São Paulo, quinta, 19 de junho de 1997.



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GRRRRRRRRR!

Em entrevista à Folha, Steven Spielberg diz que "gosta de economizar", reclama dos atores que trocam produções para ganhar mais e encara "O Mundo Perdido", filme que estréia hoje no Brasil, como "brincadeira séria"

JOÃO CARLOS ASSUMPÇÃO
de Nova York

Mais do que qualquer coisa, Steven Spielberg, 50, considera a filmagem de "O Mundo Perdido" -a sequência de "Parque dos Dinossauros" que estréia hoje nos cinemas brasileiros- uma "pausa" em seu trabalho.
"Quando acabei 'A Lista de Schindler' coloquei na cabeça que meu projeto seguinte seria diferente, mais leve, para dar um break", afirmou à Folha, numa das entrevistas coletivas que marcou o lançamento de "O Mundo Perdido" nos EUA.
Após "A Lista de Schindler", que lhe deu o esperado Oscar de diretor, dirigir um novo filme sobre dinossauros representou uma "brincadeira séria", como diz.
"Só aceitei dar sequência aos dinossauros porque senti que não era uma continuação forçada. Tinha fundamento, história."
A direção não é mais sua única preocupação. Desde que fundou a produtora DreamWorks, os custos de cada projeto viraram uma obsessão para o cineasta.
"Aprendi a pensar do ponto de vista do produtor. Se eu tivesse pedido US$ 130 milhões para a Universal, teria conseguido, mas fico orgulhoso em saber que, com US$ 55 milhões a menos, o resultado foi o mesmo". Leia a seguir os principais trechos da entrevista.

Folha - Dificilmente uma sequência de um filme supera a primeira história. O que o levou a aceitar a continuação de "Parque dos Dinossauros"?
Steven Spielberg -
Tudo começou com o Michael Crichton. Ele me ligou, disse que escreveria uma sequência, uma história sobre a incursão humana numa ilha de dinossauros. Eu me interessei de cara. O assunto é genial, o homem mexendo na natureza com avidez. É algo que só pode dar problemas, como aconteceu no filme.
Folha - O senhor deu opiniões, participou do processo criativo de Crichton quando ele escrevia?
Spielberg -
Participei de uma forma diferente. Um livro é um livro, um filme é um filme. Enquanto Michael escrevia, eu pensava nas cenas. Era um trabalho simultâneo, porque muito do que está no livro não serve para as telas.
Folha - Por exemplo?
Spielberg -
Na metade do livro não há muita narrativa. Um filme de aventura tem de ter narrativa quase o tempo todo para que o espectador não perca o interesse.
Folha - O senhor está fazendo dois outros filmes. Pode falar um pouco sobre eles?
Spielberg -
Estou trabalhando firme há três meses em "Amistad", épico sobre uma rebelião de escravos num navio no século 19. Agora em junho começo "Saving Private Ryan", que se passa durante a Segunda Guerra Mundial.
Folha - Não é cansativo, três filmes quase ao mesmo tempo?
Spielberg -
É puxado, mas Tom Hanks participa do "Private Ryan" e também estava com a agenda atrapalhada, e decidimos começar agora. Não dá para conciliar tudo.
Folha - Os dois são projetos da sua produtora, a Dreamworks?
Spielberg -
O "Amistad", sim. O "Private Ryan" é em conjunto com a Paramount Pictures.
Meu intuito é que, de cada três filmes que eu fizer, pelo menos um será com a Dreamworks.
Folha - O cinema virou uma indústria poderosíssima. Isto é bom?
Spielberg -
Não é tão bom do ponto de vista artístico. Uma coisa que me irrita, e falo como produtor, é um ator trocar um filme para receber um pouco mais.
O aspecto financeiro é importante, mas não quando começa a dominar tudo. Quando eu faço um filme, procuro economizar. Os orçamentos de hoje estão um absurdo. Estão transformando o cinema numa Índia, um país com alguns milionários, muita gente pobre e nenhuma classe média.
Folha - Por quê?
Spielberg -
A competição enlouqueceu todo mundo. Você quer uma superprodução? Logo se fala em US$ 100 milhões, US$ 150 milhões, US$ 200 milhões. E isto sem a parte do marketing. Eles acabam não te negando a verba, porque sabem que há chances de o filme fazer US$ 500 milhões, US$ 600 milhões. Hoje em dia sobraram duas opções: a superprodução ou filmes de US$ 10 milhões. Na faixa dos US$ 50 milhões não se vê quase nada.
Folha - O senhor já pensou em parar de trabalhar?
Spielberg -
Tenho muitos projetos para tocar, coisas que eu nunca experimentei. Tenho vontade de realizar um musical e uma comédia. A aposentadoria fica para depois.




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