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CINEMA
Planejamento publicitário do filme de Gibson se baseou na disseminação da controvérsia sobre o conteúdo do longa
Polêmica faz ferver sangue de "Paixão"
PEDRO BUTCHER
CRÍTICO DA FOLHA
Quando os primeiros rumores
em torno de "A Paixão de Cristo"
começaram a pipocar, em agosto
de 2002, Mel Gibson já estava na
Itália, terminando de escolher as
locações do filme (na região de
Basilicata, ao sul do país). Um
mês depois, o projeto foi oficialmente anunciado em entrevista
coletiva na sala Fellini da Cinecittà, o lendário estúdio romano onde ele filmou as cenas de interior.
Na entrevista, Gibson contou
que "Paixão" era o projeto da sua
vida. A idéia surgira dez anos antes, durante uma crise pessoal, e
seu objetivo era ser o mais fiel
possível ao relato bíblico das últimas horas da vida de Cristo. Por
isso, o filme seria falado em latim
e aramaico. "É claro que ninguém
quer tocar em um filme falado em
línguas mortas. Eles acham que
estou louco", disse Gibson, referindo-se aos executivos dos grandes estúdios. Coube, então, à Icon
Productions, que pertence ao
ator, bancar sozinha os US$ 25
milhões da produção, pois nenhuma grande produtora queria
se comprometer. Além disso,
Gibson não queria nenhuma
grande estrela no elenco.
A imprensa tampouco o levou a
sério. Revistas especializadas
apostavam em um fracasso, prevendo que o filme faria, no máximo, US$ 30 milhões em seus primeiros dias em exibição. Fez US$
82 milhões, e no próximo fim de
semana deverá ultrapassar US$
300 milhões, sem contar rendas
internacionais.
Todos quebraram a cara ao subestimar a capacidade de Gibson,
que desde o início agiu como um
profundo conhecedor das entranhas do jogo hollywoodiano. Cada passo parece ter sido meticulosamente calculado, da decisão por
anunciar o projeto na Itália, a
uma distância segura do frenesi
de Los Angeles e a poucos quilômetros de distância do Vaticano,
ao forte estímulo à polêmica, além
de uma seletiva aparição em programas de televisão.
Absolutamente tudo foi motivo
para polêmica. Até mesmo o título, que precisou ser trocado duas
vezes por questões de direitos autorais, até chegar ao definitivo
"The Passion of the Christ".
"A Paixão de Cristo" ocupou a
mídia por quase um ano inteiro
antes mesmo de estar pronto, por
conta de rumores de se tratar de
uma versão ultraviolenta e possivelmente anti-semita da morte de
Cristo, estimulando a visão de que
os judeus teriam sido responsáveis pela morte de Jesus.
Gibson usa sempre a mesma defesa: "O filme é apenas uma dramatização fiel do que a Bíblia diz".
Apoiado na própria popularidade, o astro se fez arauto da verdadeira história da morte de Cristo.
Em 2003, a polêmica foi alimentada, com o roteiro do filme e cópias piratas surgindo misteriosamente nas mãos de grupos judaicos, que logo passaram a esbravejar contra o filme, ajudando o
marketing espontâneo.
A polêmica aumentou com a estréia do filme (nos EUA, ela aconteceu no dia 25 de fevereiro, Quarta-Feira de Cinzas, em mais de
2.000 salas). Os cinemas encheram, não apenas graças à romaria
cristã, mas também pelo público
atraído pela propalada violência.
As grandes esperanças de Gibson, agora, são de que o filme seja
absolvido das pré-acusações de
anti-seimitismo e, uma vez avalizado pelo status de "blockbuster
mundial", chegue intacto à corrida do Oscar 2005. Como "O Senhor dos Anéis", é um exemplo
de triunfo pessoal. O que, no fim
das contas, costuma suplantar
qualquer polêmica. Verdadeira
ou falsa.
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