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Marginalizada, música caipira vive renascimento
JEAN-YVES DE NEUFVILLE
especial para a Folha
O cantor e compositor Ranulfo
Ramiro da Silva, conhecido como
Xavantinho, da dupla Pena Branca & Xavantinho, morreu em 8 de
outubro passado, em São Paulo,
aos 56 anos. Os principais jornais
deram muito pouco espaço. E só.
A cultura popular perdia uma
das duplas mais autênticas e respeitadas da música caipira -a
música rural de raízes brasileira,
que se caracteriza pelo uso da viola e da rabeca.
Em sua casa, na zona norte de
São Paulo, José Ramiro, 59, o Pena Branca, parece não se importar
com a indiferença da mídia. "O
brasileiro é assim mesmo", diz.
"Esquece fácil."
Afinal, a dupla ralou durante 20
anos, de 1961 a 1981, até ser lançada por Rolando Boldrin no programa "Som Brasil", na Globo, e
gravar seu primeiro LP, "Velha
Morada" (WEA). E mesmo depois disso, nunca foi fácil.
Apesar da perda do irmão, o
violeiro prefere falar de seus projetos, do disco solo que está preparando, e relembra com orgulho
a trajetória percorrida.
O repertório mescla composições próprias, interpretações da
moda de viola, da toada, da toada-canção, do "cateretê", da moda
campeira, do batuque, da "marujada" e da "folia de reis", refletindo a incrível riqueza e diversidade
da música rural de raízes, além de
formar uma ponte com a MPB.
Mas, nem sempre é fácil encontrar nas lojas um dos 11 discos da
dupla, com exceção de "Ao Vivo
em Tatuí" (Kuarup) com Renato
Teixeira, vencedor de um prêmio
Sharp, 300 mil cópias vendidas.
Um resultado respeitável, mas
ainda assim fraquinho se comparado com os números exibidos
por duplas "neo-sertanejas". Estes trocaram os instrumentos autênticos por guitarras elétricas,
sintetizadores, baterias programadas e gravam em Nashville e
Los Angeles, injetando em seu
som doses cavalares de arranjos
country e pop "middle of the
road", em sintonia com o modelo
de "modernidade" da classe média rural ascendente, consumidora de grifes e rodeios milionários.
As diferenças são tamanhas que
houve mutação de gênero, surgindo duas escolas distintas: a
"oficial", calcada no country e no
pop romântico americano, alimentada pelas gravadoras grandes, e a música caipira acústica,
marginalizada pela imprensa e
pelas rádios, empurrada para um
showbiz de subsistência e de produção independente.
As grandes estrelas da música
caipira hoje têm por nomes Chico
Lobo, Renato Andrade, Zé Coco
do Riachão, Ivan Vilela, Zé Mulato & Cassiano, Almir Sater, Pereira da Viola, Helena Meirelles e
Roberto Corrêa. Daí os versos da
dupla Zé Mulato & Cassiano: "Se
me chamam de caipira fico até
agradecido/pois falando sertanejo eu posso ser confundido".
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