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James Gavin diz que se o trompetista fosse feio ou negro não teria tido grande relevo
Para biógrafo, beleza pôs Chet na história
DA REPORTAGEM LOCAL
Leia a seguir trechos de entrevista com James Gavin, biógrafo
de Chet Baker.
(CEM)
Folha - O que o sr. acha dos críticos de Chet Baker que dizem que
ele nunca criou nada de original, só
copiou Miles Davis?
James Gavin - Acho que não é
bem assim, ainda que Davis tenha
sido claramente o grande modelo
de Chet. Ele próprio admitia que
se não tivesse havido Davis talvez
não houvesse Baker. Miles Davis
foi um dos primeiros a tocar em
um estilo econômico, sem mudanças abruptas, sem picos de
som. Esse modo "cool" foi a base
da música de Chet.
Folha - O sr. disse que sem Miles
Davis não teria existido Chet Baker. Se Chet fosse feio e negro...
Gavin - Nós definitivamente não
estaríamos tendo esta conversa.
Se ele fosse bonito e negro não estaríamos tendo esta conversa. Se
ele fosse branco e feio não estaríamos tendo esta conversa.
Folha - Mas ele teria algum papel
na história do jazz?
Gavin - Isso é difícil de dizer.
Muito da mística dele vinha do fato de ele ser branco, bonito e misterioso. Não creio que ninguém
defenda a idéia de que ele tenha
sido um mau trompetista, nem
mesmo Miles Davis, que chegou a
elogiá-lo, mesmo tendo ficado conhecido depois de Chet Baker,
que surrupiara seu estilo.
Mas vale ressaltar que boa parte
da popularidade de Baker veio de
algo que não está relacionado a
Davis: seu modo de cantar, muito
próximo do que era sua cara, bonita, triste e distante.
Folha - O sr. já disse que em 1994,
quando resolveu fazer o livro, tinha apenas dois discos de Chet Baker. Por que o sr. decidiu fazer uma
biografia sobre ele?
Gavin - O documentário de Bruce Weber "Let's Get Lost" foi fundamental para isso. Quando foi
lançado, no final dos anos 80, o
nome Chet Baker não estava em
lugar nenhum na América. Ele era
tido como uma relíquia do passado, só existia a idéia de alguém
que tinha se destruído com as
drogas. Era como uma piada.
O filme saiu em 1989, depois da
morte misteriosa dele. Os dois, filme e morte, geraram outra vez
uma movimentação em torno do
nome dele na América. Em 1994
me dei conta de que a história fabulosa de Baker ainda não tinha
sido narrada a fundo. E fui atrás.
Folha - Uma resenha sobre seu livro publicada no "The New York Times" sustenta que o sr. demonstra
uma certa aversão ao seu personagem. O sr. concorda?
Gavin - Não concordo. Essa crítica do "NYT", Michiko Kakutani,
é famosa por ser uma víbora. Claro que não odeio Chet Baker. Mas
fiz o máximo para não ser um biógrafo apaixonado. Busquei o tempo todo a neutralidade. Não havia
necessidade de colocar minhas
opiniões penduradas em histórias
tão fortes como as do sobrevivente Chet Baker.
Folha - Seu livro mostra como Baker entrou na heroína anos depois
de seus amigos. O que empurrou
ele para isso?
Gavin - Eu acredito que ele mergulhou na heroína só depois de
conhecer e ficar fascinado por um
jovem pianista chamado Dick
Twardzik, em 1955. Dick, um viciado, tocava de um modo tão
mágico que acredito que ele associou isso à heroína. Baker estava
mais ou menos apaixonado por
Dick. Foi depois da morte por
overdose do pianista, que, segundo rumores, Chet teria assistido,
que a coisa aconteceu. Ele voltou
para a América em 1956. E logo virou um viciado sério.
Folha - Quais marcas o sr. acha
que Chet Baker levou de sua viagem ao Brasil, em 1985?
Gavin - Acho que ele não tinha a
menor idéia do que era o Brasil,
ele estava viajando por todo lado e
não parecia ter nenhum envolvimento com os lugares que ia.
Chet, como é típico de um viciado, não tinha nenhuma relação
com o que estava fora dele. Só
pensava em a) conseguir drogas;
b) conseguir tocar.
Ele não sabia nada sobre o Brasil, acho que nem sabia o que era
bossa nova, gênero que de alguma
forma se espelhou em sua música.
O Rio de Janeiro, para Chet Baker,
deve ter sido como Cleveland ou
Detroit. Era qualquer lugar.
NO FUNDO DE UM SONHO - A LONGA
NOITE DE CHET BAKER. Autor: James
Gavin. Editora: Companhia das Letras.
Quanto: R$ 49 (494 págs.).
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