São Paulo, sábado, 21 de fevereiro de 1998

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CINEMA
Ator protagoniza "Desperate Measures", thriller ambientado em hospital, que entra em cartaz em março
Batman é passado para Michael Keaton

DENISE BOBADILHA
especial para a Folha, de Londres

Michael Keaton parece predestinado a interpretar personagens que falam do nosso tempo. Ele é protagonista, ao lado de Andy Garcia, de "Desperate Measures", thriller que entra em cartaz no Brasil em março.
Seu papel é o de um sociopata que pode salvar a vida do filho de um agente do FBI (Garcia) porque tem compatibilidade de medula com o garoto, à morte com um tipo raro de câncer.
Na trama de gato e rato dirigida por Barbet Schoereder ("Mulher Solteira Procura"), há espaço para uma discussão atual: os limites da ciência e a tênue fronteira entre avanço tecnológico e religião.
Como alguém tão mau e abjeto pode possuir o mesmo sangue, em linhas gerais, que uma criança inocente?
"Não estou certo de que existe um gene ruim, mas acredito que há o mal no mundo", disse Keaton em entrevista à Folha, em Londres, onde esteve para o lançamento de "Desperate Measures".
É o mal que ronda e habita em vários de seus personagens, inclusive o mais famoso deles, o Batman dos dois primeiros filmes da série, "Batman" e "Batman, o Retorno". "Batman não é um dos caras mais fáceis e bonzinhos do mundo", ironiza o ator.
Keaton confessa não ter visto os últimos dois filmes da série, onde o super-herói é interpretado por Val Kilmer e George Clooney. Por quê? "Não me interessei, soube do roteiro e achei muito fraco."
Keaton soube durante a entrevista que produtores cogitam seu nome para um papel na super-produção "Superman", em que Batman terá uma "ponta". "Sério? Eu não sabia... seria muito engraçado fazer isso", afirmou, completando que sua fase super-herói "faz parte do passado".
Seu personagem em "Desperate...", Peter McCabe, não tem mesmo muito de herói. Cumprindo uma pena de prisão perpétua por duplo homicídio, ele vê no transplante de medula a chance para escapar da cadeia pelos corredores de um hospital.
Como outros homicidas do cinema, tem QI acima do normal, é duro de morrer e sabe captar o ponto fraco de todos ao seu redor. Se fica comovido pelo drama do garoto, pouco deixa transparecer.
"Ele tem segundos de humanidade porque, no fundo, tenta que os outros entendam o que ele realmente quer", teoriza o ator. Andy Garcia, no papel do agente Grank Connor, também vive a dicotomia de ter de se dividir entre o bem e o mal. Ele precisa que McCabe sobreviva para salvar seu filho e para isso vai contra tudo que acreditou na vida e na carreira policial.
"Isso é o mais interessante no meu papel: o McCabe tem problemas normais e poderia ser uma pessoa real", opina.
"Se você exagera na maldade do personagem, ele fica chato depois de dez minutos", diz. Seu sociopata não aceita comparações com o canibal Hanibal Lecter, de "O Silêncio dos Inocentes" -"É muito difícil fazer um psicopata melhor que o (ator) Anthony Hopkins depois desse filme"- nem com outro punhado de filmes com personagens similares.
É no Brian Cox de "Manhunter" e no Robert Mitchum de "Night of the Hunter" que o ator buscou inspiração. "Se você é o mau, não está nas telas para ser amado; o personagem tem que inspirar medo e ódio mesmo", comenta.
Keaton começou a carreira de ator do outro lado da corda, fazendo "stand-up comedy" em bares norte-americanos nos anos 70. Seus personagens cômicos no cinema incluem o surreal Bio Exorcista da fantasia "Os Fantasmas se Divertem" e o louco da adaptação de "Muito Barulho por Nada", de William Shakespeare, pelo diretor Kenneth Branagh.
Também fez drama ("Clean and Sober") e dramalhão ("Minha Vida"). Entre seus personagens favoritos, está o editor de "O Jornal", de Ron Howard, outro perdido entre boas intenções e tentações nem sempre honestas.
A experiência dele com vilões odiosos vem de "Pacific Heights", em que interpretou o vizinho sádico do casal formado por Melanie Griffith e Matthew Modine.
Pouco depois, protagonizou "Multiplicity", onde seu personagem ganhava cinco clones e bagunçava sua pacata vida de marido (de Andy McDowell) e funcionário exemplares.
"Multiplicity" foi lançado mais de um ano antes de a ovelha Dolly vir ao mundo cercada de polêmica e passou quase despercebido no cinema. Mas o tema o balançou.
"Não consigo ser contra a clonagem, você pode ter muitos benefícios para a medicina e a ciência com isso", diz. "Mas, quando ouvi sobre clonagem real pela primeira vez, fiquei assustado, reagi infantilmente como alguém que não encarar a realidade", conta.
"Vivemos uma época muito interessante, um ponto na história onde tudo está se unindo, sobretudo a ciência e Deus."



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