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MÚSICA
Regente norte-americano e orquestra alemã preparam CDs com obra integral do compositor brasileiro
Maestro grava sinfonias de Villa-Lobos
IRINEU FRANCO PERPETUO
especial para a Folha
Um regente norte-americano e
uma orquestra alemã estão tocando o mais importante projeto fonográfico de música brasileira
deste ano: a primeira gravação integral das sinfonias de Villa-Lobos, cujo 40º aniversário de morte
é celebrado em 1999.
Diretor musical da orquestra
californiana Pacific Symphony,
Carl St. Clair começou o trabalho
pelas sinfonias de números 6 e 8,
em fevereiro, na cidade alemã de
Sindlefingen, com a Südwest
Rundfunk Orchester (Orquestra
da Rádio do Sudoeste da Alemanha, sediada em Stuttgart).
De lá para cá, a orquestra já registrou todas as sinfonias de Villa-Lobos -com exceção da maior
do ciclo, a décima ("Sumé Pater
Patrium"), agendada para dezembro, e da quinta ("A Paz"),
cuja partitura se perdeu.
Peças menores, como a "Sinfonieta nº 1", devem completar a coleção, cujo lançamento e número
de CDs ainda não foram decididos pelo selo alemão CPO (distribuído no Brasil pela RKR Discos).
É difícil exagerar a relevância do
projeto de St. Clair. Parte menos
conhecida e executada da enorme
produção musical do compositor,
as sinfonias também estão escassamente representadas em disco.
Existe apenas uma gravação comercial da sexta (feita pelo maestro Roberto Duarte para a Marco
Polo) e duas da quarta ("A Vitória"), realizadas pelo próprio Villa-Lobos (EMI) e pela Orquestra
Simón Bolívar, da Venezuela.
Adicionalmente, a maestrina
Gisele Ben-Dor está registrando a
"Sinfonia nº 10" com a Santa Barbara Symphony.
Como de hábito nas obras do
compositor brasileiro, além da dificuldade técnica da música, os
maiores problemas de interpretação resultam da qualidade precária do material impresso.
"Não é incomum achar de 200 a
500 erros em uma só sinfonia",
diz St. Clair, em entrevista concedida por e-mail. "Além de corrigir
os erros, tive de acrescentar algumas marcações (crescendos, diminuendos, dinâmica, tempo
etc.) que estavam faltando."
Quanto ao manuscrito da "Sinfonia nº 5", o regente texano afirma que Marcelo Rodolfo, do Museu Villa-Lobos, do Rio de Janeiro, "esteve atrás dela durante pelo
menos 20 anos".
"O maestro Eleazar de Carvalho
iria regê-la no Carneggie Hall, em
1950, mas teve de cancelar, pois
jamais recebeu a partitura", afirma. "Há uma suspeita de que ela
pode estar com alguém ligado à
primeira mulher de Villa-Lobos."
Villa-Lobos escreveu sinfonias
em três períodos de sua carreira.
As cinco primeiras datam de 1916
a 1920. Todas elas têm títulos
-"O Improviso" (nº 1), "Ascensão" (nº 2), "A Guerra" (nº 3), "A
Vitória" (nº 4) e "A Paz" (nº 5)-
sendo que as três últimas são alusivas à Primeira Guerra Mundial.
Nos anos 40, vieram mais duas:
a nº 6 ("Montanhas do Brasil") e a
nº 7 ("Odyssée dune Race", ou seja, "Odisséia de uma Raça", título
também dado a um poema sinfônico escrito em 1953).
"Montanhas do Brasil" emprega o curioso processo de "milimetrização": fotografias do Corcovado e do Pão de Açúcar foram
transferidas para o pentagrama,
originando os contornos melódicos utilizados na obra.
Já as sinfonias dos anos 50 atenderam, majoritariamente, a encomendas de sinfônicas norte-americanas: a oitava e a nona foram
estreadas pela Orquestra da Filadélfia, a de nº 11 foi escrita para o
75º aniversário da Sinfônica de
Boston e a última, de nº 12, teve
sua primeira apresentação em
Washington.
Uma exceção nesse grupo é a
Sinfonia nº 10, composta para o
quarto centenário da cidade de
São Paulo (1954) e baseada no
poema "Beata Vergine", de José
de Anchieta.
Especialistas na obra de Villa-Lobos tendem a menosprezar
suas sinfonias, considerando que
o autor tratou a grande orquestra
de maneira mais feliz em seus
poemas sinfônicos, choros e bachianas.
O finlandês Eero Tarasti (no livro "Heitor Villa-Lobos - The Life
and Works, 1887-1959") chega a
afirmar que "é realmente surpreendente que Villa-Lobos tenha escrito tantas sinfonias ao
longo de sua carreira, levando em
conta que esse gênero musical
combinava muito mal com sua
maneira de compor".
Porém, como o próprio Tarasti
admite, as análises do ciclo sinfônico de Villa-Lobos são prejudicadas pela carência de partituras e
material auditivo. Não é impossível que, após o lançamento da coleção da CPO, os juízos de valor
sobre as sinfonias de nosso maior
compositor tenham de ser reavaliados.
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