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CRÍTICA
Beijo gay esconde truques por audiência
BIA ABRAMO
COLUNISTA DA FOLHA
Agora é moda. Novela que é
novela tem que ter beijo lésbico. O casal da vez está em "Senhora do Destino". As moças são
Eleonora (Mylla Christie) e Jenifer (Barbara Borges), que acabaram de iniciar um romance. Menos glamourosas que o casal de
"Torre de Babel", formado por
Silvia Pfeiffer e Christiane Torloni, mais maduras que as meninas
vividas por Aline Morais e Paula
Picarelli, de "Mulheres Apaixonadas", Eleonora e Jenifer vão viver um drama ao tentarem adotar uma criança.
Com essa abundância de casos
de lesbianismo televisivo, daria
até para pensar que a sociedade
brasileira está se tornando mais
tolerante em relação ao homossexualismo, que isso é um avanço em direção a um ambiente de
respeito à diversidade sexual,
que a hipocrisia em relação à sexualidade em geral diminuiu...
Será mesmo?
Nem tanto. A formulação de algumas hipóteses para explicar
esse súbito ataque de tolerância
se impõe. Ainda que entre a primeira novela a fazer alusões veladas ao tema, "O Rebu" (1974), e o
beijo de Eleonora e Jenifer alguns
passos em direção à discussão
menos preconceituosa tenham
sido dados, a recorrência mais
recente do tema deve procurar
outras explicações.
Em primeiro lugar, não é à toa
que a maioria dos casais homossexuais que aparecem são formados por mulheres. O olhar machista classifica a homossexualidade feminina como: a) menos
"séria" e b) mais palatável. A
brincadeira erótica entre mulheres é excitante e faz parte do repertório pornográfico. É como se
as moças, entediadas à espera do
falo, se entretivessem uma com a
outra. É como se a negociação
com o moralismo do público
passasse por uma barganha do tipo: bem, já que vai ter que falar
de homossexualidade -porque
o assunto ganhou uma visibilidade no noticiário e na vida social
muito maior do que à época de
"Torre de Babel"- que seja a feminina, pelo menos.
Com homem no meio, só Silvio
de Abreu teve coragem. Em "A
Próxima Vítima", Abreu construiu uma boa história de amor
gay e inter-racial entre os jovens
Sandrinho (André Gonçalves) e
Jeferson (Lui Mendes). Mais recentemente, ele se saiu com uma
provocação ainda maior, ao juntar a transexual Ramona (Cláudia Raia) e Leonardo (Alexandre
Borges), que tiveram direito a final feliz em "As Filhas da Mãe".
Em segundo lugar, porque há
uma espécie de nova licenciosidade nas novelas. Ousar -simplesmente por ousar, para botar
o limite do aceitável a alguns centímetros adiante- tornou-se
moeda de troca na busca por audiência. Quer se trate de violência -como em "Celebridade" ou
"Da Cor do Pecado"- quer se
trate de questões polêmicas -a
próxima novela das oito já levanta a lebre da crueldade contra
animais, ao retratar o mundo dos
rodeios-, a ordem é ter um arsenal preparado para produzir
índices noticiáveis de audiência.
biabramo.tv@uol.com.br
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