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CANTO/DANÇA
Com 44 bailarinos e 13 músicos, espetáculo encenado em teatro carioca preserva cultura africana
Tradição do Jongo da Serrinha volta maior
DA SUCURSAL DO RIO
Entre muitos cantos e danças,
não há falas no espetáculo "Jongo
da Serrinha", que estréia amanhã
no teatro Carlos Gomes, no Rio.
Mas alguns lemas dessa tradição
africana que insiste em sobreviver
no Brasil são ditos no palco. Um
deles é fundamental: "Nada nos
pertence. Tudo o que recebemos
temos de passar adiante".
Dois anos depois de um espetáculo homônimo que lotou o Carlos Gomes, o grupo Jongo da Serrinha volta à cena para passar
adiante um acervo histórico que,
se tivesse ficado limitado a um
gueto, poderia ter até acabado.
E volta em dimensão maior:
com 44 bailarinos, 13 músicos, direção cênica (de Celso André), direção musical de um craque do
samba (Paulão 7 Cordas), projeções de imagens, além de figurinos e maquiagens de impacto.
"O jongo era mais simples. Agora está luxuoso, com essas roupas
todas. Mas está bonito", diz Tia
Maria, 84, matriarca do grupo da
Serrinha, no morro de Madureira
(zona norte), que é um dos mais
fortes núcleos de preservação das
tradições africanas no Rio.
A afirmação de Tia Maria é mais
uma constatação do que um lamento. Até os anos 70, o jongo se
mantinha na Serrinha com suas
características originais: um ritual
de celebração dos deuses ancestrais, conduzido pelos toques dos
tambores, cantos de louvor e respeitando-se a primazia dos mais
velhos -as crianças nem podiam
participar. Mas Darcy Monteiro,
o Mestre Darcy, resolver pôr em
prática seu conceito de "folclore
evolutivo" e abrir o compasso.
Em primeiro lugar, as rodas passaram a ter violões, cavaquinhos e
flautas. "Os escravos tocavam só
tambor porque não tinham acesso a outros instrumentos", justificava Darcy, morto em 2001.
Crianças passaram a participar
dos rituais e dos espetáculos, que
Darcy começou a montar com
sua mãe, Vovó Maria Joana Rezadeira (1902-1986), mãe-de-santo,
jongueira e líder comunitária. Esse trabalho culminou em 2000
com a criação da ONG Grupo
Cultural Jongo da Serrinha, que
ensina o jongo a 120 crianças.
"Lutamos para manter a identidade dessa comunidade. Por isso,
reunimos todo o material possível
no nosso centro de memória",
conta Dyonne Boy, diretora geral
da ONG e bailarina.
A luta tem efeitos práticos. Recentemente, técnicos da prefeitura começaram a medir o terreno
da casa de Tia Maria, pois ela provavelmente teria de ser derrubada
em função do projeto Favela-Bairro. O Jongo da Serrinha começou a se mexer para mostrar
que naquela casa cinqüentenária
uma história importante se deu.
A família Oliveira, de Tia Maria
e Tia Eulália -fundadora do Império Serrano, morta há três meses, aos 96- e a família Monteiro
continuam sendo os eixos do Jongo da Serrinha. Lazir, sobrinha de
Tia Maria, e Deli, sobrinha de
Darcy, são duas das cantoras do
espetáculo. Luíza e Tia Maria
completam as vozes.
Dividida em três partes, a encenação começa na região Congo-Angola, de onde os negros bantos
escravizados trouxeram o jongo;
continua nas fazendas de café do
vale do Paraíba e nos morros e
áreas rurais cariocas, onde ele se
manteve vivo; e termina caindo
no samba, já que o Império Serrano é um desdobramento das tradições da Serrinha. Com "Bumbum Paticumbum Prugurundum" o grupo conclui seu ritual
em clima de festa.
(LUIZ FERNANDO VIANNA)
Jongo da Serrinha
Quando: qui. a sáb., às 19h30; dom., às
18h; de amanhã a 13/11
Onde: teatro Carlos Gomes (pça.
Tiradentes, s/nš, RJ, 0/xx/21/2232-8701)
Quanto: R$ 20
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