São Paulo, quinta-feira, 21 de junho de 2001

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Grupo Contadores de Estória faz 30 anos e estréia "Descaminhos" em Paraty

Bonecos de coprpo e alma

Alfredo Ribeirinha/Divulgação


VALMIR SANTOS
DA REPORTAGEM LOCAL

Estória. Um rei manda construir um arco na entrada do seu reino. Quando vai passar por baixo, bate a cabeça. Enfurecido, pede o pescoço do responsável pela construção. Os súditos não o encontraram, pois quem fez as alterações no projeto original fora o próprio soberano. Este, sim, é condenado à forca pelo povo. Em seu lugar, coroa-se um melão. Um rei-melão que logo é fatiado.
História. A narrativa acima, extraída de uma lenda afegã, datada do século 16, inspirou "A Fabulosa Estória de Melão City" (76), espetáculo que mais projetou o Contadores de Estórias no início da carreira e até definiu sua logomarca: uma caricatura do "rosto" do fruto do meloeiro.
"Até hoje não entendi como a censura deixou passar esse espetáculo, que era feito na rua e atraía milhares de pessoas", afirma o diretor e fundador do grupo, Marcos Caetano Ribas, 54.
Neste final de semana, uma remontagem de "A Fabulosa Estória de Melão City" integra a programação dos 30 anos do Contadores de Estória (leia ao lado), que também comemora 20 anos de palco fixo na histórica Paraty (RJ).
Apesar de o "Aurélio" recomendar a grafia história, tanto no sentido de ciência histórica quanto no de narrativa de ficção ou conto popular, o grupo preserva a acepção lúdica de "estória" em seu nome. Era uma vez...
Da mesma forma, o adjetivo "contadores" não encerra os novos tempos. As palavras que contracenavam com bonecos gigantes em abril e maio de 1971, no Central Park, em Nova York (houve um encontro casual com o Bread and Puppet Theatre, lendário grupo americano que dava seus primeiros passos), emudeceram na década seguinte, quando Ribas e sua mulher, a artista plástica Rachel, priorizaram o tom mais intimista, inclusive com bonecos que mediam centímetros.
Na década de 90, o grupo incorporou elementos da dança, arte que consta da formação de Ribas. A soma desses 30 anos, diz o diretor, aponta para uma concepção que resvala na instalação cênica.
Essa perspectiva começou em "Museu Rodin Vivo" (1994), performance que integrou a exposição do escultor francês em São Paulo. E ganha mais visibilidade em "Descaminhos", a nova montagem, que também estréia na festa de aniversário.
O espetáculo é inspirado na pesquisa de três anos que Ribas desenvolveu sobre o "caminho do ouro" que ligava Paraty a Diamantina no século 18 (o porto de Paraty escoava o ouro para Minas e, de lá, para o mundo).
"Descaminhos" não vai ocupar o tradicional Teatro Espaço do grupo (cem lugares), mas um prédio no qual funcionava uma agência bancária, no centro histórico da cidade.
Além de Ribas e Rachel, fundadores do grupo, e da cenógrafa Inez Petri, incorporada há sete anos, "Descaminhos" terá participação de mais 12 artistas.

Livro
Antes de ganhar sua versão cênica, com bonecos de madeira (Ribas reivindica que todos, sempre, "são feitos de carne e osso"), "Descaminhos" chegou à celulose. O diretor escreveu o livro homônimo com três histórias de ficção ("Sedução", "Aflição" e "Desespero").
A internacionalização que está na gênese da carreira -é sintomático que tudo tenha começado em Nova York, quando os namorados universitários Ribas e Rachel deixaram Brasília- atingiu o ponto alto em 1991, quando o grupo apresentou "Maturando" no Next Wave (NY), um dos principais festivais de vanguarda mundial nas artes cênicas, que pela primeira vez abriu espaço para o teatro de bonecos.
"Maturando" dividiu um fim de semana e o anúncio da programação nos jornais com foto ao lado do espetáculo "Bandoneon", da companhia alemã Tanztheater Wuppertal, de Pina Bausch.
Numa retrospectiva, porém, Ribas afirma que a decisão mais importante na carreira do Contadores de Estória foi se fixar em Paraty, em 1981.
"Depois de várias turnês pelo exterior, descobrimos o prazer criativo de permanecer aqui, onde há muita serenidade", diz Ribas. "Afinal, o mundo todo passa por Paraty."
Por causa da afluência turística, há sessões que lotam somente com estrangeiros."Viajamos muito, agora queremos que o mundo viaje por nós." Via bonecos.


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