São Paulo, Quarta-feira, 19 de Maio de 1999
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LITERATURA
Livro recupera poemas que uma das maiores escritoras americanas do século fez no país; Ouro Preto discute a partir de hoje obra da poeta
Bishop comeu caju e não deixou mais o Brasil

CASSIANO ELEK MACHADO
da Reportagem Local

Existem muito poucos indícios de que a poeta norte-americana Elizabeth Bishop (1911-1979) tenha passado pelo Paraíso, mas, assim como Eva, foi comendo um fruto proibido que ela mudou para sempre sua trajetória.
A guloseima em questão, nem tão proibida assim, era um caju. O local, uma rua de Petrópolis (RJ), ano de 1951. A escritora fazia uma escala no Brasil durante uma viagem de circunavegação pela América. No Rio de Janeiro, encontrou uma amiga de uma amiga que ofereceu à poeta abrigo durante os dias em que o navio de nome Bowplate ficasse ancorado no país.
Foi então que Bishop cruzou com a serpente, ou melhor, com um vendedor de cajus e resolveu experimentar o fruto. Sintoma: uma reação alérgica tão forte que por alguns dias mal pôde abrir os olhos. Resultado: quando conseguiu enxergar, já estava apaixonada pela sua anfitriã, a arquiteta carioca Maria Carlota Macedo Soares, a Lota, que declarara o mesmo enquanto ajudava a tratar do rosto inchado da poeta, com quem viveu por quase 15 anos.
Bishop passou, com poucos intervalos, 20 anos no Brasil. E foi aqui que construiu (em inglês) uma parte substancial de seus cerca de cem poemas, que a credenciam como uma das maiores poetas da língua inglesa deste século, vencedora dos dois grandes prêmios literários dos EUA: o Pulitzer e o National Book Award.
Esta semana a obra da poeta de Massachusetts volta a frutificar no Brasil. Começa hoje encontro internacional em Ouro Preto (MG) para discutir a obra de Bishop (leia texto ao lado), ao mesmo tempo que chega às livrarias o volume "Poemas do Brasil", com 16 poemas selecionados e traduzidos por Paulo Henriques Britto.
A edição bilíngue, publicada pela Companhia das Letras, reúne, nas palavras de Brito, "textos poéticos que registram o impacto do Brasil sobre a autora". Algumas vezes, as referências são oblíquas. É o caso do poema inédito em português "The Shampoo" (leia ao lado), em que a alusão ao Brasil, observa Britto, está na referência a uma bacia de lata amassada.
Nesse "O Banho de Xampu", o tradutor e poeta também encontra reflexos de algumas das características centrais da escritora. Há nele o "tom menor" característico de Bishop, que já teve sua obra definida como sendo "spectacular in being unspectacular" (espetacular em ser não-espetacular).
Segundo Britto, essa poética sem fogos de artifício vive hoje uma explosão. "Ela é uma das autoras que mais cresce na Bolsa de Valores literária", brinca, citando a valorização atual que se dá às minorias. Bishop era mulher e homossexual. E, ao comer um caju, a poeta, que morreu em Boston (EUA), passou a ser um pouco brasileira.

Livro: Poemas do Brasil
Autora: Elizabeth Bishop
Lançamento: Companhia das Letras
Quanto: R$ 23 (192 págs.)



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