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Pesquisadora identifica "impressionismo" no crítico
DA REPORTAGEM LOCAL
Defendida em 1995, a tese de
mestrado da pesquisadora carioca Ana Bernstein será publicada
em livro no ano que vem, pelo
Instituto Moreira Salles. A autora
se valeu do acervo de Décio de Almeida Prado, com quem teve vários encontros nos anos 90, para
rever e ampliar o seu trabalho.
"A Crítica Cúmplice", mesmo
título da tese coorientada por Flora Sussekind e César Guimarães,
na PUC-RJ, pretende transcender
a trajetória do crítico para dar
conta, também, do seu papel como formador de uma geração de
críticos e pesquisadores.
"Desde os primeiros textos publicados na revista "Clima", a crítica de Décio vai se destacar por seu
caráter analítico, examinando o
teatro como um fenômeno complexo, buscando discutir os diversos elementos que compõem a cena, situando o espectador diante
da obra, e situando esta dentro de
seu contexto social e artístico", diz
Bernstein, que respondeu à Folha
por e-mail, de Nova York, onde
mora.
(VS)
Folha - Como "A Crítica Cúmplice" está dividida?
Ana Bernstein - São seis capítulos. O primeiro examina o panorama teatral de 1930-1940, ou seja,
o momento anterior à renovação
do teatro brasileiro e ao surgimento da moderna crítica teatral.
O segundo trata do que eu considero como o período de formação
de Décio. Isso inclui a criação da
USP e da Faculdade de Filosofia,
Ciências e Letras; o surgimento de
uma nova mentalidade -a universitária- no país; o grupo de
"Clima" e os primeiros textos de
Décio e do Grupo Universitário
de Teatro.
O terceiro capítulo detém-se sobre a fase de consolidação dos
conceitos críticos empregados
por Décio. Aqui eu me debruço
sobre o período inicial da crítica
em "O Estado de S. Paulo", quando a coluna teatral ainda se chamava "Palcos e Circos", um período em que a crítica de Décio pode
ser definida como uma crítica militante, cúmplice, além de didática. Está preocupado com a formação de uma nova mentalidade
teatral e sua crítica espelha isso de
forma clara. Discuto também os
princípios que guiaram sua crítica, sua autodefinição como um
crítico impressionista.
O quarto capítulo trata da arte
do ator, através dos textos que escreveu sobre João Caetano, Procópio Ferreira, Cacilda Becker,
atores que ele considera paradigmáticos de suas épocas e usando
como contraponto textos sobre
Dercy Gonçalves e Alda Garrido.
O quinto capítulo analisa a mudança da cena teatral brasileira na
década de 1960 e a transformação
que se opera na crítica de Décio,
que vai repensar os conceitos que
o haviam guiado até ali. O episódio da devolução do [Prêmio] Saci e outros relacionados à censura
são discutidos aqui.
O último capítulo trata da produção ensaística de Décio, dos estudos de teatro brasileiro que ele
escreveu e do seu papel fundamental como formador.
Folha - Seu trabalho identifica a
"crítica cúmplice" de Almeida Prado no período de formação de uma
cultura de teatro no país, dos anos
40 aos 60. Como ele conciliava a militância com a objetividade presumida do crítico? Isso o angustiava?
Bernstein - Não creio que Décio
tenha jamais se angustiado com
este problema. Desde o primeiro
momento, ele se colocou como
um crítico impressionista, isto é,
ele sempre soube que sua crítica
era necessariamente informada
por sua subjetividade, que suas
idéias e suas opiniões não escapavam ao gosto pessoal e à sua formação. Isso não significava porém, que não possuísse critérios
objetivos para sua análise, na qual
entravam também as impressões
produzidas pela experiência estética. Ele buscou sempre avaliar os
trabalhos a partir do exame da
coerência interna da própria
obra, levando em consideração,
ao mesmo tempo, a inserção desta no contexto social.
O que levou Almeida Prado a assumir a crítica impressionista?
Bernstein - Para Décio, a crítica
teatral, por ter como base a experiência estética, não pode nunca
ser uma crítica científica. A crítica
científica vale muito pouco quando se trata de analisar a experiência estética, as emoções provocadas por um determinado ator ou
um determinado espetáculo. A
seu ver, "Uma ciência teatral, se
conseguirmos um dia constituí-la, ensinará tudo ao crítico, menos
se tal atriz e tal peça são medíocres
ou geniais. Essa é uma escolha
que ele terá de fazer, jogando às
vezes tudo ou nada como qualquer espectador".
Folha - Como o crítico demonstrava esforço para criar uma "consciência teatral"?
Bernstein - A crítica de Décio,
num primeiro momento, assumiu um caráter didático e militante. Didático porque procurava
formar não apenas um público,
mas também se dirigia à nova geração de atores, em sua maior
parte amadores, que viria renovar
o teatro brasileiro. A construção
dessa consciência teatral se coloca, então, para o crítico, como o
principal objetivo nesta primeira
fase, determinando, muitas vezes,
o próprio caráter da crítica.
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