São Paulo, segunda-feira, 21 de fevereiro de 2000


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MÚSICA
A roqueira tem ainda participação especial como backing vocal no CD que Rita Cadillac prepara apenas com composições suas
Rita Lee grava disco só com inéditas

TOM CARDOSO
especial para a Folha

Aos 52 anos, Rita Lee anda com pique de menina. A roqueira saiu da toca, arrastou o marido e produtor Roberto de Carvalho para o estúdio e juntos preparam um disco de canções e parcerias inéditas. Ao mesmo tempo, Rita observa reticente o oba-oba da imprensa internacional com Os Mutantes, grupo de que ela fez parte na década de 60 e 70 e que hoje virou cult nos Estados Unidos. "Não aguento mais ouvir falar de Mutantes", declarou durante entrevista exclusiva à Folha.
Rita também soltou o verbo contra o grupo Tutti Frutti, que acompanhou-a durante um bom tempo e foi responsável por uma das melhores fases de sua carreira. Elogiou Rita Cadillac, "a única bunda inteligente do país", com quem gravou uma participação especial no disco "Rita Canta Rita", e disse estar pronta para interpretar Evita Perón no filme "Olga del Volga", dirigido por Patrício Bisso.

"Feiticeira corcunda"
Nada de disco acústico. Rita não quer desgrudar das guitarras. Em seu novo CD, vai até abrir espaço para "umas batucadas de pista", mas não seguirá a onda tecno que impregnou o rock brasileiro.
"Não pretendo cair de sola nas tecnologias sintéticas. Será um disco basicamente rock'n'roll, desses que eu sempre fiz." Para isso, convidou o produtor Apollo 9 para dividir a produção com Roberto de Carvalho. "O Apollo é um cara antenadíssimo, vai saber trocar figurinhas com os velhinhos roqueiros."
Rita ainda não definiu o repertório, mas não deve deixar de incluir a ótima e afiada "Pagu", parceria com Zélia Duncan (veja letra nesta página). Bem no estilo "porra-louca", como ela mesma se define, Rita ironiza o excesso de bundas fabricadas na televisão brasileira: "Nem toda feiticeira é corcunda/ Nem toda brasileira é bunda/ Meu peito não é de silicone/ Sou mais macho do que muito hôme", diz o refrão.
"É uma pauleira femealista que dá sequência à minha série mulheres no poder. "Pagu" é tataraneta de "Cor de Rosa Choque", bisneta de "Luz del Fuego" e "Elvira Pagã", neta de "Todas as Mulheres" e filha de "Santa Rita de Sampa'", explica a compositora, que encomendou ao velho amigo Tom Zé, seu "parceiro do futuro", a letra de "3001", uma espécie de continuação de "2001", que os dois compuseram em 1968 e que virou clássico da MPB. Há ainda parcerias com Itamar Assumpção ("Aviso ao Meliantes") e Pato Fu ("Amor em Pedaços").

Deslumbre tardio
Rita não nega a importância dos Mutantes no cenário musical brasileiro, mas não suporta mais ouvir falar do grupo. Desde que a coletânea "Everything Is Possible" foi lançada nos Estados Unidos pelo selo Luaka Bop, de David Byrne, a artista não pára de dar entrevista por e-mail para a imprensa norte-americana.
"Os gringos descobriram o caminho das Índias tropicais com um belo atraso. Os Mutantes sempre estiveram anos-luz à frente de sua época", diz Rita. "É sempre bom morrer e renascer artisticamente, mas daí a ficar deslumbrada com as homenagens póstumas de Beasties e Becks é demais para mim", diz Rita, referindo-se ao grupo Beastie Boys e ao cantor Beck, que se dizem influenciados pela banda paulistana em seus últimos trabalhos.
"O tropicalismo nunca precisou de paternalismos estrangeiros para continuar sendo o movimento musical mais genial da MPB", diz.

Traição
Com o grupo Tutti Frutti, Rita viveu um dos melhores momentos de sua carreira, gravando o histórico "Fruto Proibido", em 1975, que figura em qualquer lista dos dez melhores discos do rock brasileiro. Passados anos do fim da banda, o Tutti Frutti voltou a fazer shows pelo país e recebeu propostas para gravar um disco.
Da formação original, restou apenas o guitarrista Luiz Carlini, que é acusado de traição por Rita. "Carlini registrou o nome Tutti Frutti escondido de todos nós. Foi uma traição inesquecível, uma atitude desonesta de sua parte."
"Desejo sorte para ele, é um batalhador e bom guitarrista, mas nunca conseguiu o sucesso que pretendia em nenhuma das milésimas vezes que usou o nome Tutti Frutti com outras formações."
O guitarrista se defende: "Registrei o Tutti Frutti achando que Rita não iria mais precisar do grupo, pois estava gravando com Roberto na época. Eu fui muito legal com ela como guitarrista. Participei no processo de criação de vários sucessos dela e topei ficar sem crédito numa boa".

Lee & Cadillac
A roqueira sempre foi fã da xará Rita Cadillac, desde os tempos em que a chacrete rebolava no programa televisivo do Chacrinha. Quando soube que Cadillac estava planejando gravar um CD só com canções de sua autoria, Rita achou ótimo e topou dar uma canja como backing vocal.
"Sempre gostei da Cadillac, sem dúvida a única bunda inteligente que eu conheço. Conversamos pelo telefone e eu sugeri a ela incluir no repertório "Bwana" e "Barata Tonta", músicas que falam de "mulheres objeto" com classe."

Comediante nata
Aproveitando o talento cênico de Rita Lee, o artista plástico, ator e agora cineasta Patrício Bisso convidou-a para interpretar Evita Perón em seu primeiro longa-metragem, inspirado na sexóloga Olga del Volga, um de seus mais célebres personagens.
"Aceitei o convite porque sei que, quando começar a gravar, vai ser muito legal, como tudo o que Bisso faz", diz Rita. O diretor devolve o elogio: "A Rita é uma comediante nata. Ela devia ser melhor aproveitada em filmes e em programas de televisão. Em vez de ficar convidando a Xuxa e a Angélica, chamem a Rita, que o resultado vai ser bem melhor".
Bisso afirma que vendeu um apartamento para viabilizar o filme. O elenco terá ainda Paulo Autran, no papel de Freud, Agnaldo Rayol interpretando Stálin, Antunes Filho como Stanislavsky e outros atores, ainda não confirmados.
"O José Wilker é a cara do Lênin, adoraria tê-lo no filme", diz Bisso, que vai, claro, interpretar sua personagem Olga del Volga.


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