|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros
CRÍTICA DVD
"Leon Morin" é bela jornada em tempos de mudança da igreja
Com Jean-Paul Belmondo fazendo padre, filme de 1961 antevê momento em que catolicismo buscou se rever
INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA
Eis aí um filme inesperado.
Pois não é o diretor francês
Jean-Pierre Melville um mestre do policial? E não é Jean-Paul Belmondo o galã sensual por excelência?
Em "Leon Morin, o Padre"
isso parece se inverter. Em
1961, no auge do seu charme,
Belmondo é que faz o padre.
Não deixa de ser homem
atraente. Impossível que não
se dêem conta as garotas da
paróquia, como Barny (Emmanuelle Riva).
Ateia convicta, decide
abrir as hostilidades. Vai ao
confessionário e diz algo como: "Religião é o ópio do povo". Por sorte (ou azar) quem
está lá é Morin.
É este o início da bela jornada espiritual (e cinematográfica). "Leon Morin" se dá
no cruzamento de duas crises espirituais, durante a Segunda Guerra. Mais precisamente: na França ocupada.
Um império de iniquidade.
Ali a jovem Barny procura
auxílio espiritual (não à velha maneira, mas com uma
palavra, uma conversa, livros), sem nem mesmo saber
o que procura.
Mas o tempo em que é feito
o filme também tem algo a
nos dizer: 1961, vésperas do
Concílio Vaticano 2º, quando
o catolicismo decide se rever
de alto a baixo a fim de se pôr
de acordo com o diapasão do
mundo em transformação.
Datam daí certas mudanças formais com significado
amplo, como o fim das missas em latim e o hábito de o
padre rezar a missa de frente
para os fiéis, não de costas.
Digamos que Morin é uma
espécie de precursor dessas
práticas. Antes, não importava que a missa fosse feita em
língua que ninguém falava: o
respeito que infundia é que
contava. A partir do Vaticano
2º tornou-se desejável que o
fiel a compreendesse.
Afinal, desde o pós-guerra, cada vez menos gente parecia disposta a temer o Diabo e o inferno. O medo, velho
aliado da catolicidade, não
mais dominava as mentes.
CATOLICISMO
É esse o universo: o mundo em transformação, onde a
vida presente torna-se muito
preciosa (na guerra) para ser
sacrificada pelo futuro incerto (a vida eterna).
A religião, na visão do padre, deve pensar menos na
eternidade; menos em Deus,
mais no homem.
Bem verdade que ele é procurado pelas garotas. Mas é
guerra: os homens escasseiam. As garotas se apaixonam por ele, não há surpresa
nisso. Como ele responderá?
O filme responderá.
Igualmente relevante: assim como distribui livros
gentilmente, assim como escuta, conversa, discute e
constrói sua fé sobre as relações humanas, Morin não
deixa de se preocupar com os
destinos da Resistência.
O que move o catolicismo
de "Leon Morin, o Padre" é a
hipótese de responder à acusação de que a igreja "é o
ópio do povo". Uma resposta
urgente em 1961, que pouco
preocupa o clero hoje. Que
importa? O filme é belíssimo.
LEON MORIN, O PADRE
LANÇAMENTO Lume Filmes
QUANTO R$ 44, em média
CLASSIFICAÇÃO 14 anos
AVALIAÇÃO ótimo
Texto Anterior: Opinião: Com o tempo, dançarina virou figura melancólica e deprimente Próximo Texto: Coleção Folha aborda equipamentos para vinho Índice | Comunicar Erros
|