São Paulo, terça-feira, 19 de novembro de 2002

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TELEVISÃO

Em 50 dias, foram cinco medidas, entre elas uma contra a MTV, que exibia imagens subliminares pornográficas

Liminares tentam impor limites às redes

DANIEL CASTRO
COLUNISTA DA FOLHA

Está no ar uma nova cruzada contra os excessos da televisão. Os atores dessa movimentação são procuradores e promotores de Justiça, juízes, políticos e ONGs (organizações não-governamentais) que se ocupam não só de defender crianças de conteúdos violentos e eróticos, mas até de descobrir mensagens subliminares por trás das imagens da TV.
Nos últimos 50 dias, juízes de São Paulo e de Minas Gerais concederam cinco liminares que impõem limites à programação das TVs. Medidas como essas não chegam a ser novidade, mas não há registros anteriores de tantas em tão pouco tempo como agora.
A ofensiva da Justiça ganhou reforço do Legislativo na quarta-feira passada, quando a Câmara dos Deputados lançou a campanha "Quem Financia a Baixaria é Contra a Cidadania". Primeiro, deputados irão tentar negociar com as emissoras. Se não der certo, vão pressionar os anunciantes. Se ainda não funcionar, os parlamentares irão denunciar, em um site, as empresas que anunciam em programas de baixo nível.
Por força dessas cinco liminares, ainda que temporariamente (porque são decisões provisórias), todas as TVs estão proibidas de exibir filmes violentos, tensos ou com alguma conotação erótica antes das 20h. No caso da Rede TV!, o veto atinge um programa jornalístico, embora popular, mas transmitido a partir das 16h: o "Repórter Cidadão" não pode mostrar sequer armas e perseguições policiais, sua principal matéria-prima.
Dessas cinco liminares, a de causa mais original foi assinada há duas semanas pelo juiz Paulo Alcides Amaral Salles, da 12ª Vara Cível de São Paulo, a pedido de três promotores paulistas. Salles determinou que a MTV suspendesse a exibição de uma vinheta (que já não estava mais no ar) em que apareciam imagens subliminares pornográficas, algumas não tão subliminares assim, a maioria de mulheres em relações sexuais sadomasoquistas.
Criada oficialmente em julho, a Organização Não-Governamental de Estudos e Pesquisas em Mensagem Subliminar, única do gênero no país, reivindica o crédito de ter feito a descoberta na vinheta da MTV. Defende que a publicação da informação em seu site, em agosto, chamou a atenção de outras pessoas, que denunciaram ao Ministério de São Paulo, gerando, em setembro, a ação que resultou na liminar.
A vinheta da MTV ficou no ar, em todos os horários, de março até setembro deste ano, quando a emissora afirma ter tido conhecimento das imagens subliminares, via denúncia de telespectadores.
Com 45 segundos, a vinheta mostrava a figura em três dimensões de um homem meditando, girando. Essa figura era sobreposta por outras imagens, que apareciam muito rapidamente na tela. Ao fundo, uma trilha de música eletrônica com sons de tambores.
Entre essas imagens sobrepostas, a ONG Mensagem Subliminar identificou -e o Instituto de Criminalística da Polícia Civil de São Paulo confirmou- exatamente 180 de conteúdo pornográfico.
O truque funcionava assim: como cada um segundo de imagem de TV tem 30 "frames" (ou quadros), dispersamente eram inseridas figuras pornográficas que duravam apenas um quadro, a fração de tempo equivalente a um segundo dividido por 30.
O ser humano não consegue captar conscientemente imagens nessa velocidade. Ele não vê, mas seu cérebro capta e armazena a informação. Isso é um exemplo clássico de imagem subliminar, que, apesar de parecer exótico, já mereceu estudos científicos no mundo todo. E algumas pesquisas comprovaram que se trata de um eficiente método de propaganda. A imagem ou áudio que o olho não vê mas o cérebro arquiva influenciaria as pessoas, induzindo-as a determinados comportamentos ou decisões de consumo.
Muito comum na publicidade comercial a partir dos anos 70, a mensagem subliminar não seria ilegal, mas antiética, entendem especialistas no assunto.
Excluindo-se peças publicitárias de caráter comercial, a vinheta da MTV é o caso mais contundente de mensagem subliminar na TV brasileira. Até então, eram apontadas apenas situações discutíveis, como merchandising comercial e social em novelas da Globo, além de filmes e desenhos animados importados.

Acordo
A ação contra a vinheta da MTV terá efeito a curto prazo. Nesta semana, a emissora deve concluir um acordo com o Ministério Público para que a ação judicial não avance. Diante da possibilidade de ser condenada a pagar multa de R$ 7,4 milhões (valor pedido pelos promotores, que seria o público da MTV em todo o país multiplicado por R$ 1), a TV irá afastar esse risco se comprometendo a exibir vinhetas educativas.
"Em momento algum a MTV sabia da existência dessas imagens", diz Edgard Ribeiro, porta-voz da emissora, que atribui o incidente a uma profissional que prestava serviços eventualmente à emissora, a quem foi encomendada a vinheta.


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