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FERNANDO GABEIRA
Senhor Poleto, leve-me ao seu líder
Como todo mundo, de vez em
quando deixo de lado a cena
política para cuidar de algo que
considero mais urgente e importante. Quando volto, a perplexidade me envolve de novo. Isso explica, talvez, por que tenha deixado no arquivo a foto de um campo
de pouso de disco voador, construído num hotel próximo a Manaus. Como xangô para Vinicius
de Moraes, essa imagem me ajuda
a chegar.
Não contesto a existência física
do sr. Vladimir Poleto. Mas aquele depoimento da cachacinha
questiona o Congresso, nossa existência, até o nosso passado. Não
sei se porque estava recém-aterrissado, mas o depoimento de Poleto
nos coloca numa situação do tipo
ou ele ou eu.
Se ele produziu a história da cachacinha para explicar os dólares
na caixa de bebida com tantos detalhes foi porque acreditava em
nossa estupidez. Se ele, ao falar da
cachacinha, mostrava os dois dedos, gesto típico dos apreciadores,
o fazia apenas para fortalecer sua
história. Como esses mágicos de
festas infantis que levam com eles
a dose certa de gelo seco para envolver seus truques.
Quem é esse homem? Quem são
seus amigos? O que fazem? De que
planeta vieram para abocanhar
uma parte dos negócios públicos,
dominados parcialmente por estranhos montanheses como o calvo Marcos Valério?
Francamente, sr. Poleto, leve-me ao seu líder. Creio tê-lo visto
na televisão. Estava curioso para
ver como explica toda essa aventura interplanetária. A luz, o som
e o cenário da entrevista do líder
Lula eram uma catástrofe. Lembro, quando adolescente, de um
anúncio de roupa masculina na
revista "Esquire". Era uma foto do
Krushev, com o texto: seu alfaiate
deveria ser mandado para a Sibéria.
Os cinegrafistas do líder deveriam ser mandados para o correspondente da Sibéria neste paraíso
vermelho temporão. Eles criam
uma atmosfera onde a mentira é
quase uma ofensa: Roberto Jefferson foi cassado porque não provou o "mensalão".
Por que mentem tanto e tão deslavadamente? Tenho um palpite.
Acham que é preciso abandonar o
front da legitimidade e lutar apenas por posições. Essa troca de
fronts explica todas as coisas estranhas que acontecem com eles,
embora o sr. Poleto seja um caso
raro, podendo ter vindo até de um
terceiro planeta que não tinha entrado na história.
O movimento de impedir que a
CPI prossiga foi típico dessa nova
fase. O que importa o desgaste? O
essencial é colocar os pés naquela
sala, congelar os trabalhos. O desgaste pode ser recuperado adiante, pois quando se tem a posição,
tudo se resolve. Com agrados e dinheiro. Há sempre jornalistas loucos para falar bem do governo; há
sempre deputados dispostos a tudo por uma verba orçamentária.
Ao optar pelo caminho da mentira, o líder do sr. Poleto, caso sejam do mesmo planeta, apenas
trilha um caminho conhecido de
outros. Bush e Berlusconi, por
exemplo. A diferença é que esses
outros dois estão preparados para
perder o contato imediato com a
classe média.
Esses Poletos não estão. Vivem
na classe média e inclusive seu líder, apesar dessa história de ligar-se diretamente ao povo, está bem
consciente dos seus valores. No filme "Entreatos", uma de suas decepções com os franceses foi a de
não o terem reconhecido como
homem da classe média.
Mas e o Chávez? Não poderiam
pertencer à mesma constelação?
Chávez nada em excedentes de
petróleo, apesar da estagnação industrial e do aumento da pobreza
na Venezuela. Além disso, tem
um antiamericanismo com ampla capacidade de sedução e um
nível irrisório de eficácia.
Há várias razões para que esse
planeta Poleto tenda ao colapso.
Uma delas é que os farsantes, ao
contrário do que dizem, não têm
outra identidade disponível. Poleto sumiu de casa, Lula evita encontros espontâneos.
Suponhamos que suportem o
tranco psicológico, uma cachacinha aqui, elogios dos puxa-sacos
ali, enfim, que consigam tocar seu
barco. Não percebem que historicamente navegam contra um tsunami.
O direito à verdade passou a ser
um tema político importante. Aznar dançou na Espanha porque
tentou manipular os eleitores, no
calor do atentado. Bush lançou
parte do mundo na Guerra do
Iraque baseado na mentira de
que havia armas de destruição
em massa. A versão da polícia inglesa para o assassinato do brasileiro Jean Charles Menezes não
durou uma semana.
Mesmo se você observar bem as
entrevistas dos meninos que estão
botando fogo nos subúrbios franceses, sempre se referem ao discurso político com a expressão
"blablablá".
O mais recente guru do líder
disse que a tarefa de um presidente é sobreviver no cargo. Fecharam-se todos os horizontes, caíram todas as máscaras. Os líderes
do Poleto cravaram as unhas na
mentira, certos de que no poder
sempre poderão seduzir ou comprar o apoio necessário para seguir adiante.
É patético ver isso tudo se desdobrando como o desenrolar de
uma experiência de esquerda.
Mas, se voltarmos atentamente à
história do socialismo, sobretudo
onde triunfou, veremos os germes
burocráticos dessa aberração. A
diferença é que lá havia censura.
Aqui, não, daí a necessidade de
Poleto e seu líder buscarem alguns sinais rudimentares para
uma comunicação interplanetária. Em caso de recusa, vão acabar sendo forçados a nos deixar no disco voador das três horas.
@ - contato@gabeira.com.br
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