São Paulo, Quarta-feira, 20 de Outubro de 1999
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FEIRA DE FRANKFURT
Sucessor de Peter Weidhaas é Lorenzo Rudolf, que dirigiu feira de arte de Basel por nove anos
Despedida de diretor encerra edição 99

CASSIANO ELEK MACHADO
enviado especial a Frankfurt

A 51ª edição da Feira de Livros de Frankfurt terminou anteontem com carimbos discretos em seu passaporte. Foi uma feira de medalhões literários (Tom Wolfe, Günter Grass, Saramago e outros), de negócios mornos e de público estável (os mesmos 290 mil do ano passado).
Mas, pelo menos para a história interna da Feira, 1999 será um ano de uma grande virada de página.
Depois de 25 anos dirigindo o maior evento editorial do mundo, o alemão Peter Weidhaas se despediu do comando de Frankfurt. Nesta segunda-feira, ele viu pela última vez os 6.700 estandes da Feira "virarem abóbora". É assim que ele define, com bom humor, a rapidez com que, a cada ano, a gigantesca empreitada de 189 mil m2 é desmontada.
Aos 62, resolveu se aposentar para "começar uma vida nova".
"Estava muito cansado. Calcule 24 vezes 365 vezes 25 anos. Este foi o número de horas de minha vida dados a esta feira", disse Weidhaas à Folha. "Eu poderia escrever um livro só sobre os sonhos que tive relacionados a ela."
Não seria estranho se ele o fizesse. Weidhaas é uma das vozes mais fortes na defesa da tese de que o livro, tal como o conhecemos, é eterno.
"Livros eletrônicos, editoras virtuais e outras tecnologias só ajudam. O livro hoje é universal. No mundo todo se lê desde as intrigas de John Grisham até as mitologias do brasileiro Paulo Coelho, passando pela história de uma família do sul da Índia, como a feita por Arundathi Roy, ou pela filosofia alemã de Jürgen Habermas. O livro está muito saudável."
Por que, então, na maior feira de livros do mundo, é quase impossível ver alguém lendo?
"Bem, aqui não é um lugar para leituras", explica Weidhaas. "Frankfurt é um tremendo lugar de comércio. De comparação, trocas, contatos. Comunicação e diálogo são as essências do evento, não a leitura. As leituras aqui só são feitas nos hotéis, e sempre na diagonal."
Se tivesse que passar os olhos na diagonal de seus 25 anos de Feira (32, se fossem contados os sete anos em que foi diretor de relações internacionais do evento), Weidhaas enxergaria em 1989 as linhas mais interessantes.
"Foi o ano mais turbulento para mim." No ano anterior, o escritor Salman Rushdie tivera uma sentença de morte ("fatwa") decretada pelo aiatolá Khomeini graças à publicação de seu livro "Versos Satânicos".
Weidhaas anunciou, em seguida, que as editoras iranianas não seriam recebidas enquanto houvesse a oferta pela cabeça do autor anglo-indiano.
"Foi muito dolorido. Sempre lutei para incluir o maior número de países e editoras. Mas tivemos que reagir."
As editoras iranianas só voltaram a Frankfurt este ano, já que a sentença de morte foi revogada no final de 1998.
Além dos iranianos, a delegação que mais recebeu atenção de Weidhaas nesta edição foi um grupo de 15 escritores de diversas origens culturais da antiga Iugoslávia. Chamado de "Grupo 99", eles brigam contra o "chauvinismo político e cultural" e têm no topo do abaixo-assinado para apoio ao grupo a assinatura de Weidhaas.
Durante a entrevista, Weidhaas recebe um chamado. Existe um problema com uma manifestação em frente ao estande coletivo do Paquistão. Um grupo exibe cartazes contra o recente golpe de Estado. Weidhaas pede licença. "Preciso intermediar."
Ele sai apressado e aponta para Lorenzo Rudolf, 39, que assume a direção no próximo ano. "Agora é com ele", diz Weidhaas.
Diretor da feira de arte suíça "ART Basel" por nove anos, Rudolf resume seus prognósticos com: "Ainda é muito cedo para falar em mudanças".
E teremos artes plásticas em Frankfurt? "O foco continuará sendo o livro. Quando eu quiser ver boa arte contemporânea vou para a Bienal de São Paulo", disse à Folha o novo diretor da maior feira de livros do mundo.


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