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CRÍTICA
Como escrever sobre uma adaptação metalinguística
DE NOVA YORK
Problema: como começar a
escrever a crítica de "Adaptação". Sede. Vou até a geladeira pegar um suco. Morango com laranja? Serve. Preciso de uma primeira
frase cativante, que atraia a leitura. Já escrevi antes que é o melhor
filme do ano, agora tenho de justificar. Opa, caiu uma migalha no
teclado. Será que estraga?
Idéia: lembrar as resenhas estrangeiras. O sujeito da "Time
Out" disse que é o melhor filme
do ano. Eu também disse, o cara
deve ser bom. Quem escreveu? Ih,
Mike D'Angelo, o mesmo que em
98 criticou "Um Crime Perfeito"
sem perceber que era remake de
"Disque M para Matar". Vai mal.
"Totalmente original e envolvente. Um dos melhores filmes do
ano", disse a CNN. Melhor assim.
O "New York Times" e outros
também morrem de amores. Só
elogiar efusivamente não me fará
dizer nada novo. Preciso de uma
idéia original. Estico os braços.
Tenho de voltar a fazer alongamento. chega, está na hora de
pensar em algo original:
"Adaptação" é a tentativa mais
bem-sucedida de juntar arte e
metalinguística. Charlie Kaufman
se coloca no roteiro não por egolatria, mas por excesso de entusiasmo pelo texto original. Ou seja, por amor demais à obra que vai
obrigatoriamente ter de transformar em outra coisa, apesar de
achar perfeita como ela é, ele decide escrever sobre a dificuldade de
fazer isso. E leva às últimas consequências essa decisão. No processo, cria uma obra de arte.
Para alguém tímido como ele, é
um sacrifício. Mas é de sacrifícios
que se alimenta a natureza. Kaufman é darwinista, como mostrou
em "Quero Ser John Malkovich" e
mais explicitamente no subestimado "Natureza Humana". Crê
na sobrevivência do mais apto e
que não seja o mais apto para sobreviver em Hollywood. Então, se
adapta. Daí "Adaptação".
E o filme é auto-referente sem
ser chato. Como quando Nicolas
Cage/Charlie Kaufman fala, na
conversa com a produtora do estúdio, que não vai ceder aos apelos comerciais de perseguições,
mortes, histórias de amor e um final redentor para então terminar
o filme exatamente com perseguições, mortes, história de amor e
um final redentor (pena que parte
da crítica não pescou a ironia e
criticou a "mudança de ritmo").
Até que ficou razoável. Vou mandar assim. Opa, a tecla "send" não
está funcionando. Será a migalha?
(SÉRGIO DÁVILA)
Adaptação
Adaptation
Produção: EUA, 2002
Direção: Spike Jonze
Com: Nicolas Cage, Meryl Streep, Chris
Cooper
Quando: a partir de hoje, nos cinemas
Frei Caneca Unibanco Arteplex 6, Market
Place Cinemark 4, Metrô Santa Cruz 5 e
circuito
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