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Shere Hite discute prazer e poder no trabalho
CYNARA MENEZES
DA REPORTAGEM LOCAL
Na primeira vez que a escritora
norte-americana Shere Hite, 57,
esteve no Brasil, em 1977, ficou
"aterrorizada": o governo militar
mandou a polícia invadir a sessão
de autógrafos, no Rio, e recolher
todos os exemplares do livro que
ela estava lançando, o "Relatório
Hite", que apresentava sua célebre pesquisa sobre a sexualidade
feminina.
Na última terça-feira, praticamente ao mesmo tempo em que
Hite desembarcava em São Paulo,
o presidente Fernando Henrique
Cardoso sancionava a lei que
transforma o assédio sexual em
crime. Para quem veio lançar, hoje às 16h, na Bienal do Rio, "Sexo e
Negócios", obra que trata das relações pessoais no trabalho -inclusive o assédio-, foi um sinal
de que os ventos sopram bem
mais a favor por aqui agora.
"Fiquei surpresa que isso tenha
acontecido tão rápido", disse Shere Hite. "Acho que o Brasil está
muito mais moderno." A escritora afirmou não saber se leis desse
tipo funcionam, mas apóia a iniciativa. "É melhor ter uma lei do
que não ter", resume.
No livro, Hite analisa o assédio
como algo que envolve mais poder do que sexo. "É uma pessoa
com poder que quer humilhar outra. Quando se tenta beijar alguém e ela não quer, você sente isso e não continua. Não diz: "Sei
que você quer", fazendo sentir-se
grande e o outro pequeno."
É, também, uma prática exclusiva do sexo masculino, ao contrário do que mostrou Demi Moore
atacando Michael Douglas em
"Assédio Sexual". "Isso só acontece no cinema. É como o estupro.
Alguns dizem que o homem também é estuprado, mas estatisticamente não é verdade." Hite tem
uma explicação polêmica para isso: "O homem pensa que sexo é
poder e, para a mulher, sexo é
prazer".
Quando "Sexo e Negócios" foi
lançado na Europa, no ano passado, chegou-se a dizer no Brasil
que Hite pregava o namoro entre
colegas de trabalho, mas ela diz
ter sido mal interpretada. "Do que
o livro realmente trata é de por
que as mulheres só ganham 60%
do que recebem homens na mesma posição", afirma.
"Agora, um dos problemas que
essas mulheres encontram é: o
que fazer se alguém no trabalho
tenta fazer sexo com você ou você
se sente atraída por alguém? Hoje
muitas mulheres que trabalham
são solteiras, e muitos dos homens também. Então não há razão para que essas pessoas não
possam ficar juntas."
Um tema curioso do livro diz
respeito a uma velha maledicência: mulheres não gostam de trabalhar subordinadas a mulheres.
O pior de tudo é que Hite descobriu que isso é verdade. Em um
dos capítulos, intitulado "Como
as Mulheres Estão Trabalhando
com Outras Mulheres?", a escritora expõe queixas de chefes falando de secretárias e vice-versa.
Uma secretária reclama que a
chefe "é um vampiro infernal"
que "tem inveja" dela por ser mais
jovem, e uma chefe se queixa de
ser tratada como "amiguinha"
quando é mais compreensiva,
tendo que ouvir desculpas do tipo
"estou menstruada" ou "briguei
com o namorado" diante de eventuais falhas.
"Muitas mulheres dizem que
trabalhar para mulheres não as fazem felizes", confirma Hite. "As
primeiras mulheres que conseguiram poder no trabalho se masculinizaram para não serem criticadas e passaram a ser criticadas
por serem muito duronas. Mas isso está mudando. Algumas mulheres executivas que conheço são
realmente legais."
E quanto aos homens? Surpresa: "Não ouvi nenhuma reclamação", ri a escritora. "É realmente
divertido, porque o clichê diz que
homens odeiam trabalhar para
mulheres, e não é assim."
SEXO E NEGÓCIOS. De: Shere Hite.
Tradução: Cyana Leahy. Editora:
Bertrand Brasil (tel. 0/xx/21/263-2082).
260 págs. R$ 35.
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