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São Paulo, sexta-feira, 21 de fevereiro de 2003

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MÚSICA

Grupo Bonsucesso SambaClube e compositora Tania Christal recorrem à independência para fugir do eixo RJ-SP

Nova onda apresenta Pernambuco ao mundo

DA REPORTAGEM LOCAL

A cena pop pernambucana dá novas demonstrações de que depende cada vez menos das determinações do eixo industrial Rio-São Paulo.
Firmemente plantados na terra natal, o grupo Bonsucesso SambaClube e a cantora e compositora Tania Christal lançam seus álbuns de estréia esperando se difundir e viajar pelo Brasil, mas sem abdicar da cidadania recifense (Tania) e olindense (BSC).
Já no nome do "clube", o grupo quer reivindicar o RG local. Bonsucesso é o bairro onde vive o líder Roger Man, 33, dissidente com Berna Vieira, 30, do grupo punk-mangue Eddie. Outros dois integrantes vêm da extinta banda punk pauleira Sheik Tosado. Tanto roqueiro junto traz estranhamento à presença do termo "samba". Mas Roger Man justifica:
"Minha mãe era fanática por Alcione e Gonzaguinha, e era vista como brega pela high society. No Eddie eu já cantava umas coisas estranhas e nem sabia por quê. Era bisonho, os caras diziam "Tá doido, isso é MPB". Hoje todo mundo corre atrás disso, é cool".
Não significa que o BSC faça samba. Contando com a produção do núcleo paulistano Instituto (cujo selo ajuda a bancar o lançamento), o álbum mistura música eletrônica, hip hop, reggae, jovem guarda, mangue beat...
História mais ou menos diversa é a de Tania Christal, veterana que brinca de esconder a idade porque "minha mãe não vai falar mais comigo se eu revelar, não vai poder ser mais minha mãe".
Em atividade musical desde o início dos anos 90 em pontos de parada diversos como Rio, França e Porto Rico, Tania começou fazendo blues. Aprendeu a amar merengues e guajiras em Porto Rico, música árabe em Paris. Caiu de volta em plena efervescência da cena mangue. Adaptou-se a ela, virou "ex-nômade".
"Aqui há uma efervescência enorme, quem foi para o Sul acabou voltando. As rádios locais tocam minha música, e ninguém falou em pedir jabá nem nada. Rodei o mundo para dizer "Poxa, Recife, você é o máximo" ", afirma.
"Já tentamos a sorte em São Paulo com o Eddie, queimar filme no Sul foi uma coisa que rolou muito no início da cena", lembra Berna, do BSC, como que corroborando a avaliação da colega.
"A grande saída de Recife é não precisar do eixo, é fazer uma conexão plena e ativa com a Europa. O que falta agora é haver uma indústria fonográfica em Pernambuco", concorda Roger Man.
Tania estréia indie e secundada pela dupla local de DJs Mad Mud. A receita recombina eletrônica, chanson francesa para a "dama do lotação" Sonia Braga, loa de carpideira, MPB feminista...
Com histórias e rumos diversos, Tania e o BSC parecem convergir para um mesmo ponto, da sofisticação musical conduzida pelos braços "inimigos" da eletrônica e da música popular brasileira.
Muito auxiliados pelo Instituto, os BSC confirmam o que já apontavam no Eddie, em "Quando a Maré Encher", depois regravada por Nação Zumbi e Cássia Eller.
Sua senha é de romper fronteiras de gêneros musicais, evidente em faixas brilhantes como a picaresca "Carimbó Ladrão" e "Sangue da Maré". Se há a ressalva de que as letras contemplativas limitam em parte o efeito total, Tania encarna o outro lado da moeda.
Abordando a condição feminina em cada linha de texto, ela borda rico imaginário pessoal. "Esta mulher aprendeu a comprar briga/ tem até um coração que assusta e faz de mim/ o que bem quer", fala de si em "Suspeita".
Sua vantagem é que a cama sonora por trás do ideário é igualmente rica, fazendo de cada faixa uma viagem pernambucana a algum cantinho do mundo. E as artérias pernambucanas continuam a bombear sangue criativo para o Brasil. (PEDRO ALEXANDRE SANCHES)


Bonsucesso SambaClube   
Lançamento: Instituto/YB Music
Quanto: R$ 25, em média

Tania Christal    
Lançamento: independente
Quanto: R$ 20 (tel. 0/xx/81/3326-3651)



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