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MÚSICA
Irregular, obra reúne textos de 47 autores, entre eles José Saramago, Antonio Candido, Frei Betto e Leonardo Boff
60 anos de Chico ganha livro-homenagem
LUIZ FERNANDO VIANNA
DA SUCURSAL DO RIO
O livro-homenagem
"Chico Buarque do Brasil"
reúne, em suas 432 páginas, textos
de 47 autores. Entre eles, estão
Antonio Candido, José Saramago
(com um artigo publicado pela
Folha em setembro de 2003), Frei
Betto, Leonardo Boff, Moacyr
Scliar, Luiz Tatit e Mário Chamie.
Diante de tantos textos, é apenas uma constatação matemática
dizer que o livro resulta irregular.
Só que, antes de ser acidental, a irregularidade é conceitual. O organizador, o escritor e crítico Rinaldo de Fernandes, juntou no livro
depoimentos de amigos-fãs, artigos de jornalistas e escritores,
quatro poemas baseados em "A
Banda" e, predominantemente,
ensaios acadêmicos.
A soma de tudo não chega a ser
uma rica colagem. Os depoimentos, por exemplo, escapam pouco
da exaltação óbvia. Alguns são rapidíssimas apologias (casos de
Gerald Thomas e do cubano Silvio Rodríguez), enquanto um
maior como o do MPB-4 Aquiles
Rique Reis escorrega na tentação
de fazer jogos de palavras com as
letras de Chico.
No bloco "Jornalistas e Escritores", destacam-se os artigos de
Carlos Ribeiro e José Castello, que
dissecam os romances de Chico
com extrema clareza. Ambos têm
o mérito de, ao contrário de parte
dos ensaístas, observar o escritor
sem recorrer ao compositor. "(...)
Nos extremos dos que louvam e
dos que atacam o ficcionista Chico Buarque parece estar sempre a
impossibilidade de desvinculá-lo
do homem e da sua persona", assinala Ribeiro.
É pena que o texto de Leonardo
Boff, bem escrito como de hábito,
se baseie quase todo em "Gente
Humilde". Como já é sabido, a
música tem apenas um verso de
Chico, sendo de Vinicius de Moraes todo o resto da letra.
Erros de informação ou de compreensão do trabalho do artista
também aparecem nos ensaios.
Um exemplo do primeiro caso é o
crédito a Francis Hime como co-autor de "O que Será" (a música é
só de Chico), no texto de João Batista de Brito.
No segundo está a tentativa de
Luciana Eleonora de Freitas Calado de dar uma dimensão literária
às canções que as afaste de sua
origem musical.
Ao ser pioneiro na inclusão de
letras nos encartes, ele teria "a intenção de que suas composições
fossem vistas como literatura
cantada" (grifo da autora). Chico
já disse considerar "obsceno" publicar letras de música em jornais,
pois elas não existiriam sem as
melodias.
Quem ressalta essa simbiose é
Cecilia Almeida Salles, no melhor
de todos os ensaios. Melhor porque analisa a literatura de Chico
sem fazer concessões à superficialidade, mas também sem lançar
mão de uma selva de conceitos e
referências que torne -como na
maioria dos ensaios- a obra de
um artista popular um intrincado
jogo de charadas. Vale ainda citar
a abordagem original que faz Pedro Meira Monteiro da relação
entre Sérgio Buarque de Hollanda
e seu filho.
Duplos
Chico, que é obcecado pelo tema dos duplos (vide a superposição de mãe e filha em "Benjamim" e o José Costa/Zsoze Kósta
de "Budapeste"), deve se sentir
um outro Chico ao ler as dissecações de seu método de compor.
São tantas alusões à Grécia, diagramas poéticos e coisas "buarquianas" que, em vez de um encontro entre público e compositor através de novos olhares, prevalece a sensação de que os ensaios são exercícios restritos ao
ambiente acadêmico.
Melhor faz mestre Antonio
Candido, que diz muito em apenas uma página. "[A integridade
de Chico] lhe permite ser tão expressivo quanto significativo para
o nosso tempo, sem máscara de
qualquer espécie. Louvemos Chico Buarque", resume.
CHICO BUARQUE DO BRASIL. Autores:
vários. Editora: Garamond/Fundação
Biblioteca Nacional. Quanto: R$ 54,50
(432 págs.).
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