São Paulo, sexta-feira, 19 de outubro de 2007

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Música - Crítica/"In Rainbows"

Novo Radiohead destroça classificações de gênero

Sétimo álbum da banda é continuação lógica de disco solo do líder Thom Yorke

ÁLVARO PEREIRA JÚNIOR
COLUNISTA DA FOLHA

"In Rainbows", o novo álbum da banda inglesa Radiohead, é uma espécie de plasma sonoro, coeso, orgânico, em que as transições de uma faixa para outra são quase imperceptíveis, como se tudo formasse uma única e esparsa sinfonia. Mais do que parente próximo de "Kid A" e "Amnesiac", os CD "difíceis" do Radiohead, "In Rainbows" é uma continuação lógica de "The Eraser" (06), o disco-solo de Thom Yorke, líder da banda.
Com poucas exceções -como no caos de guitarras que abre e encerra a canção "Bodysnatchers"-, "In Rainbows", assim como "The Eraser", soa como um bric-à-brac digital, canções que vão ganhando forma a partir de elementos mínimos, fragmentos de idéias que o produtor Nigel Godrich recolhe e ordena com coerência.
Pelo que se sabe do processo de composição da banda, Yorke é a usina de criação, enquanto o guitarrista Jonny Greenwood, que tem formação clássica, cuida das harmonias.
A fusão Yorke/Greenwood já foi explosiva, como no apocalipse de cores e texturas de "OK Computer" (1999), o álbum fundamental do Radiohead e um dos mais importantes da história do rock (ou seria da música? Ou, ainda, da arquitetura?). Mas hoje os arranjos vão ficando cada vez mais rarefeitos, e aumenta a distância entre as camadas que formam as canções do Radiohead.
Na autodepreciativa "All I Need", uma das mais belas faixas do álbum, Yorke canta "Você é tudo que eu preciso/ você é tudo que eu preciso". Parece estar falando da própria música, dos poucos recursos de que lança mão para construir suas canções resplandecentes. Percussão e guitarra jazzísticas pontuam a faixa "15 Step", o que reforça o fato de o Radiohead há muito ter destroçado qualquer classificação musical.
Jazz, música clássica, rock e eletrônica se unem para chegar a um todo que é maior do que a soma das partes: algo único, a música do Radiohead.
Em "Reckoner", Yorke canta no limite de seu registro vocal. Fala das dificuldades da criação poética em "Nude". E, com nada mais que um piano repetitivo e uma curta frase de percussão, constrói uma das melhores canções de toda a história do Radiohead, "Videotape" ("Você é meu centro quando eu escapo da órbita", diz a letra).
Seguir as novidades do pop requer cada vez mais tempo e menos espírito crítico. Novos nomes surgem empurrados por tsunamis de hype, para se dissipar sem deixar vestígios ao primeiro sinal de mudança na maré. Nesse contexto, não faz sentido falar em permanência. Quem vai se interessar pelo quarto álbum dos Klaxons? Pelo terceiro dos Cribs? Pela música que o New Young Pony Club vai estar fazendo daqui a cinco anos? Ninguém, e parece que a vida agora é assim.
Mas este já é o sétimo álbum do Radiohead, essa anomalia que insiste em fazer música relevante. No universo digital, conhecer e descartar informação acontece na velocidade de um impulso elétrico. Pois o Radiohead se apropria desses mesmos meios para fazer o contrário -criar e distribuir informação (no caso, música) que realmente importa.
Por enquanto, "In Rainbows", o primeiro trabalho da banda desde 2003, está disponível só na internet, em www.inrainbows.com. Sem gravadora, sem intermediários. O ouvinte determina o preço. Seja quanto for, será pouco.


IN RAINBOWS
Artista:
Radiohead
Quanto: você escolhe quanto paga
Onde: www.inrainbows.com
Avaliação: ótimo


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