São Paulo, segunda-feira, 21 de maio de 2007

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GUILHERME WISNIK

Intervenção oportuna


MuBE tem servido quase que exclusivamente a eventos comerciais, como feiras, desfiles de moda e festas

O MUSEU Brasileiro da Escultura Marilisa Rathsam é um caso de flagrante usurpação do interesse coletivo em favor da mesquinhez pessoal. Obra mestra do arquiteto Paulo Mendes da Rocha aclamada internacionalmente, incluindo o projeto paisagístico de Burle Marx (seu último projeto, apenas parcialmente executado), o MuBE tem servido, em seus 12 anos de vida, quase que exclusivamente a eventos comerciais de aluguel, como feiras, desfiles de moda e festas.
O projeto, no entanto, é de uma grandeza sem par. Interpretando de modo original o programa, o arquiteto desmonta a idéia de edifício como um volume escultórico, construindo-o como uma sucessão de platôs sem fachada, cobertos por uma grande viga suspensa cuja "função" é eminentemente simbólica. Ocorre que nesses 12 anos, em decorrência da inversão de prioridades no uso dos seus espaços, o museu tem sido continuamente desfigurado: teve guarda-corpos alterados, o espaço de escritórios eliminado, uma janela aberta na parede cega de concreto junto ao café etc.
Hoje, o que mais chama a atenção quando passamos em frente ao MuBE é o festival de banners, toldos e automóveis em exposição, além das grades que o separam do Museu da Imagem e do Som e das calçadas lindeiras, impedindo-o de constituir-se como uma praça pública. Incompreensão ou má-fé? Basta dizer que o edifício tem uma espacialidade seca e exigente, que resiste a transformar-se em uma casa de madame (já que a presidente da sociedade de amigos que administra o MuBE, e "empresta" o seu nome ao museu, mora em frente ao mesmo, tratando-o como o quintal da sua casa).
Identificando o desvio de função nas atividades do museu, a prefeitura rescindiu recentemente a permissão de uso da área concedida em 1987 à Sociedade Amigos dos Museus, iniciando uma batalha judicial que ainda pode durar muito tempo. Organizado por artistas e críticos, um abaixo-assinado em favor dessa ação resume a questão de modo sensato: "Por que um espaço público, cuja edificação (prédio e terreno) custou aos cofres públicos mais de R$ 35 milhões, deve permanecer exclusivo dos privilegiados que freqüentam lançamentos de produtos de luxo e festas particulares?".
Nascida da resistência caprichosa de moradores do Jardim Europa à possível construção de um shopping naquele terreno, a idéia de um museu de esculturas em São Paulo, no entanto, ganhou legitimidade à medida que a sociedade a acolheu e realizou: por meio do aval da prefeitura, que cedeu o terreno e arcou com parte das despesas, de empresas importantes como a Votorantim, que também custearam a obra, e de arquitetos de prestígio, que fizeram propostas e julgaram um concurso de projetos para o tema.
Está mais do que na hora da prefeitura retomar a posse desse importante bem cultural, de modo a convertê-lo de fato no Museu da Escultura que até hoje não há no Brasil, preparado para acolher exposições relevantes e servir como um centro de referência acerca do amplo acervo escultórico já existente, mas disperso na cidade e no país.


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