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"Não me arrependo do que digo"
DA REDAÇÃO
Há quatro anos, Michel Houellebecq foi chamado de reacionário com o também polêmico
"Partículas Elementares" (Sulina,
99), em que já demonstrava seu
apreço pelo positivismo de Augusto Comte e atacava os mitos
criados por maio de 68.
A controvérsia que parecia
acompanhá-lo até então hoje o assusta. "Achei que as pessoas se
acostumariam comigo." Leia os
principais trechos da entrevista
que Houellebecq concedeu à Folha, da Irlanda, onde vive.
(SC)
Folha - A descrição que o personagem Jean-Yves faz da cidade de
São Paulo corresponde às suas impressões? Você já esteve aqui?
Michel Houellebecq - Não, eu
não conheço São Paulo, estive aí
só por algumas horas, mas me fizeram uma descrição bastante intensa (exata ou não, mas intensa).
Acho sempre mais fácil utilizar
impressões de uma terceira pessoa do que as minhas próprias.
Folha - O protagonista chama-se
Michel e a narrativa tem um tom
bastante confessional. "Plataforma" é um livro autobiográfico?
Houellebecq - Estive nos lugares
em que a ação se passa, na Tailândia e em Cuba, para escrever. Fiz
apontamentos sobre minhas impressões e, principalmente, muitas fotos. Queria que o livro tivesse um grande realismo fotográfico e acho que consegui. Também
pesquisei muito sobre a economia
da indústria do turismo. Mas a
parte autobiográfica mesmo é
muito tênue.
Folha - A intenção de seu livro é
mostrar como a maneira como a sociedade ocidental lida mal com sua
sexualidade fez surgir a indústria
do turismo sexual?
Houellebecq - Sim, mas não se
pode menosprezar a dimensão
capitalista. Por trás da empreitada
realizada por Jean-Yves e Valérie
para salvar os resorts, está a idéia
de criar uma "situação de troca"
entre a prostituição do Terceiro
Mundo e o dinheiro ocidental. Este é o motor da narração.
Folha - Você esperava uma reação tão forte? Arrepende-se do que
disse sobre o islã?
Houellebecq - Como eu já havia
causado bastante polêmica da última vez, pensei que agora as coisas iriam se acalmar, pois as pessoas terminam por se habituar a
você. Minha natureza não é de me
arrepender daquilo que fiz.
Folha - Além da controvérsia política, seu livro também causou uma
reação muito forte por descrever
cenas de sexo explícito. Você esperava uma condenação moral ?
Houellebecq - Sim, eu sabia que
seria tratado como um homem
desagradável e incômodo, obcecado por sexo pouco convencional, mas consigo me esquecer disso ao escrever. Só o que faço é
mergulhar na realidade, que para
mim significa ver que a sexualidade é inteiramente agradável, em
todos os casos, e isso não tem nada a ver com a amoralidade.
PLATAFORMA. De: Michel Houellebecq.
Lançamento: Record (Rio, 2002).
Tradução: Paulina Wacht e Ari Roitman.
Quanto: R$ 30 (383 págs).
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