São Paulo, sábado, 21 de julho de 2001

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"A MORTE DE DANTON"

Viver é nada mais que teatro

EM BERLIM

Em 1998, "A Morte de Danton", de Georg Büchner, foi encenada na última temporada com remanescentes do grupo de Heiner Müller na direção do Berliner Ensemble, de Bertolt Brecht.
Peça que trata do fracasso da Revolução Francesa, ela poderia ser uma metáfora para a capitulação do grupo de Müller à frente do teatro berlinense, obrigado a receber Claus Peymann como novo chefe. A direção do espetáculo foi do norte-americano Robert Wilson, que, com sua refinada estética, tirou de foco a questão política. Entre seus trunfos, estava a participação da atriz Edith Clever, a predileta de Peter Stein, do Schaubühne.
Agora em 2001, num momento de turbulência à frente do Schaubühne, após provocar certa frustração por não realizar sucessos no teatro, Thomas Ostermeier encena também "A Morte de Danton". A peça, que estreou em 31 de março, é vista hoje no Festival de Teatro de Avignon. Ao tratar do inevitável fracasso humano em momentos de grande transformação, Ostermeier pode estar falando de si próprio. Em todo caso, o inevitável é, ao menos, reforçado na montagem de Ostermeier.
O espetáculo tem início com referência ao teatro de marionetes: atores movimentam-se como se conduzidos por algo superior, o que tem muito a ver com a própria frustração que Büchner tem com a Revolução Francesa, em seu texto de 1835.
O autor alemão, no início da peça, deixa claro que irá tratar de morte, quando Danton fala de túmulo. Assim também faz Ostermeier ao utilizar como cenário tecidos vermelho-sangue no pequeno palco criado sobre o palco. Aqui mais uma referência: viver é nada mais que teatro.
"A Morte de Danton" trata do conflito entre duas das principais lideranças da Revolução Francesa, de 1789: Danton e Robespierre. Ela ocorre no auge do terror no movimento, quando Danton é condenado à morte na guilhotina, em 1794, como contra-revolucionário.
Em sua montagem, Ostermeier segue o texto na íntegra, no alemão de 1835, o que leva a peça a ter três horas e meia. É sua primeira montagem de um clássico no Schaubühne, o que provoca certa surpresa por não fazer referências contemporâneas. Sua viagem é na própria encenação, sua pesquisa é no trabalho dos atores.
Nos 55 papéis do espetáculo, 13 atores se revezam. Alguns homens fazendo também papéis femininos, e mulheres interpretando personagens masculinos. É parte da estratégia do diretor de evitar o realismo. Assim, são usados até mesmo típicos elementos brechtianos, como música ao vivo entre as cenas e atores cantando. Pequenos outros efeitos reforçam ainda a negação do ilusionismo, como usar a cabeça de corvos em alguns deputados.
Com a simples encenação, o destaque cabe de fato aos atores. Versáteis, eles dominam a cena, característica importante das montagens na história do Schaubühne. Merecem ser citados Kay Bartholomäus Schulze, como Danton; Tilo Werner, no papel de Robespierre; e André Szymanski, que, entre os cinco personagens que desempenha, encarna também Julie, a mulher de Danton.
Quem viu "Personakreins 3.1", do dramaturgo sueco Lars Norén, peça que Ostermeier abriu sua temporada no Schaubühne, em 2000, pode estranhar a montagem de "A Morte de Danton". Mas, na verdade, há muito em comum: respeito ao texto, valorização dos autores, efeitos inteligentes de encenação. Ou seja, ótimo teatro. (FABIO CYPRIANO)


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