim
de século (pense em Radiohead,
Spiritualized...), o fantasmão insone do rock progressivo.
O que tudo isso quer dizer?
Que, sim, às vezes é melancólico, chato, insistente. Mas, na
mesma proporção, é bonito, impactante -especialmente na
longa "TNT", romântica, quase
sonhadora -opa, se cabe romantismo não é pós-rock.
Durante "TNT" acontece de
tudo -ela lembra faroeste, Ennio Morricone, Hollywood; tem
clima, é noir; um disco voador
parece fraturá-la, descendo enquanto o tema se corta em dois.
De repente Tortoise evoca Joy
Division, depois "Cai, Cai, Balão" (em "The Suspension Bridge at Iguazú Falls"), de novo faroeste... É recombinação genética, a construção do Frankenstein -é, deve ser pós-rock.
Ah, e eles gostam do Brasil e
da música brasileira, e então você fica a procurar referências
-muita percussão, um samba
duro aqui, uma bossinha ali,
chocalho e pandeiro, cataratas
do -!!!!- Iguazú... Então entra
Tom Zé, a consumação da globalização, músico magro e maldito do Terceiro Mundo sendo
secundado por seis rapagões
caídos da civilização.
Tortoise se converte, de repente, em bandinha de coreto
do sertão nordestino, e Tom Zé
e o maluquíssimo Jarbas Mariz
são secundados pela banda virtuosa que nunca tiveram.
Tom Zé se esbalda, critica o
"analfabetismo fonético" do
Primeiro Mundo (que o chama
"Tam Zi"), deixa os meninos
tronchos com estripulias incompreensíveis. Tudo bem, a
gente também não entende esse
negócio de pós-rock. Mas que
parece que o sertão vai virar
mar, ah, parece.
(PEDRO ALEXANDRE SANCHES)
Avaliação:
Texto Anterior: Confira os espetáculos Índice
|