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Bebida
Cerveja de panela
Fabricação caseira da bebida cresce no Brasil, e cervejeiros se unem em busca de mercado comum; concurso no Rio julgará 49 marcas artesanais no próximo dia 29
JANAINA FIDALGO
DA REPORTAGEM LOCAL
Existe uma turma que já não
se contenta mais em reunir os
amigos em torno de uma mesa
de bar, estender o braço e pedir
ao garçom uma cerveja gelada.
Nas horas livres, eles se recolhem à cozinha de casa para
produzir sua própria cerveja,
num processo que, de cara, leva
oito horas (e, depois, quase um
mês para a bebida maturar).
Cultura antiga e superdifundida em países como os Estados Unidos, a produção caseira
de cerveja não é nova no Brasil,
mas está em ascensão e tem ganhado cada vez mais adeptos,
os chamados "home brewers".
Com eles, surge uma leva de associações, concursos e blogs.
Fundada, como convém, na
mesa de um bar, a ACerva Carioca foi uma das pioneiras. A
associação nasceu como uma
brincadeira entre amigos e, em
menos de um ano de existência,
chega à segunda edição de um
concurso nacional de cervejas
artesanais. No último sábado
deste mês, serão julgadas 49
cervejas, contra as 25 de 2006.
"Com o advento da internet,
as pessoas que faziam, timidamente, cerveja em casa começaram a descobrir outros que
também fabricavam, e a coisa
cresceu", diz Sergio Fraga, 38,
um dos fundadores d'ACerva.
Competição como a da associação carioca já tem pares em
outras cidades. Em agosto,
Campinas sediou o 1º Concurso
de Cervejas Caseiras de São
Paulo. Na capital mineira, a terceira edição do BH Home Bier
está prevista para novembro.
E até uma microcervejaria
artesanal, a catarinense Eisenbahn, está promovendo um
concurso para eleger um cervejeiro caseiro. O vencedor fabricará um lote de sua receita
(3.000 litros) em Blumenau.
"Temos mais é que nos unir e
desenvolver um mercado em
comum. Fazer o brasileiro perceber que cerveja não é sinônimo de pilsen estupidamente
gelada", diz Juliano Mendes,
diretor do grupo catarinense.
Bisavó cervejeira
O mundo dos cervejeiros caseiros é formado, predominantemente, por homens na faixa
de 30 a 40 anos. Em geral, são
profissionais bem-sucedidos
que compartilham a paixão pela bebida e fizeram da fabricação artesanal um hobby.
Curiosamente, alguns foram
influenciados por mulheres. É
o caso do advogado Leonardo
Botto, 30, vencedor das duas
categorias (com mais de uma
colocação) do primeiro concurso d'ACerva Carioca.
"Minha bisavó alemã fazia
cerveja em casa, no Rio. Não a
conheci, mas minha mãe vivia
contando histórias das garrafas
que estouravam", diz. "Comecei a estudar sem pensar em fazer. Era um sonho para o qual
eu não via possibilidades."
De casa para o bar
Mais que inspiradora, uma
vizinha de origem alemã foi
quem ensinou o, à época, adolescente Gustavo Dal Ri, 37, a
fazer cerveja. Depois de muitos
anos de produção caseira, o engenheiro químico virou microcervejeiro e hoje vende a produção da gaúcha Schmitt.
"Trabalhei numa cervejaria
multinacional e sempre almejei ter a minha. Hoje sou concorrente deles", brinca. "Foi
uma grande batalha. Vários lotes ficaram intragáveis. A sorte
é que os meus amigos eram exigentes. Sabia que, se conseguisse agradá-los, não teria problemas para vender fora."
No Brasil, não há uma definição legal do que é uma microcervejaria artesanal. Mas, entre
as pessoas do meio, há alguns
consensos: 1) ser independente
(não pertencer a uma cervejaria industrial); 2) ser tradicional (usar cereais maltados, como cevada e trigo, que melhoram o sabor da bebida); 3) produzir até 200 mil litros/mês.
Outro cervejeiro caseiro que
se prepara para entrar no mercado é o gerente de projetos da
área de informação Sergio Fraga, d'ACerva Carioca.
"É um orgulho ver a bebida
saindo, dando certo, e os amigos elogiando. Aliás, quanto
mais cerveja você faz, mais
amigos aparecem. Há uns caras-de-pau que mandam a garrafa vazia para eu encher", diz.
"Até que um deles se interessou, achou que era viável e está
capitalizando o projeto."
Visto por muitos "home
brewers" como uma transição
natural, o sonho de transformar a produção artesanal em
profissão não é acalentado por
todos. Apesar de ter uma parte
de sua produção vendida em
bares, o engenheiro agrônomo
João Gonçales, 36, da Dana
Bier, diz que "ainda é um cervejeiro caseiro". "A comercialização aconteceu por acaso. O objetivo não é ganhar dinheiro
com cerveja. Se eu tiver de investir, deixará de ser um hobby
prazeroso para virar pressão."
No caso do ex-cervejeiro caseiro Marco Antonio Falcone,
44, deixar a empresa de engenharia elétrica onde trabalhava
para abrir com dois irmãos a
microcervejaria mineira Falke
Bier, em 2004, foi um processo
planejado. "Nós incentivamos
novos empreendedores porque
existe uma demanda grande
por produtos de qualidade. Hoje, há uma legião de apaixonados por cerveja artesanal que
não consegue mais beber essas
cervejas estandardizadas", diz.
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