São Paulo, sexta-feira, 19 de maio de 2000


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Segundo longa-metragem de Tata Amaral, "Através da Janela" estréia hoje em SP e no Rio
Filme narra uma complicada relação entre mãe e filho e já foi exibido em festivais, como o de Roterdã (Holanda)
Tragédia do Cotidiano

DANIEL CASTRO
DA REPORTAGEM LOCAL

Segundo filme da cineasta Tata Amaral, 39, "Através da Janela" chega hoje a três cinemas de São Paulo e a dois do Rio, depois de percorrer vários festivais, entre eles o de Roterdã (Holanda).
Rodado no bairro da Lapa (zona noroeste de São Paulo) em 1998, ao custo de R$ 1,4 milhão, o filme retrata, resumidamente, cinco dias da vida de uma mãe superprotetora, Selma (Laura Cardoso), e de seu filho, o desempregado Raimundo, o Raí (Fransérgio Araújo), que a explora de forma, digamos, sedutora.
Tata Amaral filmou uma tragédia, no sentido grego -ou teatral- da palavra, tendo esse cotidiano como pano de fundo. No primeiro dia (cada dia é um ato), Selma aparece dona da situação.
Aos poucos, graças à intromissão da amiga Tomasina (Ana Lúcia Torre), Selma vai percebendo que algo está errado com o filho, que recebe telefonemas de uma mulher misteriosa. Mas ela se recusa a querer descobrir quem é.
Tata Amaral espera atrair até 100 mil espectadores para seu filme, embora concorde que "nada de extraordinário" acontece nele. Leia a seguir trechos de entrevista à Folha.

Folha - No filme, não está claro que existe uma relação incestuosa entre mãe e filho. Em determinado momento, eles se dão conta de que existe erotismo, mas o repelem.
Tata Amaral -
O que eu quis contar é exatamente isso. É uma das características da Selma. Ainda que esse erotismo aflore, ela não quer ver, assim como ela não quer ver que o filho está estranho, que ele não trabalha. Para ver isso, ela precisa da vizinha, a Tomasina.
O filme foi construído em cima dessa personagem, que é aprisionada em seu cotidiano. Procurei trabalhar todas as ações do filme dentro do campo do cotidiano. Nada de extraordinário acontece. A gente procurou também trabalhar alguns elementos da tragédia clássica e a Tomasina funciona como o coro grego, que expressava o ponto de vista do homem comum. A Tomasina vai apontando, mas a Selma, que está dentro desse mundo que ela criou, não quer ver. Uma das maneiras de contar que ela não quer ver foi com esse erotismo.

Folha - Isso não pode repelir o público?
Tata -
Engraçado. Nas sessões que tenho ido, em pré-estréia, não tem chocado. Aquela mãe é qualquer mãe, e as pessoas enxergam isso. Procurei trabalhar essa mãe como doadora incondicional e responsável pela integridade do filho, até as últimas consequências, e essa figura é conhecida de todos.

Você quis fazer um filme sobre o cotidiano de mãe e filho?
Tata -
Não. Eu queria continuar a pesquisa, que comecei com "Um Céu de Estrelas", sobre a estrutura trágica, porque adoro tragédia, a primeira manifestação dramática do mundo. A tragédia nasceu para expressar uma crise entre a tradição dos gregos e a vida contemporânea das cidades.
Por acaso, o Jean-Claude (Bernardet, autor do argumento e co-roteirista, ao lado da própria Tata Amaral e de Fernando Bonassi) foi assistir à peça "Vereda da Salvação" (dirigida por Antunes Filho), em que há uma cena em que o Luiz Mello está falando para o público, se transformando em líder, e a mãe sai detrás do palco e fica atrás dele. Essa cena inspirou todo o roteiro. A mãe é a Laura Cardoso. Esse filme foi inspirado por uma cena da Laura.

Folha - É quase um filme-solo para Laura Cardoso?
Tata -
É, é um filme para ela.


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