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São Paulo, domingo, 21 de setembro de 2003

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MÔNICA BERGAMO

Bem-vindo a Canô City

Ana Ottoni/Folha Imagem
CENA Dona Canô, 96, entre os filhos Maria Bethânia e Caetano Veloso em missa realizada em homenagem à matriarca na igreja matriz de Santo Amaro da Purificação (BA)

Em Santo Amaro da Purificação, a matriarca do clã Velloso é mais importante que os filhos ilustres; ao menos no dia de seu aniversário, quando a cidade baiana pára

Até alguns anos atrás, tudo era apenas uma brincadeira. Que foi crescendo, crescendo, absorvendo a população, e, de repente, a cidade se viu completamente dela. De dona Canô.
 
Em Santo Amaro da Purificação, no Recôncavo Baiano, a matriarca do clã dos Velloso está por toda a parte. Faixas, cartazes e placas não deixavam ninguém esquecer que terça-feira, 16 de setembro, era dia de Claudionor Vianna Telles Velloso, 96, mãe de Caetano, Maria Bethânia e seis outros filhos.
 
Nas primeiras horas do dia, cerca de 50 pessoas interrompem a calmaria da cidade para, balões de gás em punho, cantar "Parabéns" em frente ao número 179 da rua Ferreira Bandeira.
 
É lá que mora a figura mais influente e importante da comunidade. E sua agenda será extensa: além do café da manhã para "os mais chegados", um almoço para a família e amigos, uma missa em sua homenagem na igreja matriz e um coquetel para 450 pessoas, à noite.
 
Um esquema de trânsito especial é montado, reforço policial solicitado. Tudo para que nada dê errado naquele que é, na opinião dos próprios moradores, "o dia mais importante do ano".
 
As visitas, no entanto, têm hora para acabar. Todos respeitam o horário de descanso de dona Canô -que entre o almoço e a missa dá uma dormidinha. Já com novo figurino, aparece para as entrevistas e fotos.
 
Jornalistas atendidos, é hora de embarcar em seu Citroen Xsara com motorista, rumo à igreja. O trajeto é feito como convém a seu status de chefe de Estado: com batedores da PM.
 
Vaidosa, dona Canô fez questão de mandar forrar um sapato especialmente para a missa. Aproveitou e pediu à filha Bethânia que providenciasse um saltinho. Surge na igreja impecável, em um tailleur creme, sob chuva de pétalas e ao som de "Se Todos Fossem Iguais a Você".
 
"Sou conhecida só por causa dos meus filhos, que eu sei", diz dona Canô. "Minha casa virou ponto turístico, que eu sei", afirma. Lúcida, ela sabe de tudo. Sabe, por exemplo, que é muito famosa. "Graças a Deus", diz.
 
O longo período de festejos está marcado para terminar com uma festa no teatro Dona Canô -um teatro em sua homenagem foi construído com a bênção de Antônio Carlos Magalhães, amigo de longa data.
 
ACM aliás, é o único não-parente a figurar no cantinho de retratos de dona Canô. Ao lado de fotos dos filhos, netos e bisnetos, reluz a imagem autografada do político abraçado a ela.
 
A amizade com o senador pefelista aliada ao prestígio de que desfruta na comunidade permitiu a ela intermediar vários projetos de melhoria para Santo Amaro -como a obra de despoluição do rio Subaé, que corta a cidade, e a reforma da igreja.
 
ACM é esperado. O estádio de futebol -o Antônio Carlos Magalhães- fica a postos para seu helicóptero. Que não vem.
 
Mas ano que vem tem mais.

O FILHO

'Não tenho vocação política'

Em Santo Amaro, Caetano Veloso é Cae -pronuncia-se "Cái", e não "Caê". No dia do aniversário de dona Canô, Cae protagonizou o momento mais emocionante da missa, quando cantou "Ave Maria" na igreja matriz. Antes da festa, ele deu a seguinte entrevista:
 
Folha - Seu amigo Gilberto Gil agora é ministro. Você nunca pensou em entrar para a política?
Caetano Veloso -
Não. Só tenho um pouco de arrependimento de não ter feito nada por Santo Amaro, porque realmente não tenho vocação política. Eu me arrependo de não ter desenvolvido essa vocação só por isso.

Folha - Em relação ao governo Lula, você está entre os decepcionados ou entre os esperançosos?
Caetano -
Estou achando o Lula ótimo. Ele está numa posição de comando e sabe mandar, é um bom chefe.

Folha - Do que você gosta e do que não gosta na música brasileira atual?
Caetano -
Não vou falar de nada de que não goste, porque isso não dá certo. Gosto do Los Hermanos, adoro Nação Zumbi. Adorei Maria Rita, gostei muito da emissão dela. Cantando "Tudo Bem, Meu Bem", é uma emissão delicada, muito boa. Ela canta muito bem.

Folha - E da Preta Gil cantora? Gosta?
Caetano -
Acho que ela tem uma pronúncia muito boa, canta muito bem. A dicção é boa. Eu gostei da foto da capa do CD dela, mas aquela em que Preta aparece nua não me disse nada. Posso tirar a roupa aqui e ficar nu na sua frente, não tenho problema com nudez. O que eu adorei mesmo foi ver Marisa Monte cantando "Carinhoso" no filme "Meu Tempo É Hoje". Aquele filme é belíssimo. É a realização dos meus sonhos em termos de cinema.

A FILHA

'Quero tudo que lhe fizer bem'

Maria Bethânia não se cansa de paparicar a mãe. Bota perfume em dona Canô, abraça dona Canô, beija dona Canô. É louca pela mãe. "Quero estar perto dela em tudo que lhe fizer bem", disse a cantora, antes de conversar com a coluna.
 
Folha - Você não gosta de dar entrevistas, mas fale conosco...
Maria Bethânia -
Quem disse que não? Vamos falar, se for rápido.

Folha - Para fugir um pouco do assunto "festa": o que você acha do governo Lula?
Bethânia -
Acho que está indo bem. Ele gosta muito do Brasil, e o Brasil o merece. Tomara que ele consiga demonstrar esse amor.

Folha - E o ministro Gilberto Gil?
Bethânia -
Acho muito bom, fiquei muito contente com a escolha. Além de muito sensível, é um excelente administrador. Gil é formado em administração. Acabei de fazer uma turnê com ele. Foi bacana. Ele é um cavalheiro. Em cena, tem alegria de usufruir, de aprender. Gosto muito.

Folha - E da novidade Maria Rita Mariano? Também gosta?
Bethânia -
Não acho que ela seja igual a Elis, como andam falando. Mas eu ainda não a vi cantando. Ouvi, acho que canta muitíssimo bem, tem tudo para fazer o maior sucesso. É natural que a comparem com a mãe, mas têm que parar com isso para ela poder se desenvolver. Ela já falou que sua maior inspiração não é a mãe, e sim uma cantora americana [Holly Cole, na verdade canadense]. Mas parece que ninguém prestou atenção nisso.


@ - bergamo@folhasp.com.br

SÉRGIO DÁVILA (interino)
COM CLEO GUIMARÃES E ALVARO LEME



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