São Paulo, quarta-feira, 21 de fevereiro de 2001

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MÚSICA

Programas na rede veiculam novas tendências e recuperam raridades

Talentos do rádio brasileiro migram para a Internet

PEDRO ALEXANDRE SANCHES
DA REPORTAGEM LOCAL

A Internet, ainda criança, vai se tornando abrigo para profissionais que ficaram sem ter onde atuar pela brutalização em regra das programações de rádios brasileiras.
Estrearam neste início de 2001, no site Usina do Som (www.usinadosom.com.br), programas de dois profissionais que colaboraram, das rádios em que trabalhavam nos anos 80, para definir os rumos do pop-rock brasileiro dali em diante. São os cariocas Maurício Valladares, 47, com o programa "Ronca Ronca", e José Roberto Mahr, 44, com o "Zero DB".
Os programas são atualizados semanalmente (leia roteiro ao lado), mas os programas anteriores permanecem no arquivo do site, disponíveis a qualquer momento.
O primeiro remete ao trabalho de Valladares na fundação da Fluminense FM (1982-85) e, no final dos 80, no programa "Ronca Tripa", na Panorama FM.
Valladares, também fotógrafo de capas de discos como as dos Paralamas do Sucesso, espanta qualquer associação com saudosismo dos anos 80, em voga em certas camadas da noite paulista:
"Mesmo tendo essa referência com os 80, jamais alimentei a masturbação tão em voga de retorno ao que quer que seja. Nunca me pendurei ao que fiz. Procuro estar voltado para o que está rolando e sobretudo para o que vem pela frente. Se sou ligado a Legião Urbana, Echo and the Bunnymen e Paralamas, também sou a Asian Dub Foundation, Chemical Brothers, Verve e Zumbi do Mato".
Sua aposta: "O ouvinte de rádio quer ser surpreendido. Não só o ouvinte, mas qualquer pessoa em qualquer situação quer ser tomada pela sensação de não saber para onde está indo. Fazer isso continua sendo a principal diretriz do programa".
Em direção parecida caminha José Roberto Mahr, também DJ, que apresentou, em várias versões, emissoras e cidades, entre 84 e 98, o programa "Novas Tendências", de início também impulsionador da "new wave brasileira".
"Zero DB", a nova versão, abrange também pop e rock, com novidades, raridades e covers, mas dá destaque a vertentes eletrônicas como tecno, trance, drum'n'bass e ambient. "O "Zero DB" tem algumas coisas do "Novas Tendências", mas agora é um outro momento, uma outra onda sonora", justifica.
Mahr faz a comparação entre rádio convencional e de Internet: "Não ouço todas as rádios, mas no eixo Rio-SP estão muito ruins, com a mesma fórmula de sempre: repetitiva, sem criatividade e sem novidades. A Internet pode tocar músicas que passam batidas pelas rádios FM, em que nunca irão tocar".
Valladares adota discurso mais radical: "Como o rádio está morrendo -sobretudo no Brasil, onde não há nenhuma renovação de pessoas, técnicas, equipamento e conteúdo-, a Internet passou a ser a saída para quem quer se informar sobre som. Essa saída ainda é muito apertada, mas vai alargar, com certeza".

Astros e colecionadores
Não só de exilados das rádios vive a programação alternativa. A mesma Usina do Som negocia, mas ainda sem resultados definitivos, programas que seriam apresentados pelo rapper DJ Hum e pelo ex-Legião Urbana Dado Villa-Lobos.
Já o músico Ed Motta ocupa parte de seu site oficial (www.edmotta.com.br) para veicular, como DJ e comentarista, o programa "Empoeirado", que é levado ao ar também pela Rádio UOL.
Ele explica o interesse: "Eu já tive envolvimento com rádio, colaborei nos anos 80 com um programa de música negra e, em 92, fiz, numa rádio de Minas Gerais, um programa meio "baú do Ed", já parecido com o "Empoeirado" de agora".
"O tom do programa é coisa de colecionador, mas não de raridade pela raridade. Gostaria de dividir com as pessoas tudo que aprendi, já que mais da metade de todo o meu orçamento foi gasta em discos", explica.
"Empoeirado" tem formato "mini", com Ed comentando cinco músicas retiradas de seu próprio acervo de discos de vinil a cada semana. Segundo ele, a audiência chega a 2.000 pessoas, quando o programa está ao vivo, e a uma média de 400 visitas/dia.
"Há pessoas que mereciam estar fazendo seus programas não só na Internet, mas no rádio, ao alcance de todos, e não há mais isso", diz. "Eu não trocaria audiência por mudança estética do programa. Em música, uma hora ou outra tenho de fazer alguma concessão, porque preciso botar comida no meu prato. Mas, nesse tipo de formato, não, por isso não quis fazer em rádio normal."
Rato de raridades como Ed Motta é o gaúcho radicado em Brasília Fernando Rosa, que se tornou conhecido nos meios roqueiros alternativos por conduzir o site dedicado à pré-história do rock nacional "Senhor F" (www.senhorf.com.br).
Em seu programa "Senhor F - A História Secreta do Rock", ele desfila um rosário de preciosidades perdidas do rock brasileiro, que vão de Nora Ney cantando "Rock Around the Clock" -a primeira gravação de rock no país- a Caetano Veloso com os Mutantes em "A Voz do Morto".
"Fujo do formato temático, achei que ficaria muito quadrado. Me criei assim, com um conceito de rock sem barreiras. Pode até desagradar alguém, mas sinto muito, acho Leno e Lilian tão importantes quanto Cólera, não vejo por que não colocá-los juntos."


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