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CINEMA
Trilha e retrato da época feito em "Dois Córregos" foram tema de discussão após pré-estréia do filme
Música e política dão o tom de debate
free-lance para a Folha
Hermes, o guerrilheiro clandestino de "Dois Córregos", diz que
"os momentos efêmeros são os
mais intensos da vida". José Genoino, que participou da guerrilha do Araguaia na década de 70
-e assistiu anteontem ao novo
filme de Carlos Reichenbach-,
considera esse um traço essencial
da época: "Nós nos habituamos a
viver toda vida no mais curto espaço de tempo, porque ela podia
acabar a qualquer momento".
A identificação entre o deputado federal do PT e o personagem
interpretado por Carlos Alberto
Ricelli aconteceu na exibição de
"Dois Córregos", seguida de debate entre o diretor do filme, o arranjador e produtor musical Nelson Ayres, o músico Arrigo Barnabé e Genoino, quinta-feira à
noite no Espaço Unibanco.
Promovido pela Folha e pelo
Espaço Unibanco, o evento abordou o tema "A Música e a Política
no Cinema". Genoino ressaltou
que "viver com intensidade" envolvia todas as relações humanas:
"Os laços que você constrói nesse
processo são laços muito fortes".
De fato, no filme, Reichenbach
retrata a convivência de quatro
dias entre duas adolescentes e um
homem envolvido com a guerrilha, que vive escondido em um sítio na cidade de Dois Córregos,
em que todo pequeno acontecimento é marcante.
"Dois Córregos" foi feito para
homenagear o padrinho de batismo do diretor, que viveu durante
um período em uma casa que a família tinha perto da represa Billings. "Quis flagrar com a câmera
os sentimentos que aprendi convivendo com essa pessoa cuja vida infelizmente não foi tão poética como o filme mostra", afirmou
Reichenbach.
A história é narrada da perspectiva da sobrinha do guerrilheiro,
Ana Paula, já adulta (interpretada
por Beth Goulart), uma "figura
neocareta", como a definiu o diretor no debate. É a perspectiva da
geração que se caracteriza pela
absoluta indiferença em relação
ao que aconteceu nos anos 60.
Nelson Ayres começou sua fala
no debate dizendo que a música é
um personagem do filme. "O Carlão é mais apaixonado por trilhas
do que por filmes, é o diretor que
eu mais vi vibrar com as trilhas",
contou. Daí sua preocupação em
achar uma atriz pianista, a amiga
da sobrinha de Hermes, interpretada por Luciana Brasil.
"É maravilhoso poder ver no cinema um plano que começa no
rosto e termina nas mãos do pianista", disse Ayres, enquanto Luciana sorria na platéia, em que estavam também Ingra Liberato (a
irmã de criação de Ana Paula no
filme) e Cristina Cavalcanti (que
interpreta a guerrilheira Tânia).
Arrigo Barnabé disse que passou o filme tentando entender a
que a trilha sonora estava servindo: "Não é o tema da relação
amorosa. Acho que o que a música evidencia é sua relação de amor
com o personagem", afirmou, dirigindo-se a Reichenbach.
Ayres dirigiu ao diretor uma
pergunta no final do debate: "Por
que teve uma obsessão em não
deixar colocar música em baixo
do diálogo?". "Nesse filme ela tinha de entrar sozinha, se fosse
complemento para diálogos, o filme estaria destruído. Por isso as
músicas foram escolhidas a dedo,
"a faro", na verdade: tentei ir pelo
cheiro da sensibilidade."
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