São Paulo, Sábado, 22 de Janeiro de 2000


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RESENHA
Autor que queria revisar clássicos é agora só otimismo

especial para a Folha

Em seu livro de memórias, "O Mundo Que Eu Vi", Zweig não explica sua incrível capacidade de produção, mas revela um plano que define como "ousado": melhorar ou "reduzir seriamente" clássicos da literatura mundial, de "Homero a Balzac, Dostoiévski a "A Montanha Mágica'".
Zweig via nas obras desses autores "passagens arenosas e arrastadas" e componentes "individuais e supérfluos". Para não repetir os erros em seus próprios livros, dizia que seu "verdadeiro trabalho" era condensar, num "incessante lançar-carga-fora-do-navio".
Não considerava esse trabalho de editor sofrido, não parecendo, ao escrever, se enamorar por frases ou passagens."
Em "Fernão de Magalhães", o modelo está posto em marcha, impondo um ritmo sedutor à leitura. Desde sua primeira linha, "No princípio eram as especiarias", Zweig movimenta um arsenal de frases contidas. Nem mesmo a incrível simpatia demonstrada pelo biografado é capaz de amontoá-las de adjetivos.
Mas estilo não é o principal atributo de seus livros. Há sempre ensinamentos subjacentes e, em "Magalhães", Zweig se esforça para demonstrar -e enfatizar- seu ciclotímico otimismo pela espécie humana, inscrevendo a empresa de seu navegador numa inexorável "santa guerra da humanidade contra o desconhecido". Com a proeza de Magalhães, ela, a humanidade, "ganhou consciência de sua própria grandeza."
Zweig não é homem da Era Moderna e tem distanciamento para enxergar os problemas causados às populações nativas por seu "achamento" pelos europeus. Mesmo Montaigne, no capítulo "Os Canibais", de seus "Ensaios", já os insinua. Mas Zweig passa por cima disso, e não pode ser acusado aqui de eurocêntrico. Importa-lhe mostrar uma certa vocação inata e irrecusável da raça: "Um homem em sua pequena e efêmera existência sempre pode transformar em verdade eterna aquilo que centenas de gerações apenas sonharam antes".
Concluir que os fins justificariam os meios, pode parecer apressado. Zweig deixou seu país para não sumir numa câmara de gás e teve seus livros proscritos.
Esforçando-se por mostrar os obstáculos vencidos por Magalhães, desde as difamações sofridas em Portugal -de mesma natureza das que se abateram sobre Camões-, à decisão de seguir viagem quando a tripulação caçava ratos nos porões, Zweig pode estar querendo falar de si. (PV)


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