São Paulo, segunda-feira, 19 de dezembro de 2005

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"Chega de hipocrisia com Oiticica"

DA REPORTAGEM LOCAL

Assim como a Bienal organizada por Paulo Herkenhoff tornou internacionalmente conhecido o termo "antropofagia", a Bienal de 2006, criada a partir das idéias de Hélio Oiticica (1937-1980), promete resgatar o pensamento do artista, especialmente de sua fase "maldita", quando ele vivia em Nova York. É o que espera a curadora Lisette Lagnado. Leia a continuação de sua entrevista.
 

Folha - Quando vocês foram para a pesquisa de campo, a idéia do artista construtor do Oiticica e que inspirou o projeto da Bienal se fez presente?
Lagnado -
Quando eu formulei o projeto, parti de intuições e investigações que eu já tinha em relação à produção atual. Então não inventei a tese, ela estava no ar. O que talvez a gente não consiga confirmar é se o programa ambiental que o Hélio propôs é viável ou não.
O que me interessa é recuperar e dar dignidade para o pensamento e reflexão do Hélio na década de 70. Várias práticas não foram compreendidas, por isso acho o Hélio visionário. Chega de hipocrisia. Chegou a hora de falar de um neoconcretismo "banido" por uma certa crítica local e moralista que só o vê relacionado com o sexo, as drogas e o rock.

Folha - Como você define o programa ambiental do Hélio?
Lagnado -
É um programa político visando uma mudança de comportamento. Por exemplo, na "Cosmococa", ele faz uma crítica ao audiovisual passivo, à imagem. Como desde o começo a questão dele é a participação, eu acho que o programa ambiental é uma tomada de partido de que em nenhum momento o espectador se encontre passivo.

Folha - Numa Bienal do porte da de SP, obras interativas podem se tornar um playground...
Lagnado -
Essa é a parte que falta para definir o programa ambiental. Em "Programas para a Vida", o Hélio faz um adeus ao esteticismo, não é um adeus à estética, mas um adeus àquilo que não ultrapassa a forma e é elitista.
O "playground" era um conceito dele, mas, para não cair na diluição, não podemos ter esse tipo de instalação se não houver crítica, e a crítica para mim é sublinhar o "como" do "viver junto".
Essa exposição é o oposto da auto-ajuda. Nas notas de seminário do Roland Barthes, que serviram para dar título à Bienal, a questão mais crítica é a ética da vizinhança, de grupos que têm ritmos diferentes, afetivos ou não.
Barthes é mestre em se apoiar na linguagem, o corpo incluído. Teremos obras com pessoas falando línguas e sotaques, pessoas que não conseguem se entender. Não queremos dar uma resposta, mas mostrar os conflitos.


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