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CINEMA/ESTRÉIA
"CALLAS FOREVER"
Perda precoce da voz é foco de retrato do italiano sobre a diva
Franco Zeffirelli ameniza últimos dias de Maria Callas
JOÃO BATISTA NATALI
DA REPORTAGEM LOCAL
Franco Zeffirelli, 80, repartiu
sua carreira entre o cinema e a
direção cênica de óperas. Em
1948, ele, pela primeira vez, trabalhou com a soprano greco-americana Maria Callas (1923-1977).
Inevitável que fossem amigos.
Mas não foi bem por isso que ele
se credenciou para dirigir "Callas
Forever". O filme, que estréia hoje
em São Paulo, foi rodado 15 anos
depois da morte da cantora. Sua
vida mundana -mulher de
Onassis, que a abandonou por
Jacqueline Kennedy- já murchara como imagem no mundo
mesquinho das celebridades.
Sua lembrança já estava integralmente devolvida aos apreciadores do repertório lírico. Callas,
a grande diva do século 20, já poderia ser tratada por suas tristezas, manias e frustrações.
O grande drama pessoal de Callas não foram os ingredientes de
sua vida sentimental. Foi, bem
mais que isso, a perda precoce da
voz. A musa mais festejada nos
palcos da Europa e dos EUA precisou deixar de cantar bem antes
de chegar aos 40 anos.
A Callas real se fechou em seu
apartamento parisiense. Empanturrou-se de pílulas, isolou-se socialmente durante anos e morreu
sob a suspeita de suicídio cometido numa crise de depressão.
Os últimos meses da Callas de
Zeffirelli são mais amenos. O diretor italiano inventa que a soprano
aceitou filmar "Carmen", de Bizet, mas sem cantar. Ela dublaria a
única gravação que fez naquele
papel (1964, sob a regência de
Georges Prêtre). O drama da voz
perdida seria contornado.
Mas não de todo. Ao tentar escapar daquilo que ela qualifica em
certo momento de "farsa", Callas,
interpretada pela atriz francesa
Fanny Ardant, pede nas últimas
cenas do filme que o produtor
Larry Kelly (o ator britânico Jeremy Irons) destrua aquela "Carmen" de mentirinha. Ele o fará.
Zeffirelli tem inúmeros méritos.
O primeiro consiste em desprezar
como irrelevantes o período da
vida de Callas que ele com propriedade considerou, em entrevista ao jornal "Daily Telegraph",
como "puro excremento VIP".
O segundo dos méritos está no
uso comedido de uma de suas
mais fortes idiossincrasias cinematográficas: a justaposição excessiva de ingredientes cênicos,
que saturam as imagens como se
elas fossem uma pintura barroca.
Fora breves recaídas, a Maria Callas de Zeffirelli é "clean".
Há por fim a própria música
que permeia o filme como um doce e bem escolhido narcótico.
Puccini ("Madame Butterfly",
"Gianni Schicchi") foi para Zeffirelli uma opção de gosto, em lugar, por exemplo, de Bellini, compositor de "Norma", o papel pesadão da Callas real por excelência.
A Callas de Zeffirelli é também
incomparavelmente mais bela
que o foi a soprano de verdade.
Fanny Ardant é uma deusa que
chegou aos 53 anos -a mesma
idade com a qual a soprano viveu
seus últimos meses- com o frescor quase adolescente. Não está
decaída pelo fumo ou pelo álcool,
pelas dietas e pela exposição excessiva da pele ao sol do mar
Egeu, onde o magnata Aristóteles
Onassis tinha sua ilha particular.
Callas Forever
Idem
Direção: Franco Zeffirelli
Produção: Itália/França/Espanha/Reino Unido/Romênia, 2002
Com: Fanny Ardant, Jeremy Irons
Quando: a partir de hoje nos cines
Bristol, Espaço Unibanco 3, Market Place
Cinemark e circuito
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