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CRÍTICA
Lugares-comuns da literatura são alvo do autor
DA REPORTAGEM LOCAL
O argentino Federico Andahazi, uma das revelações
da literatura latino-americana
contemporânea, coloca seus romances a serviço de dois propósitos: a crítica aos lugares-comuns
da literatura e uma abordagem
original da interação entre história e ficção.
Em "O Anatomista" (ed. Relume-Dumará, 97), o escritor resgatou a trajetória de um obscuro
médico do século 16, Mateo Colombo, que, motivado por uma
paixão e por um furor detetivesco,
busca a descoberta do órgão do
prazer feminino, para isso enfrentando até a Inquisição.
A figura do protagonista no romance corresponde à de um marginal em seu tempo. O livro tem
ambientação histórica, mas fatos
são deformados e alterados em
pró do andamento do enredo.
Já em "As Piedosas" (Companhia das Letras, 98), o cenário histórico é outro, e Andahazi explora
uma reunião literária entre Lord
Byron, Percy e Mary Shelley, em
Villa Diodati, Genebra, em 1816.
Desse encontro sairiam as idéias
para a criação de obras como
"Frankenstein" (Mary Shelley). O
livro mistura literatura gótica e
policial, satirizando os lugares-comuns de ambos os gêneros,
além de apresentar um quadro tenebroso dos dramas individuais
que usualmente afligem os escritores: a inspiração, o plágio, a tradição, a traição etc.
Com "El Príncipe", Andahazi
repete a fórmula, satirizando o
próprio realismo mágico latino-americano, mostrando que este
tem muito a fazer para ser mais
interessante que a realidade.
O livro conta a história de um líder diabólico que, sem que seus
súditos conheçam nada de seu
passado e mesmo de suas idéias
políticas, é eleito presidente de
um país imaginário.
O presidente recebe instruções
de um "orientador espiritual",
que podemos identificar como a
"voz" de Maquiavel, com o nome
de Huáscar Molina Viracocha, figura que toma diferentes formatos em suas aparições, podendo
ser um cacto ou mesmo a figura
de Carlos Gardel.
O líder tem características de
presidentes contemporâneos e ditadores recentes da América Latina e sua principal marca é a de esconder suas intenções, que na
verdade não existem, e impingir o
medo por dons mágicos, como
voar ou lançar pragas.
Não faltam ministros alados
nem cachorros que tomam posse
da cidade como seres humanos,
nem metáforas políticas, como a
do líder da oposição que cai num
sono eterno assim que consegue
chegar ao poder.
Assim como "Amor Para Sempre", de Ian McEwan, ou "A Jangada de Pedra", de José Saramago, para não citar "Memórias Póstumas de Brás Cubas", de Machado de Assis, "El Príncipe" inscreve-se na tradição de livros com
primeiros capítulos que quase
roubam a cena do conjunto, praticamente trazendo seu clímax
para a introdução.
No livro de Andahazi, este descreve um balé aéreo da cúpula
presidencial sobre uma atônita cidade -que poderíamos identificar como Buenos Aires, São Paulo, Santiago etc.
(SYLVIA COLOMBO)
El Príncipe
Autor: Federico Andahazi
Editora: Planeta (importado)
Preço: U$S 15
Onde comprar: www.submarino.com.ar,
www.amazon.com
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