|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Última Moda
ALCINO LEITE NETO - ultima.moda@grupofolha.com.br
Ex-dono da Zoomp recomeça do zero
O estilista Renato Kherlakian volta à moda com a criação da grife RK Denin
A vida do estilista Renato
Kherlakian, 59, criador da
Zoomp e pioneiro do jeanswear
no Brasil, transformou-se, nos
últimos anos, num romance
mirabolante, ora próximo da
tragédia, ora do pastelão.
Uma grave crise financeira
na Zoomp o levou a colocar à
venda a grife criada em 1974.
Chegou a conversar com o grupo AMC Têxtil, dono da Colcci,
e com a IT Holding, empresa
italiana que controla a marca
Gianfranco Ferré, entre outras.
Acabou acertando, em 2006,
com a então desconhecida holding HLDC, dos empresários
Enzo Monzani e Conrado Will,
que assumiu todas as dívidas da
Zoomp. No final do ano passado, a HLDC anunciou a formação do ambicioso grupo I'M
(Identidade Moda), que, além
da Zoomp, incluiria as grifes de
Alexandre Herchcovitch e de
Fause Haten, entre outras.
Em março, a I'M desmoronou. Herchcovitch e Fause Haten deixaram o grupo. Kherlakian permaneceu, a fim de
cumprir seu contrato de prestação de serviços -puramente
formal, já que não fazia nada na
Zoomp, como revelou mais tarde. "Minha função era no máximo entrar nos desfiles", diz.
A Folha tentou ouvir o grupo
HLDC, mas não obteve resposta até o fechamento da edição.
Agora, Kherlakian tenta se
reerguer com a criação de uma
grife de jeans premium femininos, a RK Denin. A Folha foi ao
novo showroom do estilista,
nos Jardins, para conferir as
roupas. Uma pequena equipe
acompanhou a apresentação
das peças por uma modelo. São
jeans muito bem acabados, elegantes, com pequenos detalhes
que enriquecem o conjunto e
ótima modelagem -o que é
uma expertise do estilista.
Inicialmente, serão três linhas -jeanswear, alfaiataria e
demi couture-, com 35 referências. Estão previstos cinco
lançamentos anuais, com cem
modelos. Segundo Kherlakian,
ele já dispõe de 210 vitrines no
país. As vendas para o varejo
começam em 6 de janeiro. O
lançamento oficial será em 12
de março, na Daslu. Os jeans
custarão a partir de R$ 400.
Junto com os jeans serão distribuídas para os clientes as
moedas que o estilista mandou
cunhar em metal, com um brasão de sua família armênia. "É
meu saco de moedas", diz
Kherlakian, que, quase falido e
sem sócios, reuniu o que lhe
restava de economias e conseguiu acordos de produção -como o da fábrica Cosmak- para
poder começar de novo.
Na entrevista a seguir, ele
conta que, no auge da crise da
Zoomp, sonhou que Lula nacionalizava a empresa.
FOLHA - Como o sr. explica a derrocada tão rápida da I'M?
RENATO KHERLAKIAN - Eles montaram o grupo numa atitude de
grande risco, não sei se escorados por uma verdade financeira. Foram comprando as grifes,
dizendo que tinham meio bilhão de dólares para fazer a I'M,
com 12 marcas. Em janeiro, no
auge da euforia, me propuseram inclusive fazer uma linha
masculina e abrir uma loja de
800 m2 em frente ao shopping
Iguatemi. Cheguei a levar o arquiteto Felipe Crescenti lá.
Alexandre [Herchcovitch]
levou toda a sua alfaiataria para
o prédio da Zoomp, cujo desfile
na SPFW foi maravilhoso. Eu
até abracei o Conrado [Will, sócio do grupo HLDC] e chorei.
Lembra do meu colete com a
sigla I'M? Era um colete do
Yohji Yamamoto, onde eu colei
o I'M no lugar do Y3.
Em março, o blefe acabou estourando. Descobriu-se que
eles não tinham pago ninguém.
Foi uma debandada geral. Se o
Alexandre não tivesse fechado
logo com a Inbrands, ele teria
quebrado. Não sei como o Fause [Haten] não quebrou.
Foi o dia da vergonha nacional no nosso setor. Vivemos
uma palhaçada muito triste.
Não sei o que aconteceu. Como
fizeram um planejamento tão
lindo sem estarem escorados
financeiramente? A gente tem
que suspeitar de tudo, como
um Sherlock Holmes. Pode até
ser até que, desde o início, já tivessem previsto dar este balão,
na esperança que aparecesse
algum [Alexandre] Menegotti
[dono da AMC Têxtil] interessado em comprar o negócio.
FOLHA - O sr. chegou a trabalhar
em alguma linha de criação?
KHERLAKIAN - Eu deveria ajudar
na criação, mas no dia-a-dia
não desenvolvi nenhuma linha
para a Zoomp. Eles me congelaram, me colocaram no escanteio, não conseguia fazer nada.
Minha função era no máximo
entrar no desfile. Quando falaram em fazer a RK Homem, desenvolvi uma linha com 250 referências, que nunca foi produzida. Parei de falar com eles. Só
cobrava, não apenas o meu salário, mas que resolvessem os
meus avais. Porque, ao assumirem a Zoomp, eles teriam a responsabilidade de trocar o aval,
de renovar as dívidas. Eu ainda
tenho responsabilidade sobre
isso. Se eu entrar numa revendedora e quiser comprar um
carro usado, não posso, porque
meu nome está no Serasa.
FOLHA - Por que o sr. decidiu vender a Zoomp ao grupo HLDC?
KHERLAKIAN - Hoje posso contar, porque já terminou o sigilo
contratual previsto. Mas em
2005 ou 2006, sentei com o
grupo Menegotti para tentar
vender a Zoomp. Também fui a
Milão, falar com o grupo IT.
Ouvi outras propostas, algumas
indecorosas. A situação pedia
que eu me livrasse o mais rapidamente possível da empresa.
No auge da crise da Zoomp,
antes de vendê-la, eu tive um
sonho, que nunca contei para
ninguém até agora. Sonhei com
um grande comício, onde havia
um palanque com vários políticos. No meio do palanque, estávamos o presidente Lula e eu.
Ele discursava, gritando para o
povo que eu "era o homem",
que a "Zoomp era um ícone nacional". Eu sonhei que estava
sendo salvo pelo governo federal. Já pensou nacionalizar
uma marca como a Zoomp e fazer 5 milhões de jeans com o
raio para o povo brasileiro?
Texto Anterior: Cinema: Filme raro de Nicolas Philibert passa amanhã Próximo Texto: Frase Índice
|