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CRÍTICA
"Cidadão Brasileiro" e a identidade nacional
BIA ABRAMO
COLUNISTA DA FOLHA
Começou bem a nova novela da Record, "Cidadão Brasileiro". A audiência foi OK (não ótima, não tem conseguido "segurar" o que recebe de "Prova de
Amor"), tem produção que acerta (mas erra também) e, ah, é
uma novela de Lauro César Muniz, ao fim e ao cabo.
Muniz, nos anos 70, na Globo,
escreveu alguns dos roteiros
mais instigantes do período, como "O Casarão" e "Escalada", e,
na virada dos anos 80/90, criou
"O Salvador da Pátria". É quase
que o autor canônico do falecido
padrão Globo de qualidade: tem
perfeito domínio da narrativa
melodramática, intuição para
captar tipos humanos e perspicácia para dar um sentido histórico
às sagas individuais.
Levou para Record o mesmo
ímpeto, ao criar uma novela que
se desdobra por 50 anos da história do Brasil e por três cidades
(São Paulo, Brasília e a fictícia
Guará).
A Record, na arrancada "rumo
à liderança", garante minimamente as condições necessárias
para a história emplacar.
O que tem cheiro de dar errado
em "Cidadão Brasileiro" é a ambição da história e a intenção
bastante clara de, por meio do
protagonista Antônio, ensaiar
uma interpretação das questões
nacionais do últimos 50 anos.
O herói, ambíguo como convém nos dias de hoje, é talhado
para representar o sujeito na luta
pela ascensão social em um país
refratário a qualquer projeto de
construção que dure tempo o suficiente para se realizar.
Tudo isso parece muito interessante, e é, mas talvez não haja
mais lugar na novela para uma
história que exija tanto fôlego e
dedicação. Não por uma questão
de má educação (ou má vontade)
da audiência, que acaba sendo
culpada de tudo, mas por que,
talvez tenha simplesmente se esgotado esse modelo.
De certo modo, a possibilidade
de a novela oferecer um espaço
imaginário de construção da
identidade nacional talvez tenha
se estreitado, se estiolado e, por
fim, sido transferida para as minisséries paradidáticas. Como hipótese, talvez essa possibilidade
só tenha podido existir plenamente quando havia um grupo
de produtores/autores mais ou
menos homogêneo em termos
geracionais, que tenha partilhado cenários culturais mais coesos. A ver.
Muniz, entretanto, não é bobo
e já se prepara para enfrentar as
vicissitudes da audiência com
humor (meio fácil, por ora) e,
claro, sexo, num nível de ousadia
inaudito para a emissora.
Agora, alguém precisa dizer a
Lucélia Santos que interpretar
uma balzaca (de 50, segundo o site da novela) meio vigarista,
meio misteriosa, com voz de Lolita é um pouco bizarro. Gabriel
Braga Nunes, carismático no papel de homem comum, é uma espécie de surpresa. E, talvez, gente
como Paloma Duarte, que nunca
foi muito bem aproveitada na
Globo, encontre seu lugar ao sol
na Record.
@ - biabramo.tv@uol.com.br
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