São Paulo, terça-feira, 20 de abril de 2010

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Brasília celebra designer sem ícone

Presidência resgata mobiliário moderno de Sérgio Rodrigues para reabrir palácio

Planalto restaura modelos e gasta R$ 3 milhões para comprar novas peças, mas exclui a premiada poltrona Mole, considerada informal


FABIO VICTOR
DA REPORTAGEM LOCAL

Ícone do mobiliário moderno brasileiro, a poltrona Mole de Sérgio Rodrigues foi barrada na festa de 50 anos de Brasília. Apesar de a Presidência ter comprado, para a reinaguração do Palácio do Planalto, 1.273 novas peças de 16 modelos do designer, a premiada cadeira não consta do pedido.
A exclusão contrariou Rodrigues. "Teria muito prazer em ver um ambiente com umas poltronas em volta de uma mesa, um espaço mais confortável. Poderia ficar no Palácio da Alvorada. Os palácios são visitados por estrangeiros, seria um bom cartão de visitas -não para a Mole, mas para o presidente que estiver lá", diz ele.
Criada em 1957, premiada na Bienal de Cantu (Itália), em 61, e hoje no acervo do MoMa (Museu de Arte Moderna de Nova York), a Mole é uma poltrona de couro com formato que convida ao esparrame.
Rodrigues conta que, quando o governo comprou suas peças para a inauguração de Brasília, ele já tentara inclui-la no pacote, em vão. "Foi considerada muito informal", lembra.
Mais de 50 anos depois, o motivo alegado é o mesmo. "Não faz sentido ter uma peça assim no ambiente de trabalho, aquilo é como um colo, é muito informal", argumenta Cláudio Soares, diretor de documentação histórica da Presidência e coordenador da comissão de curadoria dos palácios.
Ele não descartou a possibilidade de, numa etapa futura, colocar a Mole no Alvorada, residência oficial da Presidência.
A compra, na qual o Planalto gastou R$ 3 milhões (inclui 54 peças de Niemeyer), é acompanhada da restauração de modelos que estavam danificados.
Embora Soares não use o termo, e Rodrigues evite o tema, a valorização do mobiliário modernista nos palácios é uma espécie de reparação pelo abandono a que foram relegadas durante anos peças dessa escola.
Quem fala sem trava é a mulher de Rodrigues, Vera Beatriz. "Os militares não gostavam, e sumiram com os móveis. Jogavam em garagens, abandonavam, e os antiquários acabavam comprando", declara.
Cláudio Soares diz que a ideia do projeto é "resgatar e vender brasilidade". "No palácio do Eliseu só tem móvel francês; na Casa Branca, só americano. No Planalto você tinha tudo, menos móvel brasileiro."
Ele afirma que o escritório de Niemeyer em Brasília propôs a compra de peças do alemão Mies van der Rohe e do americano Charles Eames, sugestão recusada. Foi uma das muitas divergências que fizeram o grupo do arquiteto abandonar a reforma do Planalto após entregar o projeto. "O ambiente estava tão ruim que saimos", conta Carlos Magalhães, representante do escritório na capital.

Gente da pesada
Amigo de Niemeyer, Sérgio Rodrigues era sócio, na época da criação de Brasília, da loja-fábrica Oca, que, segundo recorda, "era muito considerada por todos, pelo Oscar, por ministros, gente da pesada".
Sobrinho de Nelson Rodrigues e um dos mais reconhecidos designers de móveis brasileiros, o pai da Mole continua, aos 82 anos, ativo dentro e fora do país. Vive e trabalha no Rio. Ontem estava em Milão, onde foi à famosa Feira de Móveis. E pretende estar em Brasília para a reinaguração do Palácio do Planalto -programada originalmente para amanhã, mas adiada para data incerta.


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