São Paulo, sexta-feira, 20 de outubro de 2000

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Moreno Veloso soma influências e estréia em CD

Daniela Dacorso/Divulgação
Veloso, Domenico e Kassin, que formam o trio Moreno + 2, lançam álbum e tocam no Free Jazz


PEDRO ALEXANDRE SANCHES
DA REPORTAGEM LOCAL

"Máquina de Escrever Música" é o CD de estréia de um trio carioca de receita pop/MPB chamado Moreno + 2, que se lança também ao vivo, para um grande público, nesta edição do Free Jazz Festival, abrindo para Manu Chao.
A "fórmula" Moreno + 2 esconde atrás de si alguma ocultação. O Moreno citado tem sobrenome Veloso e é filho de Caetano. Moreno Veloso tem 27 anos, nasceu na Bahia e mora no Rio desde os 3. Estuda física e muito resistiu até se tornar artista de verdade.
Mas a fórmula abriga, também, certo grau de desnudamento. Não é, como se poderia inferir, a afirmação desse tal Moreno em oposição a outros dois quaisquer.
Ele explica, por telefone, do Rio. "É Moreno + 2 porque neste momento quem encabeça o grupo sou eu. O disco de Domenico + 2 já está quase inteiro gravado, e vamos fazer também o Kassin + 2", diz, referindo-se aos outros dois integrantes do trio.

Família demais
Apresentando-se, Moreno fala sobre seu "disco de canções" e expõe pouco a pouco suas relações com o imenso passado que repousa em seus ombros.
a) Conta que evitou lançar-se pela Natasha, gravadora de Paula Lavigne, a mulher de seu pai. "Máquina de Escrever Música" sai pela Rock It!, de Dado Villa-Lobos, ex-Legião Urbana.
"Chegamos a negociar com a Natasha, mas achei que era família demais. A Rockit! era menor. E era mais interessante para nós que fosse um selo pequeno. Fizemos o disco sozinhos, em estúdio caseiro, é melhor para nós assim", explica. A Natasha, entretanto,ficará responsável pela distribuição do disco no exterior.
"Nunca fui procurado por uma grande gravadora. Acho que isso é normal para um artista que está começando. Mandei fitas demo para todas, foi aquele negócio de "vamos conversar no ano que vem". Não houve oferta bonita, nada tão interessante."
b) Localiza em Caetano e no músico e amigo de infância Pedro Sá fontes básicas de influência em sua formação musical: "Meu primeiro contato com a música se deu por intermédio de meu pai e dos amigos dele. Em casa havia um quarto chamado "sala do som", onde todo mundo ouvia todo tipo de música. Pedro Sá me mostrou o resto das coisas, que eu não ouvia em casa, o rock'n'roll".
O companheiro de trio Kassin, interessado pela cultura eletrônica, veio complementar o ciclo: "Ele é muito moderno, vem de uma praia completamente diferente. Conhece várias coisas com que não tenho contato", diz.
c) Admite que andou resistindo à profissão estelar com que sempre conviveu: "Não queria ser músico. Estudava violão e violoncelo desde criancinha, mas nunca com a intenção de ser profissional".
"Ainda faço física, estou no curso desde 1992. Mas ao mesmo tempo montei um estúdio caseiro, que me norteou, no sentido de que eu já estava vivendo de música. Não fugi dela, sempre fiz. Só não tinha a intenção de ser artista, mostrar o que fazia para todos."
Por que não ser artista? "Que coisa triste... É feio esse negócio de ser artista, jornalista. Sou mais para o ouro de tolo, acho que nem tudo que reluz é ouro. Vender pessoas e talentos e vender sabonete é a mesma coisa, essa é a parte chata", responde.
d) Passa a explicar a capitulação, a travessia rumo ao rótulo "artista": "Coloquei minha vida musical exposta num disco. É importante para mim, como figura semipública que sou desde que nasci. Aplaca minhas dúvidas sobre minha própria personalidade. Aplacando as dúvidas dos outros, aplaco as minhas junto".
Mais: "É um passo à frente do que eu sempre quis e não quis. Não queria fazer CD, ter banda -por ser tímido, não por ser contra. Tive que responder isso para mim e dar o braço a torcer de que também é bom e divertido".
e) Afirma que recorreu à orientação de Caetano quanto ao canto: "Procurei meu pai para ele dizer se o canto estava muito ruim. Ele disse que estava ruinzinho, mas no final acabou gostando. Eu queria que ficasse bem desleixado, mas ele achou que estava um pouco desleixado demais".
Sobre a voz: "Sempre foi muito aguda. Nunca fiz aula de canto, como se pode perceber, não canto muito bem. Antes de gravar, cantava até pior do que aquilo. Não acho que cante bem, nem que cante muito mal. Não sou um cantor, mas, se achasse que não posso cantar, não estaria ali".
f) Defende-se do privilégio gozado, de, ainda iniciante, conseguir espaço num dos principais festivais musicais do país: "Acho que o Free Jazz é um pouco fora de escala para o que a gente faz. Minha primeira reação foi de não querer fazer, mas não pude recusar, porque Monique Gardenberg (organizadora do festival) é amiga. Não tenho dúvida nenhuma de que toco lá porque sou amigo dela. Mas não recusaria de jeito nenhum".
Fala, por fim, da inclusão do clássico "Só Vendo Que Beleza" (antes gravado, sob o título "Marambaia", por cantoras como Elza Soares e Elis Regina): "Foi a primeira música que aprendi a cantar, por volta dos 3 anos, com meu pai tocando. É por isso que no disco ele faz o violão. Gravamos simultaneamente, mais ou menos no estilo histórico".


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