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Ciclo resume o Japão no cinema
Mostra aberta hoje em SP faz um recorte da produção de grandes diretores do país desde os anos 30
Seleção inclui desde "Coral de Tóquio", dirigido por Yasujiro Ozu em 1931, ao
recente "O Castelo Animado" (2004), de Hayao Miyazaki
CÁSSIO STARLING CARLOS
CRÍTICO DA FOLHA
Das muitas e valiosas contribuições trazidas pelos japoneses ao Brasil, comemoradas
neste centenário da imigração,
uma das que os paulistanos
evocam com mais nostalgia é a
programação das hoje extintas
salas de cinema do bairro da Liberdade. Por meio delas, várias
gerações puderam assistir a filmes importantes que só depois
foram descobertos e valorizados em outros países.
Um resumo desses tempos
acontece a partir de hoje com o
ciclo que reúne 20 filmes de 17
diretores japoneses no CCBB.
Mais que o volume de títulos e
de criadores, a seleção ganha
peso por seu recorte histórico,
que cobre desde o início dos
anos 30 até a produção recente.
Outra de suas qualidades é
não ter se limitado a um apanhado de obras-primas cuja
exibição costuma ser periódica.
Ao contrário, o ciclo traz mais
os chamados filmes médios ou
menores de grandes cineastas,
o que evidencia a importância
do cinema como revelador de
profundas mutações históricas
sofridas por um povo.
Cronologicamente, o primeiro título é de 1931. "Coral de Tóquio", de Yasujiro Ozu, traduz
as dificuldades cotidianas de
uma família de classe média
que enfrenta o desemprego nos
anos pré-aventura japonesa na
Segunda Guerra. Do mesmo diretor, o ciclo traz o arrebatador
"Era uma Vez em Tóquio", de
1953, uma obra sobre a velhice
e o problema do lugar dos idosos numa sociedade em que a
juventude começa a agregar a
parte substancial dos valores.
Outros diretores canonizados do cinema japonês ganham
apresentações de filmes menores e nem por isso sem importância. Em "A Luta Solitária"
(1949), pode-se conhecer um
Akira Kurosawa mais intimista
do que o que se tornou célebre
com seus filmes históricos. Em
"A Música de Gion" (1953), a
preocupação de Kenji Mizoguchi com o estatuto da mulher
no Japão ganha mais uma vez
um estudo implacável que toma como centro o modelo de
submissão das gueixas. E "Nuvens Dispersas" (1967) marca a
despedida do cinema do imenso Mikio Naruse com um derradeiro retrato de mulher.
O papel da mulher como representação simbólica das relações de poder é também um
dos principais interesses do superestimado "A Ilha Nua"
(1960), de Kaneto Shindo. Do
mesmo diretor, o ciclo programou ainda "Onibaba, a Mulher
Diaba" (1964), filme esteticamente mais impactante e cujo
peso político ganha mais vigor
com o tratamento alegórico
que Shindo dá à história da mãe
e da filha que matam samurais
para lhes roubar as armaduras.
Já em "As Quatro Faces do
Medo" e "Mulher de Areia"
(ambos de 1964), dirigidos por
Masaki Kobayashi e Hiroshi
Teshigawara, respectivamente,
o simbolismo ganha amplitude
e é traduzido com recursos visuais assombrosos que remetem à ópera (o primeiro) e às
artes plásticas (o segundo).
A tradição de um cinema rico
em experiências visuais se prolonga no experimentalismo
gráfico do veterano Seijun Suzuki em "Yumeji" (1991) e na
delirante imaginação de Hayao
Miyazaki em "O Castelo Animado" (2004).
O ciclo se completa com dois
nomes fundamentais do cinema moderno, dentro e fora do
Japão. "A Enguia" (1997) é um
belo exemplo de como Shohei
Imamura se interessou por
reintegrar o homem às potências do instinto. Já "O Túmulo
do Sol" (1960) e "Tabu" (2000)
demonstram a capacidade aguda de Nagisa Oshima de registrar a desestruturação (social,
no primeiro; mental, no segundo) como o efeito mais evidente
das desmesuras do poder.
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